Pornografia
Ricardo de Mattos
Opinião sobre a Pornografia, por Wislawa Szymborska*
Fonte: http://readanywhere.tumblr.com
Não há devassidão maior que o pensamento.
Essa diabrura prolifera como erva daninha
Num canteiro demarcado para margaridas.
Para aqueles que pensam, nada é sagrado.
O topete de chamar as coisas pelos nomes,
A dissolução da análise, a impudicícia da síntese,
A perseguição selvagem e debochada dos fatos nus,
O tatear indecente dos temas delicados,
A desova das ideias - é disso que eles gostam.
À luz do dia ou na escuridão da noite
Se juntam aos pares, triângulos e círculos.
Pouco importa ali o sexo e a idade dos parceiros.
Seus olhos brilham, as faces queimam.
Um amigo desvirtua o outro.
Filhas depravadas degeneram o pai.
O irmão leva a irmã mais nova para o mau caminho.
Preferem o sabor de outros frutos
Da árvore proibida do conhecimento
Do que os traseiros rosados das revistas ilustradas,
Toda essa pornografia na verdade simplória.
Os livros que divertem não têm figuras.
A única variedade são certas frases
Marcadas com a unha ou com lápis.
É chocante em que posições
Com que escandalosa simplicidade
Um intelecto emprenha o outro!
Tais posições nem o Kamasutra conhece.
Durante esses encontros só o chá ferve.
As pessoas sentam nas cadeiras, movem os lábios.
Cada qual coloca sua própria perna uma sobre a outra.
Dessa maneira um pé toca o chão,
O outro balança livremente no ar.
Só de vez em quando alguém se levanta,
Se aproxima da janela
E pela fresta da cortina
Espia a rua.
(*) poetisa polonesa, em Poemas, página 85.
(Digest. Cultural)
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