segunda-feira, 16 de maio de 2011

Cuba

Cuba não indica maior participação e auto-gestão populares em seus desígnios


Escrito por Guillermo Almeyra
06-Mai-2011

Algumas informações sobre a direção do PCC: de 115 membros do Comitê Central, 78 já eram dirigentes nacionais e 18 provêem das Forças Armadas e do Ministério do Interior (Minint); 20 já eram dirigentes provinciais e oito dirigentes municipais; dois são reitores de universidades e apenas sete trabalham na produção e nos serviços. Entre os 15 membros do Birô Político (com quase toda sua totalidade de homens) a média de idade fica perto dos 70 anos, há só uma mulher e não há jovens com menos de 45. Nas vice-presidências dos comitês centrais ou de governo, de oito membros só um é mulher. No secretariado do Comitê Central (CC), de quatro membros há um do sexo feminino; entre os primeiros secretários provinciais há duas mulheres de 10; já as 6 primeiras secretárias municipais são mulheres. Entre os chefes do departamento de Estado ou do partido as mulheres são quatro de nove e entre os ministros duas de oito. Entre os membros do CC são oito generais de exército, 12 generais de divisão e somente dois reitores universitários (um homem e uma mulher, responsável pela educação física).

Pode-se dizer, pois, diante da composição do CC, que se trata de uma direção de burocratas militares, burocratas estatais e burocratas da cultura, que superam a meia idade e que estão mesclados com poucos tecnocratas mais jovens e do aparato estatal e partidário, que conta com pouquíssimas mulheres e jovens.

Como coloquei em artigo anterior, no Congresso o setor mais eficaz e produtivo da burocracia (o militar) impôs suas regras sobre o mais conservador e dogmático (o da burocracia partidária) e o subordinou ao funcionamento estatal, que o primeiro setor assegura em nome da eficiência e da mudança burocrática da burocracia.

O importante, de toda forma, é que a ampla discussão popular sobre o projeto apresentado desde as cúpulas do sistema, ainda que tenha sido feita sobre algo já cozinhado e em via de execução, serviu para dar uma via deformada de expressão às inquietudes populares (e para que o aparato as sondasse diretamente).

Essas discussões, por exemplo, fizeram desaparecer alguns dos aspectos mais aberrantes do projeto, como a criação de zonas especiais com plena liberdade ao capital, ao estilo China, os insultantes clubes de golf num país com pouca água e escassez de moradias populares, ou a proposta de permitir aos empresários recorrerem à mão de obra assalariada (como em qualquer país capitalista). E nos debates houve propostas de manter os subsídios (conhecidos como libreta) como instrumento estatal para o controle dos preços, não abolidos de imediato, mas gradualmente. Esta é outra expressão da inquietude popular, já que os subsídios foram apresentados como exemplo claro de um chamado igualitarismo nocivo, muito arraigado no imaginário coletivo, que se nega a aceitar como se fosse ética a distribuição pelo mercado, segundo o dinheiro dos compradores, e também a caridade estatal para os mais pobres.

No Congresso, segundo a experiência cubana, nem sequer se considerou que a participação dos trabalhadores seja um elemento político e econômico decisivo. Não se falou de orçamentos participativos, resultantes da livre discussão dos trabalhadores. Não se falou sobre como organizar a auto-gestão, que aumentaria, sem dúvidas, a produtividade e daria pista livre à criatividade e à economia de materiais que devem ser importados entre os contratos de diversos tipos, exigidos como reguladores; não se falou de dar vida aos contratos de trabalho com as empresas ou o Estado firmados por sindicatos democratizados e com participação consciente na produção. Seguiu-se discutindo, em compensação, sobre combinar o planejamento com o mercado, quando este último, por definição, é incontrolável, por ser mundial e caótico, sendo, conseqüentemente, impossível planificá-lo, mas apenas, no máximo, estabelecer alguns planos setoriais mais relaxados e controlá-los mediante o sistema de teste, erro e correção.

Não houve uma discussão séria a respeito de qual contexto mundial (econômico, político, ecológico) deverão se aplicar as resoluções do Congresso. Tampouco houve sequer uma referência autocrítica do por que, no momento mais difícil para a Revolução Cubana, o Congresso se postergou por nove anos. Menos ainda sobre os erros do passado cometidos pelos mesmos dirigentes que agora tentam uma retificação in extremis e em plena e absoluta obscuridade teórica.

Aonde irá Cuba, sobretudo se seguem aumentando os preços dos alimentos importados e do petróleo? Para mais capitalismo de Estado? Porque o que o governo qualifica de empresas estatais socialistas, baseadas no trabalho assalariado, não são mais que empresas estatais e só. Irá para uma impossível e reacionária via chinesa – liberdade de mercado, milionários socialistas e partido único comunista – como parece indicar o imediato apoio de Pequim ao governo cubano? Os dogmáticos desmobilizadores seguirão iguais, com sua repressão e piadas de mau gosto? Para manobrar um sistema chinês sem estar na China e na pobreza não se fecharão os espaços de discussão?

A chave para a situação está nas mãos dos trabalhadores cubanos, até hoje convidados decorativos e objetos das opções que lhes jogam de cima. A falta de incentivos socialistas, de ideais e perspectivas revolucionários causam, assim, decepção, desmoralização e conduzem à busca de saídas individuais ao invés da busca de soluções coletivas. O pragmatismo de cima deve ser contra-atacado por uma discussão sobre os princípios e história do processo revolucionário cubano.

Os cheques em branco sempre levam à bancarrota...

Guillermo Almeyra é professor de Relações Sociais da UNAM (Universidade Autônoma do México) e membro do conselho editorial da revista Sin Permiso.  

Publicado originalmente em La Jornada.

Tradução: Gabriel Brito, jornalista do Correio da Cidadania.

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