quinta-feira, 25 de outubro de 2012
Surrealismo
Surrealismo místico
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Por Jorge Pinheiro
Em Paris, um debate sobre a obra de
Paul Tillich
Paris – Paul Tillich, colega de viagem, em Teologia da Cultura, diz que a consciência imediata do incondicionado não tem caráter de fé, mas é auto-evidente. E que a fé contém certo elemento contingente e exige risco: combina a certeza ontológica com a incerteza a respeito de todas as coisas condicionadas e concretas. Chamo esse fato de surrealismo místico. Vou ilustrar.
Tomei o voo TAM 8098 para Paris. Saí de São Paulo no dia 12 de maio (2009), às 19h45, com a alegria normal de um mortal que pretende estar de corpo presente no XVIIIe Colloque de l’Association Paul Tillich d’expression française. Acho que você também, leitor, estaria alegre. No mínimo porque o seu editor pagou os direitos autorais devidos e você não teve que enfiar a mão no bolso.
Nada mais justo que, à hora do jantar, diante da pergunta da aeromoça – o que o senhor deseja tomar? –, você dissesse: um tinto, por favor. E lá vem, para acompanhar a massa do avião, o vinho.
Tudo corre como planejado, quando, de repente, na poltrona da frente, um senhor pesado na sua obesidade reclina-se repentinamente. E o vinho todo é derramado no meu colo. Escorre por entre as pernas e se deposita ao fundo, me encharcando por completo. Mas, como se não bastasse, parte dele é derramado exatamente sobre o volume de Teologia da Cultura, em português, que acabou de ser lançado e que estou levando de presente para a associação tillichiana francesa.
O que você faria, além de chamar a aeromoça, como a criança que grita pela mãe diante de desastre semelhante? Como você se sentiria, além do desespero irado por saber que vai atravessar a noite com a calça e, em especial, os fundilhos molhados? Sem falar no cheiro do vinho impregnando o corpo e o friozinho desagradável produzido pela combinação líquido derramado e ar condicionado meio para o gelado.
A noite foi ruim. Habitada por pesadelos e uma ideia a martelar: cuidado com o vinho. Ah! meu Senhor, então, é isso? Ter cuidado com o vinho? Mas o que significa ter cuidado com o vinho? Segurar bem o copo para que não derrame, ou não bebê-lo? E o que significa não bebê-lo? É não bebê-lo muito, só um pouquinho ou nada? Puxa, não bebê-lo nada? Tem certeza? Nadinha, mesmo? Mas estou chegando a Paris!
Cheguei e me instalei no Au Pacific Hotel, ali na rue Fondary 11, perto da madame Eiffel e do senhor Seine. Recomendo o hotel. Simpático, bom atendimento, muito limpo e preços dignos. Não é merchandising não. É que gosto de dar dicas de viagem.
E à tarde, depois do banho tomado e da roupa trocada, fui a Saint Germain de Prés, fazer a ronda turística intelectual nos cafés, nas livrarias, lembrar um pouquinho de Wilde, de Hemingway no Les deux magots e de Sartre e Beauvoir por ali. Essas coisas.
Mas eis que ao deambular pelas redondezas, dou de cara com uma loja do Nicolas, que há quase um século tem uma atrativa especialidade: vinhos. E na vitrine vejo garrafas de pequenas colheitas artesanais de várias partes da França. Procuro uma da minha região ou próxima. Fiz parte de minha pesquisa de doutorado no sul da França, na Faculdade Protestante de Teologia de Montpellier, e elegi a cidade como minha casa francesa. E voltando à vitrine, eis que vejo Les petites récoltes, vin de Pays de la Cité de Carcassone.
Carcassone é uma cidadezinha medieval, murada. Está no sul da França e é aquele lugar de conto de reis e rainhas, magos e fadas. Torres, muralhas, pontes, ruazinhas. E vinho artesanal, lá perto do meu pedaço francês.
O rótulo da garrafa escrito à mão, e o preço tão em conta que eu não conto. Senão algum leitor pode duvidar e eu vou ficar mal na história. Entrei, comprei, saí e me perdi. É isso mesmo, a poucas quadras do hotel, tendo a madame Eiffel como referência visual, me perdi ao tentar voltar a pé. Com le vin de Pays de la Cité de Carcassone numa sacolinha, parece, fiquei dando voltas sem achar o caminho. Três horas dando voltas. Até que me sentindo meio Balaão, um profeta meio louco do testamento hebraico, voltei à conversa que tinha iniciado no avião. É nem um pouquinho, mesmo, não é? Está bem, o Senhor me leva de volta ao hotel, e não pode ser de táxi, porque senão não tem graça. Já estou tri cansado. E eu não vou beber desse cintilante petites récoltes de la Cité de Carcassone.
Dito e feito. A cem metros encontrei o metrô. E eu estava, depois de andar tanto, a apenas uma estação de metrô do hotel.
Por isso, Tillich diz que o risco da fé não é arbitrariedade: resulta da união do destino com a decisão. Baseia-se num fundamento que não é arriscado: a consciência do elemento incondicional em nós e no mundo. A fé só pode ser justificada e é possível nessa base. Ou, como eu disse no início, isso é surrealismo místico. Ou como nos ensina Troeltsch, o discurso teológico não pode ser apenas o discurso objetivo da fé de uma comunidade cristã. Quando se fala de fé, o teólogo deve estar envolvido, deve se comprometer.
E, assim, passei o meu primeiro dia em Paris, nessa temporada francesa, a pão e água. A bem da verdade, baguette e Pérrier.
16/5/2009
Fonte: ViaPolítica/O autor
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quarta-feira, 24 de outubro de 2012
ACM neto
Carta aberta de Wilson Gomes a ACM Neto
Caro Antonio Carlos Magalhães Neto, sei que pode parecer não fazer falta para o seu estoque, mas como os seus votos estão minguando nesta "reta final", considere a possibilidade de contar com o meu voto. É magrinho, mas é limpinho. Entretanto, como o meu DNA calvinista me impede de dar alguma coisa, assim, do nada, proponho uma barganha. Eu te dou o meu voto e a sua família devolve a minha Bahia.
Explico. Não é por nada, mas é que me incomoda o fato de a sua família ter marcado a Bahia inteira, como fazem os bichos territoriais que vejo no Animal Planet, com o seu cheiro...digo, nome. É difícil achar qualquer coisa pública criada nos últimos vinte anos nesta Província - viaduto, avenida, município, aeroporto, escola... monumento nem se fala - sem o nome de alguém da sua família ou de pessoas a ela consorciadas.
Quer prova? Dê um google. Se até mesmo a vovó (a sua) Arlete Magalhães, que ao que me resulta nunca recebeu um voto popular na Bahia, é nome de umas 15 escolas e centros de educação infantil e de umas três ruas no estado... Nem vou falar de vovô (o seu!) que deu mais nome a logradouros e edifícios públicos na Bahia que Luís XIV, o Rei Sol, foi capaz de dar ao Estado Francês durante os anos da sua glória. Titio (o seu, sempre o seu) nem se fala, não é mesmo? Começa pelo mausoléu em Pituaçu, guardado pela nossa força militar, com bandeira sempre tremulante e pira eternamente acesa, que daria uma pontinha de inveja a Shah Jahan, o imperador mongol que mandou fazer o Taj Mahal. Sem mencionar a, horror dos horrores!, usurpação do nome sagrado do Dois de Julho, trocado pelo de Dom Eduardo Magalhães, no aeroporto desta Cidade de São Salvador. E ainda tem outro monumento fúnebre, na Av. Garibaldi, para um sujeito cujo grande mérito público foi ter sido o candidato de ACM e morrido durante a campanha. Pois é.
Sei que tudo isso parece natural à sua família. Que talvez ainda ache pouco, e só lamente que essa porção de terra onde vivemos não seja oficialmente reconhecida como uma Capitania Hereditária dos Magalhães. Sei que eu estou me queixando de barriga cheia e que já dou sorte porque não deu tempo de estabelecer um Império Caronlígio Tropical - já que Carlos por Carlos, por que Carlos Magno estabeleceu uma dinastia e Antonio Carlos, não? Só por que o franco foi magno não quer dizer que o bahiense seja mínimo, não é mesmo? Reconheço isso tudo, embora um documentário que vi no Discovery tenha dito, para minha surpresa, que aquele Estreito de Magalhães lá do finzinho da América do Sul se refere a um obscuro navegador português e não a algum pródigo argonauta da sua família. Esse Discovery deve ser meio petista. Liga não.
Por outro lado, que sorte a de Antonio Vieira, Joana Angélica, Maria Quitéria, Ruy Barbosa e Castro Alves, heim? Já imaginou se tivessem morrido depois da instauração do direito feudal dos Magalhães de colocar o próprio nome em tudo o que é público? Não iria sobrar nada para os coitadinhos. Preocupa-me um pouco, claro, o fato de ter mais coisas na Bahia em nome de Dona Arlete do que de Raul Seixas, Glauber Rocha e Jorge Amado, mas são ossos do ofício, não é? Matriarca é uma coisa, artista é outra. Inda mais quando uma está viva e os outros, mortos. Agora o que me incomoda mesmo é que não sobre nada, nadica, para a gente perpetuar a memória de Caetano, João Ubaldo, Gilberto Gil e outros baianos sabidos que há por aí. É que gosto desses, sabe? Apego besta, sei que não são Magalhães, mas, coitados, isso não é dado a todos. Fico com medo de que ACM Bisneto ou ACM Tetraneto usem tudo quanto for logradouro, prédio, monumento, quiçá a própria Bahia, para colocar os nomes dos filhos de Luis Eduardo, do seu próprio, suas esposas, amigos, primos e apaniguados.
Bem era isso. Nem precisa que o Sr. devolva o nome dos logradouros e edifícios já recobertos pela honra do nome da sua família. Proponho quotas. Sei que é uma palavra petista aos seus ouvidos, mas não se assuste, pois, como vê, estou usando a grafia clássica. Uma quota de, digamos, 75% para os Magalhães e 25% para os demais, baianos e não-baianos, já me deixaria satisfeito. Mas também faço por 20% e não se fala mais nisso.
Pense com carinho. Qualquer coisa, me procure até o dia 7.
Atenciosamente.
Seu, humilíssimo, WG.
(Blog do Nassif)
Al-Qaeda
“Blitzkrieg da Al-Qaeda”: Terrorismo ocidental contra a Rússia
1/9/2012, Global Research, Tony Cartalucci
“Al Qaeda Blitzkrieg: West’s Terror Battalions Eye Russia Next”
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
“O truque jornalístico-propagandístico é entregue a profissionais (...). E a imprensa-empresa – Reuters, CNN, BBC e outras – põe-se a “noticiar” que “jovens éticos” opõem-se à corrupção.
A corrupção é apresentada como se fosse criação exclusiva do governo a ser derrubado; como se não houvesse jamais havido corrupção em outros governos.
Na verdade, é corrupção que só muito seletivamente atrai a atenção das agências de notícias, da mídia-empresa em todo o mundo e do Departamento de Estado dos EUA...”
O título e a matéria aí vão, para que todos vejam, porque é preciso ver para acreditar
Trata-se de artigo publicado na revista Foreign Policy, sob título de, literalmente, “Dois vivas aos islamistas sírios”[1]. O autor, Gary Gambill, vem do Fórum do Oriente Médio [orig. Middle East Forum] que reúne os mais dedicados neoconservadores fabricadores de guerras, como Daniel Pipes, e propagandistas também dedicados do mais ensandecido e furioso islamofobismo, como Robert Spencer.
Agora que o ocidente está aliado a “islamistas” (aliou-se à Al-Qaeda), todos esses especialistas e jornalistas propagandistas já começaram a propagandear diretamente o terror, defendendo a causa dos terroristas na região do Cáucaso, na Rússia.
Tony Cartalucci
Embora tenha havido época em que os EUA fingiam solidariedade ao governo russo, que combatia grupos afiliados à Al-Qaeda que promoviam ataques terroristas nas montanhas do Cáucaso, no sul da Rússia – além de ataques por todo o país, inclusive em Moscou –, informações recentes[2] mostram que os EUA estão hoje apoiando clandestinamente aqueles mesmos terroristas, nas mesmas áreas.
Assim como os EUA criaram, financiaram, armaram e dirigiram a Al-Qaeda pelas montanhas do Afeganistão nos anos 1980s, os EUA hoje estão financiando, armando e dirigindo a Al-Qaeda, da Líbia para a Síria, e na Rússia.
Os EUA tentam hoje minar e desestabilizar a ordem política na Rússia
Recentemente houve provas de que o Departamento de Estado dos EUA está interferindo pesadamente na política russa [3]. Desde financiar a empresa GOLOS [4], de monitoramento de eleições e dita empresa “independente”, e que tentou apresentar as eleições na Rússia como “fraudadas”, até protestos de rua coordenados por membros da oposição que são pagos pelos EUA (muitos desses “membros da oposição” foram apanhados literalmente “com a mão na massa”, dentro da embaixada dos EUA em Moscou [5]), os EUA estão muito visivelmente empenhados em minar e desestabilizar a ordem política na Rússia.
Pussy Riot
O recente golpe de propaganda operado pelo grupo “Pussy Riot” [Agito das Bucetas] [6] também foi instrumentalizado pela oposição financiada pelos EUA, além de “repercutido” pelos mesmos agentes, patrocinadores ocidentais e toda a imprensa-empresa ocidental.
Enquanto essas ações apresentadas como o “poder suave” [orig. soft-power] seguem seu curso e vão operando os efeitos para os quais foram concebidas, por outra via, essa nada soft, os EUA vão promovendo o ressurgimento do terrorismo no Cáucaso russo [7] – e terrorismo que, com certeza, será encaminhado para respingar por todo o país. O que os fatos começam a mostrar é que muitos dos centros de reunião e organizações de militantes chechenos foram fronts de propaganda subsidiadas, de fato, pelos EUA.
A imprensa-empresa global dá os primeiros passos na direção de “reciclar” o terrorismo
Como foi feito na Síria, onde terroristas vindos de vários pontos foram e ainda são apresentados mentirosamente pela imprensa-empresa do ocidente como “o povo sírio”, “combatentes da liberdade” e “lutadores democráticos”, a mesma imprensa-empresa já começa a operar para “limpar” os vários grupos terroristas que já estão em ação nas montanhas do Cáucaso russo.
A Agência Reuters, por exemplo, dizia em matéria recente: “Brutalidade e fúria do governo Putin alimentam a jihad no Cáucaso russo” [8]. Era a senha, para o início de fogo cerrado de propaganda para implantar na opinião pública um específico conjunto de “causas” da violência na região.
Em tom que muito se assemelha ao dos press-releases distribuídos pelo Departamento de Estado, a matéria diz que os chechenos estão “fartos da corrupção governamental” e querem mudanças “semelhantes às que se viram ano passado na revolução egípcia”.
O que a Reuters não informa é que a “revolução egípcia do ano passado” já está convertida, esse ano, em nova ditadura, dessa vez da Fraternidade Muçulmana, que já começou a atacar liberdades civis e que apóia as aventuras de intervenção de Wall Street e Londres [9].
Como no caso da Síria, quando somos repetidamente “informados” de que a revolução rejeita “principalmente” o extremismo sectário, a agência Reuters tenta agora implantar na opinião pública também a ideia de que a violência na Rússia exibiria traços “religiosos”.
Na mesma operação de propaganda, somos também apresentados a Doku Umarov, o qual, diz a Reuters, seria “líder de movimento clandestino para criar um Emirado na região do Cáucaso”. Outra vez, o que a Reuters não informa é que, segundo relatórios da própria ONU, Umarov é associado à Al-Qaeda (o que se lê na página da ONU, “QI.U.290.11. DOKU KHAMATOVICH UMAROV”):
Doku Umarov esteve diretamente envolvido na organização de vários grandes atos terroristas: a captura de áreas residenciais dos distritos de Vedenski e Urus-Martanovski da República Chechena da Federação Russa (agosto 2002); sequestro de funcionários do Gabinete do Procurador Geral da República Chechena (dezembro de 2002); e explosão do prédio onde operava o Departamento do Serviço de Segurança Federal Russa para a República da Ingushetia, na cidade de Magas, e de dois trens em Kislovodsk (setembro de 2003). Foi dos principais organizadores do ataque contra a Ingushetia, por militantes, dia 22/6/2004, um ataque em Grozny, dia 21/8/2004, sequestro com reféns em Beslan, dias 1-3/9/2004 e ataques terroristas contra estações de metrô em Moscou dia 29/3/2010.
Umarov e os terroristas do grupo sob seu comando, que estariam – como a Reuters insiste em repetir – em luta santa, numa Jihad, não passam, na verdade, de terroristas associados à Al-Qaeda. Não são, de modo algum, “combatentes da liberdade”. São terroristas, cuja causa e cujos métodos são absolutamente injustificáveis.
O principal centro de organização e propaganda de Umarov, esse “Bin Laden russo”, o conhecido Kavkaz Center, foi criado e mantido pelo Departamento de Estado dos EUA; e outros programas norte-americanos, como a Sociedade de Amizade Russo-chechena, são financiados pelo programa National Endowment for Democracy (NED), do governo dos EUA. Hoje, esse programa NED trabalha para derrubar o governo sírio. E ajudou a divulgar também, em todo o mundo, a “Operação Pussy Riot” [Operação Agito das Bucetas], na qual a manifestação de um grupo de performers russas foi cooptada e usada como ação de propaganda anti-Putin, em todo o planeta. (...)
A Agência Reuters trabalha também para implantar a ideia de que haveria militantes armados em levante contra o governo russo; tudo é feito para implantar na opinião pública mundial a ideia de que os russos estariam começando a recorrer ao terrorismo, por falta de melhor via de luta. Mas, paradoxalmente, a Reuters escreve, na mesma matéria, que os terroristas têm atacado também grupos de muçulmanos locais na Rússia, os quais, diz a Reuters, seriam “apoiados pelo governo russo”.
A verdade é que essa militância liderada pela Al-Qaeda está tentando implantar-se em toda a região do Cáucaso, por doutrinação religiosa ou por ataques contra e assassinato de moradores da região. E esse é, precisamente, o modo como opera o imperialismo nessa região do mundo, apoiado, aqui, por EUA e Arábia Saudita. Em todos os tipos de noticiário que a Reuters distribui, o “culpado” de todos os crimes sempre é o governo Putin... Não os EUA ou os sauditas.
Rússia: Como a oposição financiada pelo Departamento de Estado dos EUA uniu-se aos terroristas armados pelos sauditas
Tudo começa na obcecada oposição que o ocidente faz à volta do presidente Putin ao poder na Rússia.
Sobre isso ver também:
8/3/2012, redecastorphoto em: “Entra Vlad, para ENLOUQUECER Washington”, Pepe Escobar, Asia Times Online, em português;
9/5/2012, redecastorphoto “O poder do PUTINATOR”, idem, ibidem, em português
Vladimir Putin
O ocidente não admite a ideia de que Putin encontre espaços para promover mudanças que levem a ampliar ou a gerar estabilidade, social, econômica e geopolítica na Rússia – e que não sejam mudanças absolutamente alinhadas e subordinadas ao que estabelece o “consenso” Wall Street-Londres. Então, o ocidente decidiu que, em vez de expor-se ao mundo na ação de oposição a um governo russo não completamente alinhado, inventaria e construiria (na mídia e no mundo real) uma militância mercenária armada... As ações dessa militância armada, “noticiada” pela imprensa-empresa alinhada e subordinada ao “eixo” Wall Street-Londres, implantariam na opinião pública a ideia de que Putin governa nação em crise, em surto grave de instabilidade social.
A ferramenta que volta a ser usada agora é a mesma que os EUA usaram nos anos 1980s no Afeganistão: terroristas pagos por EUA-sauditas, doutrinados no sectarismo mais extremista, armados até os dentes e “liberados” para espalhar atraso e destruição contra todos os que se oponham às políticas ocidentais para o Oriente Médio. (...)
De fato, os movimentos no Afeganistão nos anos 1980s e na Rússia em 2012, nada têm em comum... além dos apoiadores (EUA-Sauditas) e dos terroristas que aqueles apoiadores apoiam: a al-Qaeda.
E, como também já foi feito no Afeganistão, o truque “propagandístico” é entregue ao trabalho de profissionais. Os representantes e agentes clandestinos abrigados na embaixada dos EUA aproximam-se e misturam-se com os militantes chechenos. E a imprensa-empresa – Reuters, CNN, BBC e outras – põe-se a “noticiar” que “jovens” opõem-se à corrupção, à opressão, apresentadas como se fossem criação exclusiva do governo de Putin e não houvessem jamais acontecido em outros pontos do mundo, sem que, por existirem, tivessem algum dia atraído qualquer simpatia do Departamento de Estado dos EUA ou dos sauditas ou da agências ocidentais de “notícias”.
Abrindo caminho para as hordas de terroristas: da Líbia às montanhas do Cáucaso
A criação de uma frente unida contra o Irã foi o objetivo imediato da Primavera Árabe. Agitou e desestabilizou o Mundo Árabe, depôs governos nacionalistas, substituindo-os por clientes obedientes do Ocidente. A Tunísia, a Líbia e o Egito são hoje governados por representantes procuradores diretos da política exterior dos EUA; enquanto Síria, Líbano e Irã são deixados sós para enfrentar terroristas estrangeiros alimentados por governos sectários extremistas que emergem em toda a região.
Al-Qaeda-no-Magheb (AQUIM) do norte do Mali; LIFG da Líbia; Fraternidade Muçulmana do Egito; e com apoio de Arábia Saudita, Israel, Qatar, Turquia e outros – convergem todos contra a Síria e, depois, contra o Irã. Caso Síria ou Irã caia, no confronto contra brigadas terroristas financiadas pelo ocidente, e se o ocidente conseguir usar os curdos na Turquia e norte do Iraque para criar uma ‘linha de condução’, estará aberto caminho diretamente até as Montanhas do Cáucaso russo e, de fato, estará aberto caminho para atacar diretamente Moscou. Nações que apareçam no caminho dessa horda, inclusive a Turquia e a Georgia, arriscam-se a acabar empurradas para um conflito difícil e caríssimo para elas. Outras nações que, hoje, estão expostas ao grave risco de serem atacadas pelo terrorismo apoiado pelo ocidente são Argélia, Paquistão e China.
….
A Líbia já está convertida em paraíso seguro para a Al-Qaeda, hoje um campo de treinamento gigante para grupos terroristas, abastecido incansavelmente pelas armas da OTAN, além de dinheiro e combatentes treinados, que se vão concentrando nas fronteiras dos estados inimigos do Ocidente. A Síria já enfrenta o que já é, na essência, invasão militar comandada por terroristas líbios, facilitada pela OTAN, especificamente pela Turquia e por países do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG), especificamente Arábia Saudita e Qatar.
No caso de a Síria, o Irã ou ambos caírem, e de o ocidente conseguir implantar uma região controlada por militantes armados e servidores do ocidente, militantes de todo o Mundo Árabe poderão ser treinados do Mali à Líbia, Síria e Curdistão, com armas e suprimentos que lhes chegarão de todos os pontos aí compreendidos e canalizados todos para a mesma direção, através das Montanhas do Cáucaso e contra a Rússia.
A Turquia, é claro, será a principal perdedora, escolhida, como parte do Curdistão, para integrar a linha de transmissão do “projeto” – um gambito que o atual primeiro-ministro da Turquia Recep Tayyip Erdogan ao mesmo tempo conhece e ao qual se mostra ardilosamente indiferente – na direção que mais interessa à elite de Wall Street-Londres, e em detrimento da Turquia e de seu futuro de curto prazo.
Embora esse gambito pareça difícil de conceber e mais ainda de executar, não se pode esquecer que a Primavera Árabe e a subsequente violenta subversão da Síria estavam já planejadas desde 2007-2008, para, como consequência indireta, minar o Irã – sempre o Irã, o eterno inimigo. Não é difícil compreender que esse gambito é parte de uma estratégia maior que está sendo maquinada desde 1991, orquestrada por estrategistas norte-americanos que comparam a geopolítica e o mapa do mundo a um “Grande Tabuleiro de Xadrez”.
Não há melhor modo para controlar os vastos recursos, a geografia e as populações da Eurásia e além, do que entregar tudo – norte da África, Oriente Médio e Eurásia a governos medievais, comandados por conspiradores que agirão como um só corpo com os financistas ocidentais, ao mesmo tempo em que manterão as populações paralisadas pelo medo e pela ignorância. Perpetuar a Al Qaeda em todo o mundo em desenvolvimento habilita o ocidente a impor medidas cada vez mais repressivas draconianas também em casa, minando assim qualquer tentativa também das populações ocidentais para construir autonomia e independência econômica.
O resultado é hegemonia global não contestada e controle autoritário nos respectivos países, com as populações submetidas às maquinações e planos de ditadura científica, que tem raízes no eugenismo hitlerista e na ideologia malthusiana – e que é pautada para a sociedade, incansavelmente, pela imprensa-empresa.
Notas de rodapé
[1] 23/8/2012, Foreign Policy, Gary Gambill em: “Two Cheers for Syrian Islamists”
[2] 22/8/2012, Land Destroyer Report, Eric Dreitser em: “BOMBSHELL: US Neo-Cons, State Department Behind Terror Wave in Russia”
[3] 6/5/2012, Land Destroyer Report, Tony Cartalucci em: “West Undermines Putin's Return to Power in Russia”.
[4] 4/12/2011, Land Destroyer Report, Tony Cartalucci em: “BOMBSHELL: US Caught Meddling in Russian Elections!”.
[5] 6/5/2012, Land Destroyer Report, Tony Cartalucci em: “Unbelievable: Russian Opposition's Confab At US Embassy”.
[6] 5/8/2012, Land Destroyer Report, Tony Cartalucci em: “Who or What is Russia's ‘Pussy Riot’?”
[7] Idem Nota [2]
[8] 31/8/2012, Reuters, Alissa de Carbonnel em: “Insight: Brutality, anger fuel jihad in Russia's Caucasus”
[9] 13/8/2012, Land Destroyer Report, Tony Cartalucci em: “West Celebrates as Dark Age Descends over Egypt”.
Postado por Castor Filho às 14:32:00
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Cinema
Casimiro
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Por Luiz Rosemberg Filho e Sindoval Aguiar
A casa de Casimiro de Abreu
“A poesia é uma arte da linguagem: certas combinações de palavras podem produzir uma emoção que outras não produzem, e que denominamos poética.”
Paul Valéry
Para André Scucato
Rio de Janeiro – Estamos à mercê dos sonhos, pois eles pertencem ao mundo dos vivos. Razão pela qual dá-se continuidade a uma multiplicidade de vontades objetivas e subjetivas, onde entender o Outro em você, é de certo modo um esforço de grandeza comportamental. Ou seja, é preciso ter afeição pelo que se escolhe como tema, o que diferencia o cinema da TV.
Escolheram um poeta como o caminho da despedida, pois também Mario Carneiro não está mais entre nós. Mas no processo de construção de Casimiro, surge o prazer de novos encontros. E ainda o tempo, a natureza, o espaço... passando-nos a idéia de que poeta somos todos estes que, de diferentes maneiras, combatemos o baixo uso do mal-estar. Ao processo de criação interessa a vida e as dúvidas.
Para falar deste curta sobre Casimiro de Abreu, temos que partir do desejo para festejar múltiplos encontros afetivos. A procura do poeta é de certa forma o que já foi um dia o nosso cinema: criativo, ousado e exemplar. Exatamente o contrário do que se faz hoje. Se ontem Glauber era a força motriz de um sentido histórico-dialético para sons e imagens, hoje impera a baixa linguagem televisiva, a prostituição sempre justificada como trabalho e o dinheiro que tudo compra e corrompe. Mas, inversamente a essa potencialização do horror, Mario Carneiro, Paulo Cesar Sarraceni, Antonio Luis, Joel Barcellos, Ricardo Miranda, Litza Godoy e Beth Formaggine voltam-se para a criação como esperança poética. Uma volta ao cinema como potência do desejo e da sensibilidade. Os m... que fiquem com suas trampas financeiras e beatitudes religiosas. Fazem parte do que se entende como comunicação e poder.
A exteriorização de uma imagem-pensada se aproxima muito da interiorização da palavra sagrada para o poeta. Ou seja, vive-se a gestação no estranhamento como essência entre o abstrato e o concreto. Ora, e o que pode entender um burocrata da cultura, do processo criativo? Ele é só um tapetão fajuto dos mais baixos interesses do poder. Apropria-se do que não sente e não sabe, elevando o seu ódio à desmotivação do processo criativo. É onde ele vai gozar, realizando-se como canalha oficial do pensamento conservador. A sua única vantagem é poder, um dia, chegar no poder para nada mudar e ser útil ao conformismo reinante. Mudar implicaria em pensar, e isso ninguém quer. Desumanizar o processo de criação dá mais “prazer”. Não é à toa que representam e defendem qualquer tipo de governo, pois fazem parte do poder.
Lamentavelmente a delicadeza de se pensar a poesia no nosso cinema é inferior à força destrutiva e vulgar dos muitos traidores aboletados no poder da burocracia. Se o bom senso é trair, o que ficou sendo a poesia e o cinema? Como pensar, exibir e lucrar com um curta-experimental como Casimiro? Claro, é mais fácil dar significação a insignificação do poder.
O presidente Lula, que já foi um documentário fraco, não vai virar ficção-barata? E feito logo por quem! Quem sabe não o transformam logo em um deus grego? Gostar dele é uma coisa. Cultuá-lo e mistificá-lo é outra. O cinema, que já foi épico e criativo, virou profissão de safado. Quem sabe para o futuro não muito distante um filminho sobre a ministra Dilma, Collor ou FHC? Todos espessas essências de sofrimentos rejuvenescidos pelos “podres poderes” da República do Bananão.
Casimiro não é só um delicado filme de despedida de Mario Carneiro, mas também o da desgraça de vidas difíceis. Para nossa sorte, Mario Carneiro, Paulo Cesar Sarraceni e os demais membros da equipe não passaram ou estão na vida como rebanho televisivo, pois ousaram sempre com suas próprias vidas. Ternos, épicos e utopistas deram significação ao que faziam e ainda fazem. E o mais belo é que Casimiro não é um documentário atado à ideologia do espetáculo. Vai muito além. É um curta poético de resistência tanto à dor como à perversão-Brasil. Perversão responsável pelo exercício do poder. Ainda ontem o regime militar. Hoje o poder de truculentos, desinformados, burocratas e ressentidos. Alguma diferença do que foi sempre o país? Acrescente-se a isso os baixos interesses das multinacionais transnacionais da comunicação.
Mario e Paulo transformaram Casimiro numa doce serenidade entre a generosidade de ambos e uma rara honestidade com um cinema de poesia e idéias. Velhos parceiros de muito caminhos vividos. Entre Arraial do Cabo e Casimiro há uma rigorosa fidelidade à paisagem e às passagens. E, entre uma coisa e outra, a esperança de um país melhor que não ocorreu. Ainda assim, somos todos o desprendimento do poeta diante da vida e da morte. Vivendo-se intensamente a experiência íntima não como aparência, mas como percurso da libertação. Bênção aos artistas, bêbados, drogados e poetas. Neles o Brasil febril e criativo atua brigando por um país mais humano e justo para todos.
Mario Carneiro e Paulo Cesar não suavizaram nada. A paisagem está viva lá fora, mas o pássaro bate contra o vidro da janela da igreja, querendo sair. Como apropriadamente dizia o filósofo Schopenhauer: “Quão longa é a noite do tempo sem limites comparada com o curto sonho da vida!” Mario se foi mas continua vivo em Casimiro. Um curta-poema sobre a delicadeza do instante de cada um. Uma confissão de fé na qualificação humana. Não à toa, Joel Barcellos, que vive o personagem de Casimiro, canta um samba diante da sepultura do poeta, imprimindo-se enquadramentos desconexos na voluptuosidade dos afetos vividos.
Ou seja, não é um filme enganador como muitos, onde a inteligência e a sensibilidade estão ausentes. O gozo é justamente o encontro de amigos dando grandeza a um complexo cinema de poesia. Nossa imaginação compraz-se em ser purificada e existir como oposição ao jogo espetacularizado da TV e do poder. O caminho de Casimiro é o da linguagem atormentada da vida e da morte. Mario Carneiro e Paulo Cesar dignificam o esforço de muitas gerações por um cinema mais denso, amoroso e humano.
16/5/2009
Fonte: ViaPolítica/Os autores
Homofobia
Náufrago da Utopia
HOMOFOBIA ELEITORAL TAMBÉM É CRIME
Posted: 16 Oct 2012 07:16 AM PDT
Durante esta fase em que estarei priorizando o parto do meu segundo livro, continuarei, como antecipei, a posicionar-me em questões de maior relevância.
Também seguirei divulgando textos de autores que me são afins, como o desta 3ª feira (16) do filósofo Vladimir Safatle, Os novos reféns, reação implícita aos ataques
eleitoreiros contra Fernando Haddad em função do kit gay que o Ministério
da Educação começou a distribuir durante a sua gestão.
Vale lembrar que, também por motivos eleitoreiros, o governo do PT recuou de forma vergonhosa no episódio em questão, cedendo a mais uma chantagem das bancadas evangélicas. Ou seja, a campanha de José Serra está chutando cachorro morto.
Feita a ressalva de que deveria ter dado nome aos bois, concordo com o que está dito no artigo do Safatle (abaixo reproduzido na íntegra) em gênero, número e grau.
As diátribes dos Bolsonaros não
passam de "enunciados criminosos"
Os homossexuais tornaram-se os novos reféns da política brasileira. O nível canino de certos embates políticos fez com que setores do pensamento conservador procurassem se aproveitar de momentos eleitorais para impor sua pauta de debates e preconceitos.
Eleições deveriam ser ocasiões para todos aqueles que compreendem a igualdade como valor supremo da República, independentemente de sua filiação partidária, lutarem por uma pauta de modernização social que inclua casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, permissão de adoção de crianças e constituição de família, além da criminalização de toda prática de homofobia e do engajamento direto do Estado na conscientização de seus cidadãos. Parece, no entanto, que nunca nos livraremos de nossos arcaísmos.
Alguns acreditam que se trata de liberdade de expressão admitir que certos religiosos façam pregações caracterizando homossexuais como perversos, doentes e portadores de graves desvios morais. Seguindo tal raciocínio, seria também questão de liberdade de expressão permitir que se diga que negros são seres inferiores ou que judeus mentem em relação ao Holocausto.
Sabemos muito bem, contudo, que nada disso é manifestação da liberdade de expressão. Na verdade, tratam-se de enunciados criminosos por reiterar proposições sempre usadas para alimentar o preconceito e a violência contra grupos com profundo histórico de exclusão social.
Como em 2010, a campanha de Serra
apela para os piores clichês direitistas
Nunca a democracia significou que tudo possa ser dito. Toda democracia reconhece que há um conjunto de enunciados que devem ser tratados como crime por fazer circular preconceitos e exclusão travestidos de "mera opinião".
Não há, atualmente, nenhum estudo sério em psiquiatria ou em psicologia que coloque o homossexualismo enquanto tal, como forma de parafrenia (categoria clínica que substituiu as perversões).
Em nenhum manual de psiquiatria (DSM ou CID) o homossexualismo aparece como doença. Da mesma forma, não há estudo algum que mostre que famílias homoparentais tenham mais problemas estruturais do que famílias compostas por heterossexuais.
Nenhum filósofo teria, hoje, o disparate de afirmar que o modelo de orientação sexual homossexual é um problema de ordem moral, até porque a afirmação de múltiplas formas de orientação sexual (à parte os casos que envolvam não consentimento e relação com crianças) é passível de universalização sem contradição.
Impedir que os homossexuais tornem-se periodicamente reféns de embates políticos é uma pauta que transcende os diretamente concernidos por tais problemas. Ela toca todos os que lutam por um país profundamente igualitário e republicano.
(C. Lungaretti)
terça-feira, 23 de outubro de 2012
Cuba
A Operação Condor contra Cuba
Quando se fala da Operação Condor, a maioria somente pensa nos países da América do Sul. Pesquisador mostra que, entre os propósitos supremos que originaram o plano macabro aparece, de maneira explícita, enfrentar a influência de Cuba no hemisfério e apoiar internacionalmente os terroristas cubanos em suas operações contra Cuba.
Elías Argudin Sánchez
No mundial de futebol de 1978, a Argentina venceu o Peru por seis gols a zero. Com esta vitória eliminava um contrário de consideração (o Brasil, no caso). O triunfo inclinou a balança a favor das aspirações dos argentinos de ficarem campeões. Quatro dias depois, dominaram por 3-1 os holandeses e acabaram ganhando a coroa.
O resultado do encontro entre estes dois times classifica como muito controverso na história do mais universal dos esportes. Muito poucos acreditaram no conto desse triunfo. A vida deu a razão àqueles que duvidaram. Hoje, soube-se que o ditador peruano Francisco Morales Bermudez (1975-1980) ordenou aos representantes de seu país entregar o partido, como pagamento a um favor que pedira a seu parceiro argentino, o também sátrapa Jorge Rafael Videla, presidente de fato de 1976 a 1981.
Este foi um conluio, armado no âmbito dum pacto tenebroso, batizado com o nome da maior ave carniça do planeta, originária da América do Sul.
A Operação Condor é o apelativo com o qual denominaram um plano de inteligência e coordenação — estabelecido na década de 70 do século passado — entre os serviços secretos dos regimes militares do Cone Sul: Argentina, Chile, Brasil, Paraguai, Uruguai e Bolívia. Tratava-se duma organização clandestina internacional para a prática do terrorismo de Estado, com a cooperação dos EUA, nomeadamente da Agência Central de Inteligência (CIA).
Não podemos obviar que na reunião constitutiva participou um representante especial da CIA como “observador”. O encontro teve lugar no Chile, nos finais de 1975, mas em realidade a operação começou um ano antes.
O diabólico engendro dava luz verde ao livre movimento — nos citados territórios — dos integrantes das forças armadas e paramilitares, envolvidos em atividades de espionagem e repressão contra os opositores, fundamentalmente os militantes revolucionários da região.
Baseado numa muito bem pensada estrutura organizativa supranacional, o operativo Condor trouxe como resultado — ao longo de mais duma década de atuação escusa — o sequestro, tortura, violação, assassinato e desaparecimento de milhares de pessoas que — duma forma ou outra — se atreveram a desafiar os mencionados regimes ditatoriais: Reprimir e matar! Essa era a questão.
De fato, o polêmico partido entre os times da Argentina e Peru não se limitou à desonra duma nação, cujos representantes passivamente deixaram-se espezinhar no campo. De ter sido assim, a traição do time — embora triste e dolorosa — bem poderia considerar-se como o episodio menos tenebroso dentro dos voos do Condor, mas a ação foi uma sorte de compensação de Morales Bermudez pela transferência à Argentina de 13 peruanos presos, militantes da esquerda, que durante a viagem seriam jogados ao rio La Plata de um avião. Videla necessitava esse triunfo para limpar a imagem da Argentina ante o mundo.
Infelizmente, a ave de rapina bateu asas e matou. Alguém disse, com muita razão, que a Operação Condor deu muitas provas de sua terrível eficiência.
Precisamente pesquisar nesse inferno, onde a crueldade humana e o espanto atingiram sua máxima expressão, tem sido um dos objetos de estudo de José Luis Méndez Méndez, professor universitário e escritor dedicado à pesquisa do terrorismo, com ênfase nas práticas e ações empregadas contra nosso país.
Seu incessante e intenso discorrer pela história mais recente do continente o tornam a voz cubana mais autorizada para falar do tema, o qual também lhe permitiu trazer à baila um capítulo pouco divulgado de La vida del Condor: sus zarpazos contra la Isla.
Quando se fala da Operação Condor, a maioria somente pensa nos países da América do Sul. Contudo, da entrevista que Méndez concedeu ficou claro uma coisa: “entre os propósitos supremos que originaram o plano macabro aparece, de maneira explícita, enfrentar a influência de Cuba no hemisfério e apoiar internacionalmente os terroristas cubanos em suas operações contra Cuba”.
Existem documentos que provam essas afirmações. Uma carta do coronel Manuel Contreras Sepúlveda, ex-chefe da Direção de Inteligência Nacional (DINA) chilena, dá conta de como se organizou a coordenação. O centro principal da organização repressiva se instalou em seu país, embora as presas mais afiadas do Condor estavam na Argentina e no Paraguai. Este sanguinário castrense foi o responsável pelo assassinato de Orlando Letelier, chanceler do governo da Unidade Popular, liderado por Salvador Allende, crime levado a cabo em território estadunidense por terroristas de origem cubana.
Também se soube que naquele encontro inicial, Contreras informou seus homólogos participantes que para as ações mais perigosas utilizariam cubanos anticastristas, recrutados e treinados pela CIA.
Segundo as investigações de Méndez Méndez, reunidas numa exposição e num livro, ambos sob o título A Operação Condor contra Cuba, as ações contra Cuba eram a maneira com a qual os diretivos da operação pagavam os serviços dos contrarrevolucionários cubanos.
“Na infeliz relação aparecem nomes como: Orlando Bosch, Luis Posada Carriles, Guillermo Novo Sampoll, Rogelio Pérez González, Alvin Ross, Virgilio Paz Romero, José Dionisio Suárez Esquivel”, etc.
“Em 15 de junho de 1976, na República Dominicana, sob ordens da CIA, teve lugar uma reunião de organizações contrarrevolucionárias cubanas. Desse encontro nasceu a Coordenação de Organizações Revolucionárias Unidas (CORU) e imediatamente começaram a atentar contra os interesses cubanos na Europa e na América Latina”.
“Em agosto, impuseram uma nova modalidade de terrorismo: o sequestro de diplomatas. E de cidadãos nacionais contratados em embaixadas para as tarefas de apoio.
Eis alguns exemplos: em julho de 1976, tentativa de sequestro do cônsul cubano em Mérida, onde foi assassinado o funcionário Artañan Díaz Díaz .
Em agosto desse mesmo ano sequestram Jesús Cejas Arias (22 anos) e Crescencio Galañena Hernández (26 anos), dois funcionários da embaixada em Buenos Aires, onde também fizeram o mesmo com 17 argentinos, trabalhadores (da própria sede, do escritório comercial e da escola anexa) e alguns de seus familiares mais íntimos.
Segundo nosso interlocutor, também houve outras tentativas e fatos deste tipo, o embaixador Emilio Aragonés sofreu um atentado, “casualmente” em 13 de agosto de 1975. Felizmente, saiu ileso.
“Nem sempre a boa sorte nos acompanhou, no atentado com bomba contra a embaixada de Cuba em Portugal morreram Adriana Corcho e Efrén Monteagudo. Também recebemos envios de cartas-bombas em nossas sedes diplomáticas na Espanha, México e Peru”.
Também se soube que dinamitaram e afundaram diversos navios. Contudo, segundo Méndez, nada mais dramático, cruel e nojento que a explosão em pleno vôo dum avião civil da Cubana de Aviação, frente às costas de Barbados.
“Levava 73 passageiros a bordo. Não houve sobreviventes. O mais triste é que, antes e depois do crime de 6 de outubro de 1976, foram organizados 13 planos para fazer explodir outros aviões civis cubanos”.
Os detalhes sobre este brutal ato criminoso são de domínio público. Todo mundo sabe o nome, tanto dos autores materiais como intelectuais.
Contudo, chama a atenção um detalhe: imediatamente depois, o jornal El Miami Herald publicou uma notícia sobre o telefonema dum indivíduo que adjudicava a autoria do atentado a um grupo denominado El Cóndor.
Era a primeira vez que a palavra se escutava publicamente!
Nota: Esta é uma história inconclusa até não aparecerem todos os cadáveres dos sequestrados para dar-lhes devida sepultura. Para pôr o ponto final também é necessário sentar cada um dos culpados no banco dos réus, para serem julgados como merecem.
(*) Publicado originalmente na Tribuna de La Habana
(*) Jornalista cubano, escreve na Tribuna de la Habana.
(Carta Maior)
Mobilização
O território das novas revoluções
Posted in: Alternativas, Capa, Pós-Capitalismo
Por: admin - 18/10/2012.
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Quando juventude das quebradas comunicar-se sem intermediários, as estruturas cedem, garante Celso Athayde: “Porque só há opressão quando há omissos”
Entrevista a Inês Castilho | Imagem: Ratão Diniz
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MAIS:
Caminhos para a Política Cidadã no século 21
Em meio a críticas e esperanças, pensadores e ativistas debatem como superar crise da representação e reinventar democracia.
Leia também, nesta série, as entrevistas com Fernando Meirelles, Ricardo Abramovay, Eduardo Viveiros de Castro e Drica Guzzi.
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“Quem não estiver feliz tem que levantar o dedo, ainda que seja o dedo médio”, dispara o produtor cultural Celso Athayde, um dos fundadores da Central Única das Favelas, a CUFA, no Rio de Janeiro, ao convocar a juventude moradora das favelas a assumir seu próprio destino. “Só existe uma forma de fazer revolução social no país: é esses jovens que sofrem o impacto da desigualdade social assumirem o protagonismo da mudança. Não existe para sempre um opressor e um oprimido, só haverá opressor se houver omissos” – diz ele, em mais um diálogo da série “Outra Política”, realizado no âmbito do estudo “Política Cidadã”, que o Instituto Ideafix produziu para o IDS (Instituto Democracia e Sustentabilidade).
Autor, com o rapper MV Bill, do livro Falcão-Meninos do Tráfico, que deu origem a um documentário; e de Cabeça de Porco, este em parceria com MV Bill e o antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário nacional de Segurança Pública – Athayde revela seu entusiasmo diante das possibilidades abertas à juventude das quebradas pela comunicação via redes sociais (como frisou Drica Guzzi em sua entrevista).
“Não tem como desconsiderar que as redes sociais vieram para ficar e para dividir um espaço significativo com as mídias formais”, sustenta Celso. “Quanto mais as pessoas conseguem operar essas máquinas, mais próximas das informações, mais perto da revolução elas ficam, mais chances de ser livres terão.” Ao dizer isso, recorda a necessidade de engrossar a luta por banda larga de qualidade, junto com educação de qualidade (como defendeu o antropólogo Viveiros de Castro em outra de nossas conversas).
As novas formas de comunicação livram os jovens da manipulação da grande mídia: da imagem negativa que ela imprime às favelas ou, por ocultamento, da imagem que não traz, da sociabilidade amorosa: “O amor está nas escolas, nos presídios, no trabalho. Contudo, parte da sociedade monstrifica esses seres humanos territorialmente distantes – as tais comunidades. Os noticiários deixam a impressão de que tudo está perdido, as relações estão dilaceradas.”
Celso se declara admirador do MST, Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, sobretudo pela audácia com que ele luta por aquilo em que acredita. “A democracia plena só vai existir quando as pessoas tiverem os mesmos direitos e as mesmas oportunidades”, diz ele. “Somos a sexta economia mundial e temos milhares de pessoas vivendo abaixo do limite da pobreza.”
A CUFA, instituição de que é secretário geral, vem compartilhando com outros países e estados brasileiros a experiência acumulada em condições difíceis: excelência em superação e solidariedade, maestria em dar nó em pingo d’água – afinal, o Brasil é líder planetário em desigualdade. “A ideia de que os países desenvolvidos não têm problemas porque são ricos não é verdadeira. Existem problemas em todo lugar, seja porque os pobres mundiais migram em grande escala para esses países ou por outra razão.”
Vivemos uma encruzilhada, escreveu Immanuel Wallerstein: “o sistema-mundo capitalista vive uma bifurcação, em que a ação coletiva da humanidade determinará que tipo de ordem mundial teremos no futuro, para o bem ou para o mal.”
A encruzilhada, na umbanda, é um ponto de força utilizado para o descarrego de energias negativas. À semelhança das cachoeiras e praias emana vibrações energéticas especiais. Está propícia, portanto, ao exorcismo das forças do atraso da desigualdade mundial, que mantêm os países desenvolvidos, com 20% da população global, consumindo 80% dos recursos naturais. A seguir, a entrevista. (Inês Castilho)
Como você percebe a participação política do brasileiro?
A gente tem crescido e se desenvolvido, mas bem aquém do que deveríamos. Ainda há um ódio muito grande contra os políticos e da política, na classe social com que convivo. Por isso acabamos sendo dirigidos por outras camadas sociais, a dos coronéis, muito mais atentos e agressivos. As pessoas da classe fodida não têm muita crença em mudanças – o que faz com que se distanciem dessa realidade. A contribuição única acaba sendo votar, ou mesmo vender seus votos. Mas de certa maneira todos vendem ou negociam seus votos: o que difere são os preços praticados.
A própria eleição da Dilma mostrou um pouco esse crescimento. Era de um lado o poste e do outro a grande máquina da mídia – e o voto foi consciente, não de protesto como em outros momentos. Só que, no dia a dia, não se vê ânimo em relação à política formal. Prefiro crer que estamos iniciando um processo.
Quais os temas que mobilizam a sociedade, falando particularmente das classes populares?
Juventude. A gente tem acompanhado um debate muito interessante no campo do trabalho e renda, discussões sobre a massificação da mídia. A juventude do movimento negro e movimento de estudantes tem se empenhado em relação a esses temas.
As rádios comunitárias estão aumentando de maneira muito acentuada. Essa juventude está tendo a oportunidade de ter as redes sociais para se comunicar, e com isso fazer grandes intervenções. Estão se valendo delas como uma grande ferramenta: por lazer, para namorar, para fazer intervenções coletivas nas relações comerciais e políticas.
É um debate muito bom que está acontecendo. Mais que isso, está sendo uma prática diária dessas classes menos privilegiadas.
A tecnologia e as redes sociais têm um papel nos processos de mobilização política, a seu ver?
Não tem como desconsiderar que as redes sociais vieram para ficar e para dividir um espaço significativo com as mídias formais. O mundo mudou a partir disso e, necessariamente, a mobilização da juventude passa por esse desenvolvimento. Quanto mais as pessoas conseguem operar essas máquinas, mais próximas das informações, mais perto da revolução elas ficam, mais chances de ser livres terão.
Essas diversas formas de comunicação estão livrando essa juventude da lógica perversa a que a mídia formal submete as pessoas. Insisto em lembrar que são moradores das favelas – onde vivem em desvantagem social –, e que hoje criaram uma liga de empreendedores comunitários, seguro de vida grátis e muitos outros ativos para as favelas. Mais importante do que a ação é assumir o risco de tentar – isso é o que tem feito a diferença.
Fale sobre a Central Única das Favelas, a CUFA.
A CUFA começou como movimento hip hop e veio a entender que a cultura hip hop não é só os quatro elementos – o break, que é a dança; o grafite, que é arte plástica; DJ, o maestro; e rap, o canto. É mais o sentimento de transformação que essa juventude precisa ter. O MV Bill é um dos nossos fundadores, e minha maior alegria é dizer que o Bill ficou famoso e usa essa fama para viabilizar um monte de gente. Ele se transformou em um nome forte, mas que seria inútil, como ele diz, se não fosse usado para a coletividade, dar poder aos jovens. Nunca se comportou como artista, não aceita essa ilusão.
A CUFA é uma instituição de jovens de favelas, cujo déficit cultural é muito grande. Ela possibilita a jovens como eu, sem nenhum estudo, se desenvolver em várias esferas – inclusive se relacionando com instituições que sempre criticaram, e mantendo sua crítica à Rede Globo e aos governos. O fato é que não podemos acreditar que existe para sempre um opressor e um oprimido. Precisamos crer que só haverá opressor se houver omissos. Quem não estiver feliz tem que levantar o dedo, ainda que seja o dedo médio. O sistema somos todos nós juntos, a CUFA entendeu isso.
É uma instituição de jovens que diziam que todo mundo é opressor. Só que, ao dizer isso, esses jovens se colocavam automaticamente na condição de oprimidos. Sair do lugar do oprimido e se relacionar com aqueles que, em tese, são os opressores – essa era a grande encruzilhada. Parar de acusar as pessoas de playboy por terem acesso à coisa pública ou possuírem bens – mas valer-se também dos próprios direitos, a partir do conhecimento. Transformar suas relações, desenvolver-se e integrar-se socialmente, ganhar corpo e sentar-se à mesa onde se decide o seu futuro. É fácil? Não, não é. Mas a CUFA tem conseguido mostrar que impossível também não é.
Qual a contribuição da CUFA ao aprofundamento da democracia brasileira?
Acreditamos que só existe uma forma de fazer revolução social no país: é esses jovens que sofrem o impacto da desigualdade social assumirem o protagonismo da mudança. Se eles, que sofrem as grandes diferenças, não estiverem preparados ou condicionados a se preparar, a desgraça humana vai continuar. Pois quando esse monte de gente bem intencionada, de bom coração, que dá esmola e assim consegue dormir mais tranqüila – quando essas pessoas não puderem ou não quiserem mais ajudá-los, o processo de depressão vai continuar. Pois eles se transformaram em escravos dessa lógica de aceitar migalhas, ao invés de desenvolver e organizar o seu próprio destino.
Agora, pedir que as pessoas sejam fortes é fácil – já os exemplos são muito difíceis. Minha mãe sonhava que eu fosse borracheiro e minha irmã, empregada doméstica que não roubasse a patroa; não conseguia imaginar minha irmã patroa. Romper com esse sentimento é nosso maior desafio: não só dizer, mas demonstrar, conviver com os exemplos bem sucedidos. Na verdade, esse é o maior legado que podemos deixar aos nossos filhos. Não conseguimos ainda massificar essa mobilidade social.
Qual a presença da CUFA nos territórios das favelas?
Quando a CUFA assume a perspectiva de transformar esses jovens em protagonistas, de trabalhar para eles entenderem a necessidade dessa transformação, torna-se uma instituição relevante. Está hoje em 412 cidades, de 17 países – em alguns tem mais de dez bases. Nos Estados Unidos a sede é em Saint Louis, mas tem base no Brooklin [em Nova Iorque], na Califórnia… Hoje a gente sabe que são intensos os conflitos na Inglaterra, na França. É falsa a ideia de que os países desenvolvidos são ricos e não têm problemas. Existem problemas em todos os lugares, seja porque os pobres mundiais migram em grande escala para esses países ou por outra razão.
O papel da CUFA não é resolver os problemas das pessoas, mas estimulá-las a buscar suas soluções. Através de uma grande rede os problemas são resolvidos com menos traumas. A CUFA não é mais uma organização para as favelas, mas de pessoas de favelas que pregam a felicidade para todos. Queremos avançar sem fazer disso uma plataforma de marketing, as pessoas fazem parte da CUFA por convicção.
Que trabalhos vocês desenvolvem?
O primeiro grande ativo da CUFA é: como esses jovens de favela podem desenvolver seu próprio processo de construção? Essa é a luta, por vários caminhos – por exemplo o Top CUFA Brasil, a Taça das Favelas, as Olimpíadas das Favelas, Falcão Meninos do Tráfico, o Prêmio Anu, Comunidade Segura, Jungle CUFA, Data CUFA, A Ponte. Tem o audiovisual, o esporte, o basquete de rua – uma marca nossa. O curso de qualificação profissional, feito em vários lugares, que se adapta às características locais com o objetivo de democratizar o poder e descentralizar as oportunidades.
A CUFA ganhou o Prêmio Darcy Ribeiro 2010, da Câmara dos Deputados em Brasília, por ter formado mais de 100 mil jovens no ano. Criou um projeto de audiovisual, com o conceito de que a favela já foi muito retratada e agora é a hora dela retratar o mundo. Oferece às pessoas das favelas ferramentas para que busquem as referências que quiserem. Queremos que formulem seus próprios pensamentos, e isso se dá através desses projetos e também por outros, como o Aglomerado, programa de tevê [TV Brasil], e vários programas de rádio. São meros fio condutores de um processo – não de mediação de conflitos, mas de mediação de felicidade e de paz.
A seu ver, o que caracteriza as relações das pessoas com a família, a comunidade, a sociedade?
Comunicação e lealdade. A sociabilidade é a maior característica do ser humano. Quando você se relaciona com as famílias, os grupos, as pessoas, vê que o amor está ali. O amor está nas escolas, nos presídios, no trabalho. O amor, com suas faces e formas, é o que permite às relações fluírem.
Contudo, outra parte da sociedade monstrifica esses seres humanos territorialmente distantes – as tais comunidades. Elas são vistas a partir de noticiários nos quais as pessoas se matam – por amor ao sonho da mobilidade social. Esses noticiários deixam a impressão de que tudo está perdido, as relações dilaceradas. Acontece que, mesmo no caso das pessoas envolvidas com crack, as relações se despedaçam mas se vê o tamanho da paixão, o sofrimento das famílias na tentativa de resgatar seus entes queridos.
Algum movimento social chamou sua atenção recentemente, no Brasil ou em outros países?
O MST sempre foi uma grande referência pra mim, sobretudo pela audácia com que lutam por aquilo em que acreditam. Mas, como todos os movimentos, precisam rever certas questões. O MST entrou na mira da própria esquerda. Não quero analisá-lo por falta de propriedade, só quem está dentro da guerra sabe o tamanho da dor. Mas as críticas dizem que deixaram de ser solidários a pautas que não eram necessariamente suas, se distanciando de movimentos que sempre os apoiaram. Ao participar da pauta de outros movimentos, o MST fazia com que se apaixonassem pela sua pauta, de perto. Mas passou a caminhar só – e a ter só parte da compreensão do que representa.
É fundamental que os movimentos trabalhem em rede, não acredito em nenhum movimento que não prospere a partir da rede. Se não, passa a fazer ações que podem dar resultados pontuais, mas não mudar o padrão social em que a gente vive. Uma organização que faz a opção de caminhar sózinha não é organização social, mas uma empresa de marketing social vestida de Ong ou algo que o valha.
Pensando em tudo o que falou até aqui, você imagina novas formas de fazer política? Que valores sustentariam esse modelo?
A democracia é o melhor dos modelos, desde que plena. Reconheço que muitas vezes é sinônimo de zona, arrisco até a dizer um absurdo: a melhor democracia é aquela praticada pelas pessoas que pensam como nós. Mas democracia plena só vai existir quando as pessoas tiverem os mesmos direitos e as mesmas oportunidades. Somos a sexta economia mundial e há milhares de brasileiros vivendo abaixo do limite da pobreza. Se tem miséria, não há oportunidades iguais.
O mundo caminha para o caos. Foi importante tentar outros modelos, mas cada pessoa vai ter que achar uma forma de ser feliz socialmente, dentro do coletivo. O equilíbrio social pode se dar em um país onde existam milionários e proletariado. Ninguém precisa ser infeliz porque é proletário – você pode ter a dignidade garantida. Um país livre, democrático é aquele que permite a mobilidade social pela capacidade das pessoas, testadas a partir das oportunidades. Aí a democracia funciona para todos.
Como você vê a questão do consumo, da publicidade?
Não existe como fugir desse aguçar do consumo, quando se vive em um país capitalista. Nossa cultura é baseada na sexualidade e na perene promiscuidade, e consumir é de certa maneira manter sólidas essas referências, significa seduzir o outro o tempo todo. A publicidade joga mais lenha nessa fogueira e mantém aquecidos os mercados.
Ao mesmo tempo em que a gente critica a forma como as pessoas são induzidas a consumir, argumenta-se que é o consumo que faz a máquina girar, a partir dele é que conseguimos equilibrar a economia. Nos momentos tensos, o próprio governo pede que as pessoas consumam, para evitar do país cair em depressão.
O que vale para o capitalismo é o dinheiro – o amor é apenas um detalhe. Seu filho quer o tênis que todos estão usando. Somos escravos do consumo, assim como da sexualidade. Qual o sonho das pessoas? A mobilidade social: ter um carro bacana. Vocês querem ter uma casa bacana, querem que seus filhos estudem em uma boa escola para competir melhor no futuro. Estão preparando seus filhos para uma guerra, não só a do conhecimento, é a do consumo também.
O consumo é o que faz você ter personalidade, ter as melhores coisas, é que leva a pessoa a se sobressair nos meios sociais. Nossas relações são baseadas naquilo que se possui, desde criança – quem tem ou exibe mais posses terá mais influência, status e poder. O consumo precisa ser tão abominado quanto é desejado.
Você acha que a espiritualidade tem algum papel na vida, na felicidade das pessoas?
A gente vê no dia a dia: o jovem que tem compromisso com a espiritualidade é mais focado, concentrado, e vive em grupos de um risco muito menor. Parecem mais felizes e levam vantagens em relação a outros jovens. Têm grupos mais sólidos e um código de ética, compromissos que transcendem a vida familiar. Os jovens que não têm contato com a espiritualidade têm suas relações sociais limitadas à família e à escola. Mas é importante saber qual é a felicidade que cada pessoa contempla – não descobri minha relação com a espiritualidade e me considero feliz e realizado. Pregar a espiritualidade é como obrigar as pessoas a acreditarem em Deus. É dizer a elas que faz parte do bom senso ser parte do consenso.
A CUFA tem um grupo de LGBT – o que cria conflitos com os grupos evangélicos da CUFA. Ao mesmo tempo em que não podemos admitir que os direitos humanos sejam violados, não podemos oprimir a orientação religiosa das pessoas – e muitas entendem que o homossexualismo é um câncer social e moral. Não é fácil conviver com isso. Tem também o conflito dos evangélicos com o candomblé. Esse debate permanente leva a instituição a se voltar mais para a discussão dos direitos humanos do que para a da sexualidade. Temos que conviver com os conflitos que existem – e tendem a se acirrar.
Procuram trabalhar com as semelhanças…
Sim, pensar no desenvolvimento social dessas pessoas, cujo futuro sempre foi planejado pelos outros. Em busca de um projeto de construção de identidade, encontramos esse: uma grande rede, administrada por poucas pessoas, mas na qual todos tivessem benefícios claros, objetivos, e independência. Esse é o maior mérito da CUFA.
Por ter vivido a vida inteira em favelas, o tráfico sempre foi uma referência para mim. O estatuto do tráfico pregava paz, justiça e liberdade. Essa paz nunca existiu; liberdade menos ainda, pois a base era a escravidão; e a justiça era baseada no entendimento de cada um. Para a CUFA, tudo o que eu não queria era isso. Mas já na criação da cúpula da CUFA começava um processo de opressão, a partir do momento em que instituiríamos quem mandava e quem obedecia. Decidimos então que o nosso modelo seria uma grande rede em que todos fossem independentes, donos dos seus espaços, mas deveriam satisfação ao coletivo. Um dia sentaríamos para profissionalizar esse sentimento. É o que estamos fazendo agora, apoiados pela Fundação Dom Cabral: sistematizando essa loucura que criamos até aqui.
O mundo se desenvolve através de símbolos, são os heróis que nos posicionam, e não temos mais heróis. Carecemos, em todos os processos políticos, de grandes lideranças ou referências por quem a gente tenha prazer de se guiar. Houve um momento em que havia líderes mundiais amados, como Che Guevara. Pensar nos anos dourados de chumbo traz um romantismo saudável, apesar da dor…
Você viveu essa época?
Não vivi, mas o tráfico viveu, bebeu dessa fonte. A Falange Vermelha foi influenciada pelo MR8 e pela Var-Palmares, e mesmo por livros como Guerra e paz [Leon Tolstói, publicado em 1865-69]. As pessoas tinham motivos para fazer mais, para lutar. A involução tem contribuído para o esvaziamento da qualidade de tudo: a música não tem mais a qualidade de antes, as lutas não têm mais razões do que antes.
Se me perguntar se será melhor direi que sim, mas vai ser difícil dormir convencido disso. O mundo caminha para onde deveria ir – para o caos. Dizer isso é ruim, bom mesmo é dizer o contrário e ir tomar um chope. Os países-referência ruíram, quem vai apagar essa luz? Às vezes dá a impressão de que colocaram os seres humanos em uma caixinha sem porta de saída, como se fossem ratos, e eles vão vivendo, se alimentando com o que tem na caixinha, fazendo sexo, se reproduzindo. Um dia a comida vai acabar e os ratos vão se matar.
É o futuro que vê?
O mais difícil é assumir isso. Prefiro fazer como as ciganas que leem nossas mãos: todas dizem que seremos felizes. Se é verdade não sei, mas o pagamento a elas se justifica pelo apoio moral.
(Outras Palavras)
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