segunda-feira, 23 de dezembro de 2013
A. Latina
Um ano difícil para os governos progressistas da América Latina
Um ano difícil para os governos progressistas da América Latina
Chega ao fim um ano que apresentou importantes dificuldades para os governos progressistas de nossa região. O caso mais emblemático é o venezuelano.
Ariel Goldstein
Chega ao fim um ano que apresentou importantes dificuldades para os governos progressistas de nossa região. Ao final do ano, o triunfo de Michelle Bachelet no Chile foi uma das poucas notícias positivas para a esquerda regional. O caso mais emblemático no que diz respeito à debilidade que mostram certos processos políticos é o venezuelano. A polarização vivida no país, a política de trincheiras entre chavistas e antichavistas, acentuada a partir da vitória apertada de Nicolas Maduro nas eleições de 14 de abril, se soma a uma crise econômica com efeitos inflacionários, de modo que será preciso seguir observando esse processo político com atenção para avaliar as suas possibilidades de continuidade.
No Equador, no início do ano, houve uma vitória folgada de Rafael Correa nas eleições presidenciais. Correa é uma liderança que combina o manejo de qualidades tecnocráticas com as virtudes do líder carismático, duas condições difíceis de encontrar juntas. A direção do processo político equatoriano encontra-se firme.
O Brasil viu estourar em junho deste ano manifestações importantes nas principais cidades que questionaram até que ponto as transformações produzidas por uma década de governos do PT, com políticas sociais de redistribuição como o Bolsa Família, apresentam limites consideráveis e problemas pendentes em matéria de saúde, transporte, bem como a ausência do Estado no espaço público. O governo de Dilma Rousseff se prepara para enfrentar a campanha presidencial de 2014, para a qual a presidenta aparece bem posicionada nas pesquisas.
A Argentina, por sua vez, termina o ano em meio a saques produzidos a partir de sublevações policiais, onde o crescimento de certa redistribuição de renda da última década, somado ao estancamento da atual conjuntura, gera um caldo de cultura, ou como diz o sociólogo Javier Auyero, “contextos de oportunidade” para a proliferação destes fenômenos. O mandato do atual governo argentino, que termina em 2015, deve encontrar uma sucessão no interior de seu projeto político, mas se encontra um pouco debilitado depois das eleições legislativas deste ano, onde os resultados nos principais distritos do país não foram favoráveis, embora siga sendo a primeira força em nível nacional e mantenha maioria no Congresso.
A partir da análise dos acontecimentos deste ano, dois elementos devem ser considerados:
O problema das lideranças: extensamente tratado, especialmente com respeito aos movimentos nacional-populares da América latina, a sucessão para estes processos políticos resulta um tema difícil que tem se expressado ultimamente, tanto Cristina Kirchner, que não poderá disputar a reeleição em 2015, como Lula no Brasil, que conseguiu eleger Dilma Rousseff sua sucessora, e Chávez que, ante sua morte, escolheu Nicolas Maduro como sucessor, enfrentaram esse problema. Poderia se acrescentar ainda o que aconteceu com a Concertação chilena em 2010, quando Michelle Bachelet saiu do governo com 80% de aprovação, mas o sucessor indicado por sua coalizão, Eduardo Frei, acabou derrotado por Sebastián Piñera.
Estes casos demonstram que, embora as lideranças não sejam insubstituíveis, são uma parte central desses processos políticos, como elementos de identificação da cidadania e mobilização de crenças que garantam a continuidade destes processos. No entanto, o limite à reeleição colocado pelas democracias latino-americanas obrigará as esquerdas regionais a buscar novos candidatos para suceder aos atuais mandatários. Esse é um aspecto difícil porque exige que esses candidatos à sucessão possuam duas condições que nem sempre se apresentam juntas: que consigam identificação com os eleitores e que possam ou estejam dispostos a representar uma continuidade dos projetos políticos de seus antecessores.
A reformulação das oposições: As oposições em vários países conseguiram, após o aprendizado sofrido em mais de uma década de importantes derrotas eleitorais, construir certos candidatos que representam suas aspirações, produzindo identificação com os eleitores e expressando certa projeção futura. Isso ocorreu principalmente na Venezuela, onde o candidato da Mesa de Unidade Democrática (MUD), Henrique Capriles, produziu a passagem da oposição de 36,9% dos votos a 62,8% (disputa entre Manuel Rosales e Chávez em 2006), para 44,3% a 55.07% em outubro de 2012, até chegar a quase 50% em abril deste ano.
Na Argentina, a emergência do prefeito de Tigre, Sergio Massa, que foi chefe de gabinete de Cristina Kirchner, também é expressão de um avanço nas possibilidades opositoras face às eleições de 2015. Estes dois candidatos, que são aqueles de maior projeção frente aos governos progressistas, combinam a promessa de continuidade de certas políticas que contam com importante aprovação, principalmente políticas sociais, e uma oposição especialmente ao “conflito” que estes governos sustentariam em suas disputas contra os fatores de poder.
As oposições políticas e corporativas aos governos do novo ciclo político inicialmente colocaram em um lugar central da disputa hegemônica sua capacidade de influência em nível corporativo e midiático de forma predominante.
Posteriormente, foram aproximando-se da construção de candidatos em sociedades altamente midiatizadas, capazes de gerar identificação com o eleitorado, disputando o sentido das políticas sociais e os avanços do novo ciclo político. Apoiando-se nas políticas realizadas nesta década pelos governos progressistas da região, as incorporaram em suas plataformas eleitorais, aumentando sua projeção.
De fato, após uma década de governos progressistas no poder, vimos emergir este ano novas dificuldades que devem ser analisadas com atenção pelas equipes governamentais se estas pretendem assegurar a continuidade de seus projetos políticos;
(*) Professor de Ciências Políticas no Instituto de Altos Estudos Sociais da Universidade de San Martín. Bolsista do CONICET no Instituto de Estudos de América Latina e Caribe, da Universidade de Buenos Aires.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
(Carta Maior)
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