sexta-feira, 29 de junho de 2012
Israel
A ativista palestina Rana Hamadeh desafiou o exército israelense
Escrito por Soraya Misleh
Qui, 21 de Junho de 2012 15:32
Mulheres palestinas não fogem à luta
No último dia 1o de maio, a imagem de uma mulher que subiu em um tanque israelense em frente à prisão israelense de Ofer, na cidade de Ramallah, Cisjordânia, Palestina ocupada, ganhou o mundo. A jovem palestina que desafiou o exército ocupante, de nome Rana Hamadeh, durante um protesto em solidariedade aos presos políticos palestinos então em greve de fome, chama atenção para a resistência feminina histórica naquelas terras.
As mulheres palestinas nunca fugiram à luta. Pelo contrário. Já no final do século XIX, quando se instalaram os primeiros assentamentos sionistas em território palestino, elas estiveram na linha de frente dos protestos contra a colonização que viria a culminar na criação unilateral do Estado de Israel (em 15 de maio de 1948). Em 1903, período que marca o começo da segunda onda de imigração sionista – a primeira se deu a partir de 1882 –, criaram uma associação de mulheres.
Nos anos 1920, sua atuação se fortaleceu e em 1929 aconteceu o primeiro Congresso de Mulheres Árabes naquele destino, que resultou na formação de organização do gênero. Elas também tiveram papel crucial nas revoltas de 1936 a 1939 contra o mandato britânico e a entrega de terras aos sionistas, em que os palestinos foram totalmente desarmados, numa preparação para a limpeza étnica planejada que foi levada a cabo em 1948. Nesse ano que marca a nakba (catástrofe), uma brigada feminina, batizada de Zahrat (pequenas flores), colocou-se, como durante toda a luta, na linha de frente contra a expropriação do seu território.
Já diante da consolidação do projeto sionista, em 1965, foi criada a União Geral das Mulheres Palestinas, atrelada à OLP (Organização para a Libertação da Palestina). No início seu papel ainda era, contudo, limitado, reservado à assistência social e aos cuidados com a saúde. Mas a política não foi deixada de lado.
Ações diretas
Ao final dos anos 60 e início dos 70, diversas delas partiram para a ação direta, diante da omissão internacional à violação cotidiana de direitos humanos e da expansão israelense, que em 1967 resultará na ocupação por parte dessa potência bélica de toda a Palestina histórica. A mais conhecida em todo o mundo é Leila Khaled, da Frente Popular pela Libertação da Palestina. Expulsa de Haifa aos quatro anos, tornou-se refugiada e aos 15 começou a se envolver com a luta armada. Então com apenas 24 anos, participou do sequestro de aviões em troca de prisioneiros políticos e colocou em evidência a causa palestina. Foi detida em uma das ações e saiu após outra operação do gênero. A escritora e ativista egípcia Nawal El Saadawi, em seu livro A face oculta de Eva – As mulheres do mundo árabe, cita outros nomes, como o de Amina Dahbour, de Fatma Barnaw e de Sadis Abou Ghazala. “A extensa lista de mártires serviria para encher as páginas de todo um capítulo”, frisa. E conclui: Seus “feitos intrépidos um dia serão admirados pelas futuras gerações de jovens e mulheres”. Nesse período, conquistaram mais espaço na política, fortalecendo sua luta contra o apartheid israelense e o sexismo.
Nas intifadas (levantes) de 1987 e 2002, novamente as mulheres foram às ruas. Na primeira delas, as que viviam nas áreas rurais assumiram papel central, mas as que residiam na região urbana também marcaram presença. Para se ter uma ideia, um terço das baixas era da parcela feminina. Se
gundo escreveu o historiador israelense Ilan Pappe em História da Palestina moderna, a luta era dupla, contra os padrões da sociedade patriarcal e a ocupação. O número de mulheres detidas passou de centenas no início da década de 70 para milhares nos anos 80. Após a última troca de prisioneiros, em 2011, restam ainda nove nos cárceres israelenses, as quais têm se somado aos protestos constantes contra as más condições a que são submetidas, assim como todos os palestinos detidos ilegalmente pelas forças de ocupação.
Ao longo de toda essa trajetória, as mulheres se destacaram também em outras trincheiras de luta, como no campo das palavras. No âmbito cultural, entre as que merecem ser lembradas encontra-se Fadwa Touqan, que nasceu em 1917 na cidade de Nablus, na Cisjordânia, e faleceu em 2003. Nas palavras de Moshe Dayan, chefe do exército israelense quando da chamada Guerra dos Seis Dias, em 1967, seus versos eram mais subversivos que dez atentados.
As mulheres são as que mais sofrem em situações de emergência humanitária ou conflitos armados ou, portanto, frente à ocupação de territórios palestinos. É o que aponta relatório divulgado pela ONU (Organização das Nações Unidas) em 2010.
Os dados são alarmantes: durante a última ofensiva à Gaza, ao final de 2008 e início de 2009, 114 foram assassinadas; 40% não puderam fazer o pré ou pós-natal; e quatro foram mortas em função do bloqueio naqueles anos, por terem sido proibidas de circular para obter tratamentos especializados, medicamentos ou serviços de saúde adequados.
Na Cisjordânia, a situação é igualmente grave. Dados de 2007 indicam que cerca de 70 mulheres deram à luz em checkpoints, impedidas de passar para ter seus filhos com dignidade nas maternidades, sendo que seis delas sofreram violência, apesar de em trabalho de parto. Trinta e cinco bebês morreram e cinco mães.
Mas não se intimidam. Representando quase metade da população total de 3,9 milhões nos territórios palestinos ocupados em 1967 (1,8 milhão), estão reunidas em diversas organizações, por educação, saúde, trabalho, contra a ocupação e o sexismo. Ali, assim como nos campos de refugiados, em que são milhares, na diáspora ou onde hoje é Israel, sempre se fizeram e fazem ouvir e notar, desafiando o projeto sionista.
Em recente visita à Palestina, a constatação de que a voz feminina é decisiva: “Antes saíamos de nossa terra, porque achávamos que voltaríamos em breve. Hoje podem destruir nossas casas, roubar nossas oliveiras, nos agredir, não vamos embora. Nem que tivermos que morar numa tenda, aqui é nossa terra.” Sentimento que expressou tão bem Fadwa Tuqan, no poema cujo título em português seria “Basta-me permanecer em seu seio”*:
Basta-me morrer em meu país
aí ser enterrada
dissolver-me e aí reduzir-me a nada
ressuscitar erva em sua terra
ressuscitar flor
que uma criança crescida em meu país arrancará
basta-me estar no seio de minha pátria.
terra
........erva
.....................flor
* Em http://www.guata.com.br/poesiasempre/081126PS_poesia_palestina_de_combate.html, cujos poemas foram extraídos do livro "Poesia Palestina de Combate", publicado em 1981, pela Editora Achiamé, no Rio de Janeiro. Tradução de Jaime Cardoso e José Carlos Gondim.
Fonte: Al Thawra, junho, 2012.
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