A dívida do Egito deve cair junto com o regime de Mubarak
As dívidas de Egito e Tunísia devem ser canceladas se o povo que está nas ruas do Cairo e de Túnis pretende tomar o controle de suas economias e responsabilizar os países do Ocidente.
Por Nick Dearden
[18 de fevereiro de 2011 - 12h56]
Seguindo à risca a tradição dos ditadores, Hosni Mubarak pilhou a economia do Egito, deixando a presidência com um montante de 70 bilhões de dólares na conta bancária de sua família enquanto que para o povo Egípcio o legado do ex-presidente se resume a uma dívida de 30 bilhões. Zine el Abidine Ben Ali deixou 15 bilhões de dólares para o povo da Tunísia, levando modestos 3 bilhões para si. Quanto mais regimes caírem, mais estas injustiças se multiplicarão.
Os verdadeiros credores de Egito, Tunísia e outros lugares não são os Estados Ocidentais que usaram dos empréstimos para sustentar seus capangas por todo o mundo Árabe – mas são, na verdade, o povo destes países que sofreram sob os regimes. O Ocidente deve agora reembolsar estas dívidas, através da abertura de seus empréstimos para avaliação pública, do retorno dos bens de Mubarak e seus comparsas que foram estocados em bancos na Europa e nos EUA, e através do cancelamento destas dívidas injustas que se espalham pelo mundo Árabe. O povo egípcio não deve continuar a pagar a conta pela cumplicidade Ocidental através de grandes ressarcimentos das dívidas.
É muito fácil para líderes americanos e britânicos publicarem palavras calorosas aos povos destes estados policiais que suportaram corrupção, tortura e violações de direitos humanos durante décadas. De fato, Tony Blair tem sido o maior apreciador da situação. Enquanto a maioria dos líderes ocidentais derrubou Mubarak tão rápido que é até de se perguntar como seu regime desesperadamente impopular se agarrou ao poder durante tanto tempo, o ex-primeiro ministro da Grã-Bretanha se referiu àquele que um dia foi seu aliado como “imensamente corajoso e uma força para o bem”.
Para os EUA e a Europa, Mubarak era de fato um excelente cliente. O Egito sempre pagou por seus empréstimos, muitos dos quais foram indiscutivelmente feitos sob os interesses do regime, mais do que do povo, em uma média de três bilhões de dólares ao ano. Este dinheiro desviou aquilo que, de outra forma, poderia ter sido usado para melhorar as vidas de egípcios comuns. Desde 1981, o Egito pagou o equivalente a 80 bilhões de dólares em dívida e reembolso, ajudando a redistribuir o dinheiro dos pobres do Egito aos ricos do mundo.
Uma parte da dívida do país é, sem dúvida, militar por natureza. O Egito recebe mais apoio militar norte-americano do que qualquer outro país no mundo, à exceção de Israel – mais de um bilhão por ano desde que Mubarak subiu ao poder em 1981. O governo britânico permitiu que as empresas da Grã-Bretanha suprissem o Egito com cerca de 32 milhões de libras (37 milhões de dólares) em 2008, e 16 milhões de libras (26 milhões de dólares) em 2009. Sem dúvidas que isto se provou bastante útil quando o Egito se tornou um dos maiores centros dos EUA para a “guerra ao terror” e seu programa de seqüestros, vôos secretos, prisões ilegais e tortura.
O Egito atualmente deve por volta de 100 milhões de libras (160 milhões de dólares) ao Reino Unido. Ainda que o governo se recuse a revelar no que se baseia a dívida do Egito, sabemos que está relacionada às exportações britânicas feitas através do controverso Departamento de Garantia de Exportação de Crédito, largamente baseado em vendas que ocorreram no início do regime de Mubarak. Este obscuro departamento do governo inglês assegura os negócios britânicos que acontecem em locais “arriscados” do globo – geralmente fornecendo armamentos, espaço aéreo e dando apoio a indústrias de combustíveis fósseis.
A Tunísia se vê numa situação semelhante – sob o regime de Zine el Abidine Ben Ali, o país reembolsou por volta de 40 bilhões de dólares. Novamente, Ben Ali serviu aos interesses ocidentais enquanto oprimia seu povo que finalmente se ergueu contra seu regime em janeiro.
Quando o povo começou a tomar o controle de seus países, no passado – desde o apartheid na África do Sul até a Bolívia, da Argentina à Polônia – a dívida é usada como uma maneira chave para forçar a permanência de políticas econômicas antidemocráticas nestes países. Estas políticas vêm causando grandes dores e sofrimento aos mais pobres naquelas sociedades, e bloqueando a todo custo a extensão da democracia à esfera econômica. Se as revoluções na Tunísia e Egito genuinamente abrirem espaço para uma nova era de independência para o povo destes países e, se, como parece, a fagulha que se acendeu no norte da África se espalhar pelo mundo Árabe, o próximo passo será responsabilizar aqueles culpados por décadas de regimes cleptocráticos e brutais.
Assim como tentar recuperar o dinheiro roubado por seus antigos governantes, e isso significa questionar a legitimidade das dívidas que mantiveram estes ditadores no poder. É chegado o tempo desta gente do Norte da África quebrar suas correntes de dívidas que já ajudaram a suprimir a liberdade e o desenvolvimento de toda uma geração.
Publicado por www.jubileedebtcampaign.org.uk. Tradução de Cainã Vidor. Foto por Al Jazeera.
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