sábado, 28 de dezembro de 2013

'HOUSE'

"HOUSE" Algumas palavrinhas sobre esta série americana. Pelo universo abarcado, aparentemente foi criada por um medico (ou elenco deles) culto, muitimídia em medicina pos são abordados desde ítens de urgência, até epidemiologia, passando por medicina tropical e um pouco de psicologia. O Dr. House (nome ou sobrenome?) surge com uma aura de misantropo, 'autosuficente', insurgindo-se contra as normas, a educação. Mas um médico misantropo (misantropo: aquele q n acredita nas pessoas ou instituições)? N seria uma contradição em termos? Sempre com uma bengalinha, mancando, ingere invarialmente várias x um analgésico, a base de opiáceos, o q, confessa, o tornou viciado. Ouvia falar da série, agora a conheço. O nosso personagem lança uma bateria de comentários médicos, ao tempo em q insinua o decote de uma estudante de medicina q viera entrevistá-lo ou as lições de uma velhinha de seus 82 anos, fogosa ao saber q estava com sífilis, uma DST adquirida na adolescência e permanecendo incubada. Ao final, concorda com a paciente, q devolve a receita de seu tratamento: melhor continuar com sua inesperada e desejada fogocidade. Os capítulos nos remetem a uma constatação: um médico misantropo n é factível! Sem amigos, mal educado com seus pacientes, House é o anti-médico. Mesmo numa sociedade capitalista, com sua tecnologia de 1o. Mundo, onde uma tomografia é pedida de rotina, a empatia, a conversa com as pessoas é imprescindível. No socialismo, nem pensar... Mesmo com todas essas restrições, é agradável assistir um personagem n-factível nas telas.

DDD - Diário de um Deus em eterna Depressão (apedidos)

Meu DDD - Diário de um Deus em eterna Depressão (trechos - a pedidos) Posted: 08 May 2011 07:35 PM PDT “Ontem sonhei com ‘ela’. No sonho ‘ela’, peralta como sempre fingia-se triste, suas unhas, finas e delicadas, enfiadas num lenço branco amassado. Dentro do lenço algumas ilusões da véspera. Chegou-se ao ‘nosso’ bosque sombrio e atirou-se a escuridão, braços abertos como um nadador. Mas aquela era uma escuridão rasa e precária – como nós dois, correto – e ‘ela’ apenas afundou na lama, no poço, no lodo escuro de minha existência. E aquele imenso e exuberante bosque, alto como a cúpula de uma catedral, repleto de estranho movimento e agitação – como num frenesi – pois o bosque exibia uma luz baça e tímida, hesitante, plena de angústia e ansiedade, a minha angústia, não a sua alegria, pois era um bosque do meu mundo, não do seu universo. Alguém, displicente, espalha inadvertidamente sobre todo o bosque pétalas úmidas de um choro falso e precoce, pois eu ainda não havia chorado. Aliás, Deus não chora nem soluça (as vezes eu suspiro, mas aí sei disfarçar). ‘Ela’, agachada, cabeça encoberta, encolhida a um canto do bosque, aparentemente triste, finge soluçar. Eu me aproximo, altivo e soberbo, e toco-a com o indicador direito, como a conforta-la. (Na realidade, diga-se, gostaria de beija-la e acaricia-la, tê-la em meus braços naquele instante, mas algo me retém o gesto, alguma coisa segura os meus desejos e ânsias) Você é infeliz?, alguém lhe pergunta, em sussurro íntimo. Sou, porquê? Observo a distância o estranho diálogo (pois eu sei de suas mentiras e logros, ‘ela’, curiosamente, pode e quer ser feliz, ela consegue ser feliz; daí pergunto-me o motivo daquela farsa, daquele embuste), no entanto mantenho um discreto e talvez porisso mesmo, incompreensível ‘ciúme’ e ‘zanga’. (No bosque, em um certo momento inesperado, surge uma gigantesca teia de aranha, com um pequenina e graciosa mosca aprisionada. A mosca, desesperada e impotente, debate-se, tentando em vão desvencilhar-se. Solidário com a sua impotência, chego receoso a esboçar a inevitável pergunta ‘Devo liberta-la? Devo deixar que a devorem?’. ‘Ela’, fêmea e receptiva, sempre aberta as incursões em seu ‘território’, disfarça uma ilusória dúvida e apenas sorri, travessa e desdenhosamente. Penso em recrimina-la – com uma dureza artificial – mas a menina já se afasta, a brincar com uma faca que de fato era-uma-faca. E eu, penso, inquieto, que nem sou um-Deus-que-sabe-ser-Deus?) Todos os meus navios são rosados, ‘ela’ me diz, referindo-se talvez a sua longa e comprida saia azul. E acrescenta em tom de inquirição ‘Os seus navios têm cor?’. Você fuma?, pergunto, reticente (eu queria a todo custo disfarçar a minha terrível dor no peito, a minha opressão e inação). Daí olho para a sua saia, de um verde inusitado, imaginando-a sem. É linda, penso ternamente. Suas pernas, seios, sua pequena cintura, tudo esfuma-se em uma só imagem de mulher desnuda. Doce e lindamente desnuda. Se eu morresse aqui onde você me enterraria?, ‘ela’ indaga, com uma tristeza que não lhe é peculiar. Você jamais morreria num bosque, digo-lhe. E acrescento, irônico, ‘Além do mais, você está com o seu Deus!’ ‘Ela’ sorri, bela e terna, e me beija a face (tinha os olhinhos fechados). E sussurra-me comunicando que quase todos os seus navios afundaram. Resta-lhe apenas a mim, apenas um Deus navegante, não naufragável (‘ela’, felizmente, ainda não me conhece). Num momento, no sonho, ‘Ele’ surge, inesperado, ameaçando toma-‘la’. Tira-‘la’ de mim!! Estremeço, amedrontado. ‘Ele’ aproxima-se, arrastando lentamente seus pés, pés gigantescos, como patas de elefante. Mas, engraçado, olha-me, terno e apaixonadamente, imaginando-me aventuras e loucuras, ‘todo um mundo de prazer e luxúrias’, parece querer insinuar. ‘Ele’ olha-me, insistente. É um olhar lúbrico e insinuoso. Tento imaginar algo rijo, um obstáculo qualquer, poderoso o suficiente para contrapor-se ao seu olhar, mas em vão. Ambos somos deuses, ambos onipotentes. Que fazer, como diria o revolucionário? No entanto não devo chorar. Eu também sou Deus! ‘Ela’ desaparece, como por encanto. Estávamos ali, agora, apenas nós dois: ‘Ele’ e eu, dois deuses, um conquistador, outro, tentando evitar a conquista (mas quem seria o objeto da conquista, ‘ela’ ou eu?). Mas esqueço o desenrolar... Mais adiante, no sonho, lembro, ‘ela’, deslumbrante e maravilhosa, ajuda-me a desvendar os meus ‘desfiladeiros’, meus ‘transes’ e ‘inseguranças’. Fala-me com uma meiguice/rude tão sua ‘O segredo, meu caro Deus, reside em ignorar os mistérios das coisas. Em (a)trair e evocar os nossos transes. Em resumo, meu Deus: bastaria preencher de tempo os nossos ocos. E nunca me deixe a margem de seu tempo, suplico-lhe’, finaliza, com um suspeito e repentino brilho nos olhos. Passa-se mais tempo de onirismo... ...pois é, durante todo o sonho eu fingia dores que não tinha, amores e sentimentos que jamais existiram e exagerava muitas ilusões do dia seguinte... Meu Deus, ela me diz, eu sempre tento ver a nossa vida apenas através dos teus olhos, mas infelizmente eu tento, tento e nunca consigo ver a sua imagem. Tento mil e uma vezes mas tudo se torna opaco e, curioso, dentro dos teus olhos, torno-me cega...Será, meu Deus, que o nosso amor seria inexeqüível? No entanto, quando fumo os meus cigarros, eu te vejo na fumaça subindo, ao beber um chope, é você que aparece na espuma, ao chorar, as vezes, você se esconde nas gotinhas de minha lágrima, Deus, isto é amor!! Odeio andar por aí misturando coisas, proclama, quase rindo de seus chinelos (pois estava a observar o chão, a observar os seus pés) e em seguida diz-me ‘Desejo tudo, todas as coisas, mas aos poucos, sem pressa...’, ‘Deus, eu te amo!!!’, grita, quase histérica.” “De onde eu venho, afinal? Qual a minha origem, o meu ponto de partida? Pois ao criar-me, criei-me certamente de algo, de alguma coisa primordial e básica. Em que tempo então eu existiria, ao criar-me? O meu tempo ou o dos que me antecederam? O meu espaço, a minha dimensão ou... Enfim, de que baú ou arca antiga retirei a substância para a minha criação?” “...todos dizem ‘ela’ me quer. Será?...” “Nietzsche só acreditaria num Deus que soubesse dançar. Mas eu também sei dançar! E eu não creio em mim! (como também não creio em Nietzsche)” “Ele retornou. Estivera ‘por aí’, diz, resmungando (está de mau humor). Sempre elegante, com sua bengalinha, o lenço no bolso. Não tocou em ‘nosso’ assunto, nada insinuou sobre ‘nós’, nosso ‘caso’ (nosso caso???). Perguntou-me, misterioso, sobre ‘ela’. (quais suas intenções?), onde ‘ela’ estará, o que faz, onde vive. Envelheceu, reparo. Apresenta rugas e cabelos brancos (pintura?). Está mais sério, mais sisudo, aparenta mais responsabilidade (ilusória?). Indagou-me, quase insinuando, tatibitate, se eu realmente gosto d’ela’. Disse-lhe a verdade. A minha verdade (pois eu, (in)felizmente a amo). Despachei-o, alegando ‘compromissos inadiáveis’. Que triângulo: dois deuses e uma mulher! Que loucura!!” “Foi no carnaval, ‘ela’ me disse ‘tire a máscara. Quero te ver, tocar em seu rosto, mexer em seus cabelos, quero me ver nos seus olhos, beber seu suor, chupar sua alegria’. - Assim termina o encanto e você não me emprestaria o rosto que gostaria que eu tivesse. Além do mais nunca seria um rosto de alegria. Daí ‘ela’ chorou no terceiro dia de carnaval (...logo depois veio o tempo que assanhou o seu cabelo e depois nos roubou uma paz que nós não tínhamos).” “Chamou-me a um canto, misteriosa: - Tenho uma filha - Dizem que eu também tenho um filho, brinquei - Sério Pensei. Olhei-a de viés. Vinte aninhos, se tanto. Corpo de menina. - Mora com a tia... Olhou-me como a pedir, a implorar ajuda. Disfarcei o meu sem jeito e fui cuidar de minhas ‘coisas’ (amanhã eu penso n’ela’ e em sua filha. Aliás, pode um Deus adotar garotas?)”. “...pois é, é uma interessante (e um pouco desagradável) sensação de ‘déjà vu’, algo como se eu em algum (longínquo?) passado, eu já houvesse me encontrado e conhecido, entabulado intermináveis papos comigo mesmo e, no final, brigado irremediavelmente comigo. Despeço-me enato com um gostinho amargo na boca, mescla de fel e uma estranha (e deliciosa) lembrança de rapadura. Despeço-me tristemente, com um discurso severo e áspero, decidido a nunca mais ver-me. Pois é, é um fato, nunca gostei-me, nunca simpatizei comigo mesmo (sempre tive minhas ressalvas e discretas restrições. Embora, diga-se, conservo algumas poucas e agradáveis experiências e ‘aventuras’ no convívio e conluio com a natureza, o ‘mato’, o ‘selvagem’, o ‘belo’, o ‘inóspito’ e...comigo). discordava-me discretamente de minha existência, é um fato. Convenci-me um dia de que eu não poderia ser factível, eu não poderia – melhor: eu não deveria – existir ou sequer cogitar, imaginar (sonhar) essa possibilidade. Descarto-me, portanto. Na realidade falta-me algo, alguma coisa, talvez apenas um detalhe, uma pequena – ou grande? – minúcia para completar-me, tornar-me factível e palatável a mim mesmo. Não, eu não busco, como talvez aparente, a simples e frugal perfeição, o topo do mundo: eu sou humilde e ínfimo – eu, (in)felizmente, sei – eu quero ir apenas um pouco alem do infinito, talvez uns 2 metros e meio. Daí eu paro – devo parar, é a regra - e olho-me e decido. O quê? Não sei, realmente não sei.” “Quer ir embora, perguntei. Não sei. Você acha melhor eu ir? Talvez fosse bom. ‘ela’ nesse instante, com o olhar turvo, não resistiu: uma única e furtiva lagrima. Mas tentou resistir: Tem a mala. Eu levo. Nesse caso, prefiro ir logo. Começou a arrumar ‘suas coisas’, blusas, cosméticos, peças íntimas. ‘Nossas’ cartinhas (ela queria ‘recordar’). Eu te levo até a porta, disse. Lá você me arranja uma condução? Claro. Nossa despedida há um mês. Parecem milênios. Será que ‘ela’ volta um dia?” “’Ela’ se foi. Como o poeta cantou um dia, eu também estou sentado num café e choro.” (Meu DDD - Diário de um Deus em eterna Depressão - excertos)

Espionagem

A saga Snowden anuncia mudança radical no capitalismo [*] Evgeny Morozov, Financial Times “The Snowden saga heralds a radical shifts in capitalism” Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu Depois das revelações, esse ano, sobre os excessos de Washington na espionagem, Edward Snowden enfrenta agora onda crescente de “fadiga da novidade” da vigilância, entre o grande público – e, isso, porque o empregado terceirizado da Agência de Segurança Nacional que se autoconverteu em “apitador-alertador” revelou quantidade imensíssima de verdades desconfortáveis sobre como funciona o mundo nos nossos dias. Ads by Webexp EnhancedAd Options Infraestrutura técnica e poder geopolítico; consumismo rampante e vigilância absoluta, total; a retórica sublime-delirante da “liberdade da internet” e a dura realidade do controle sempre crescente sobre a internet – todas essas são vias interligadas que a maioria de nós nem perceberá ou considerará com atenção. Em vez disso, nos focamos num único elemento dessa longa cadeia – o estado que nos espiona – e ignoramos todos os demais. Mas o debate sobre a espionagem foi rapidamente circunscrito, estreitado, e convertido em debate insuportavelmente técnico; questões como a consistência da política externa dos EUA; o futuro ambivalente do capitalismo digital; a relocação do poder, de Washington e Bruxelas, para o Vale do Silício – nenhuma dessas questões recebeu a devida atenção. "Os EUA nos espionam e nos roubam" Fato é, contudo, que não só a Agência de Segurança Nacional dos EUA está quebrada: o modo como fazemos – e pelo qual pagamos – as nossas comunicações também está quebrado. E foi quebrado por razões políticas e econômicas, não só por razões “de lei” e tecnológicas: muitos estados, desesperados por dinheiro e carentes de imaginação infraestrutural, entregaram as suas redes de comunicação, rendidas, um pouco cedo demais, a empresas de tecnologia. Snowden criou uma abertura para um muito necessário debate global que poderia ter iluminado várias dessas questões. Infelizmente, esse debate nunca começou. Ads by Webexp EnhancedAd Options As revelações de que os EUA são viciados em vigilância só receberam resposta desbotada, unidimensional. Grande parte dessa retórica superaquecida – não raras vezes com tintas de antiamericanismo e canalizada para modalidades improdutivas de reformas – foi até agora inútil. Muitos governantes estrangeiros ainda se agarram à fantasia de que basta(ria) que os EUA lhes garantam um acordo de não espionagem, ou, pelo menos, a promessa de que pararão de monitorar os seus equipamentos e sistemas, para fazer sumir as perversões que Snowden revelou. Nesse ponto, os políticos estão cometendo o mesmo erro que o próprio Snowden comete: em suas raras, mas sempre consistentes manifestações públicas, Snowden sempre atribui os erros e vícios ao alcance desmesurado das agências de inteligência. Parece que, ironicamente, nem o próprio Snowden tem consciência clara do que encontrou e revelou. Complexo de Espionagem e instalações da ASN em Fort Meade, Maryland Não se trata de abuso por instâncias isoladas de poder, que se possa corrigir com novas leis, mais controle sobre os espiões, novas ferramentas que zelem pela privacidade, e com súplicas, pelo estado, às empresas de tecnologia, para que se façam “mais transparentes”. É claro que tudo isso tem de ser feito: são os frutos políticos mais acessíveis, que todos sabemos como alcançar e colher. No mínimo, essas medidas criarão a impressão de que algo está sendo feito. Mas de que servirão essas medidas, para conter a tendência muitíssimo mais perturbadora, que já mostra que informações pessoais sobre nós mesmos – muito mais que o dinheiro – estão já convertidas em “moeda” que paga por serviços e em breve, talvez, também, pelos bens indispensáveis à vida diária? Ads by Webexp EnhancedAd Options Não há lei nem ferramenta que proteja os cidadãos que, inspirados pelos contos de fadas do empoderamento do Vale do Silício, correm a converter-se em empresários “de dados”, sempre à procura do meio mais novo, mais rápido, mais lucrativo para monetarizar os próprios dados – seja informação sobre os próprios hábitos de compra, ou cópias do próprio genoma. Esses cidadãos querem ferramentas que os capacitem para abrir cada vez mais os próprios dados, não para escondê-los. Agora, quando cada dado ou fragmento de dado, por trivial que seja, também é capital disfarçado, só falta encontrar o comprador certo. Ou é o comprador que encontra o dado certo – e o respectivo proprietário – e oferece-se para criar um serviço convenientemente pago, a ser pago com aqueles dados. Esse, aliás, parece ser o modelo Google combinado ao g-mail, o serviço de correio eletrônico da mesma empresa. Edward Snowden O que Snowden parece não ver – nem ele nem seus detratores e apoiadores – é que é possível que estejamos passando por uma transformação no modo como o capitalismo opera: dados pessoais aparecem aí como um regime alternativo de pagamento. Os benefícios para o consumidor já são óbvios; os custos potenciais para os cidadãos, esses, absolutamente não são claros. Ao mesmo tempo em que proliferam os mercados de compra e venda de informações pessoais, também proliferam as externalidades. E a democracia é a principal vítima. Ads by Webexp EnhancedAd Options Nada sugere que a transição em curso, de dinheiro para dados, venha a enfraquecer o poder & mando da Agência de Segurança Nacional dos EUA. Ao contrário! É possível que se criem intermediários mais fortes e em maior número, todos unidos para manter e ampliar o mesmo vício, a mesma obsessão por mais e mais dados. Por isso, se quiser escapar da obscuridade do gueto legalista do debate sobre a privacidade; e para que continue relevante e ganhe pegada (e dentes) políticos, é indispensável que o debate sobre vigilância seja linkado ao debate sobre o capitalismo. O CUSTO da espionagem e da NSA é ESCONDIDO do povo dos EUA Há outras dimensões nisso tudo, também esquecidas ou subestimadas, e também cruciais. Não teríamos, nós, de criticar muito mais os argumentos trazidos à baila pela Agência de Segurança Nacional e outras agências, segundo os quais precisa(ria)m daqueles dados que coletam, para agir preventivamente sobre os problemas? Não devemos deixar passar sem criticar a ideia de que a prevenção (só porque parece ser hoje a ideia mais barata), substitui(ria) completamente todas as tentativas mais sistemáticas para identificar as origens do problema que temos de resolver, muito mais do que apenas impedir que aconteça hoje. Ads by Webexp EnhancedAd Options Só porque as agências de inteligência dos EUA tanto se empenham para um dia ter mapeadas todas as crianças do Iêmen, porque entendem que elas manifestem tendência inata para explodir aviões, não implica que os EUA estejamos dando a devida atenção à fonte da insatisfação infantil iemenita: uma das quais pode ser o uso alucinado de drones para matar os pais e mães daquelas crianças. Infelizmente, essas questões não estão na agenda atual, em parte porque muitos de nós compramos a narrativa simplória – conveniente para Washington e para o Vale do Silício – de que só nos faltam mais leis, mais ferramentas, mais ‘transparência’. O que Snowden revelou ao mundo é a nova tensão nos pilares que dão/davam sustentação ao capitalismo e a vida democrática como os conhecemos. Para resolver os novos problemas é preciso um pouco mais de imaginação. __________________ [*] Evgeny Morozov nasceu em 1984 na Soligorsk, Bielorrússia. Frequentou a American University na Bulgária e mais tarde viveu em Berlim antes de se mudar para os Estados Unidos onde foi aluno-visitante na Stanford University. Atualmente é associado da New America Foundation e editor colaborador-blogueiro (blog New Effect) da revista Foreign Policy. Colabora com o noticiário do Yahoo!; é professor visitante na Georgetown University’s Walsh School of Foreign Service; associado do Open Society Institute; diretor de novas mídias da ONG Transitions Online e colunista do jornal russo Akzia. Artigos de Morozov têm sido publicados em vários jornais e revistas em todo o mundo, incluindo The New York Times, The Wall Street Journal, Financial Times, The Economist, The Guardian, New Scientist, The New Republic, Corriere Della Sera, Times Literary Supplement, Newsweek International, International Herald Tribune, Boston Review, Slate e San Francisco Chronicle. Neste ano de 2013 está obtendo o título de Ph.D. em História da Ciência em Harvard. (Redecastor)

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Máfia


O afago da Mão Invisível
A máfia não é apenas a má consciência do liberalismo. A máfia é o próprio liberalismo. E Vito Corleone é o efetivo self made man.


Quem não se diria um liberal diante da escravidão? Quem não defenderia a causa do capitalismo e da possível ascensão social em face dos estamentos feudais e aristocráticos que transformavam o nascimento em destino? Ética do trabalho, livre concorrência, meritocracia: que valores nos poderiam parecer mais universais?



Meados do século XIX. Navios negreiros cruzam o Atlântico rumo ao Brasil. God save the Queen, Deus salve a Rainha: a Inglaterra, a polícia dos mares, ministra aulas práticas de trabalho assalariado ao estancar o fornecimento de escravos. Ganharás o pão com o suor do teu rosto.



O império ao longo de cujo horizonte o sol jamais se põe: eis a forma pela qual o império colonial inglês se autoemulava. Do Extremo Oriente à América, o sol jamais conseguia se esconder das possessões da Rainha Vitória.



O monopólio não é apenas a má consciência do liberalismo. O cartel pressupõe a livre concorrência: “venha trabalhar conosco!”



Estados Unidos da América, pátria das oportunidades, berço do liberalismo militante e anticolonial. Berço do self made man, o homem que se faz por si mesmo, o empreendedor. A formiga trabalhadora em face da cigarra monárquica. O sonho americano apregoa que o liberalismo se confunde com o próprio ímpeto de felicidade do homem.



O monopólio não é apenas a má consciência do liberalismo. O cartel pressupõe a livre iniciativa: “venha trabalhar para nós!”



Michael Corleone, o mafioso imortalizado por Al Pacino em O Poderoso Chefão (1972), direção de Francis Ford Coppola, é o maior leitor de Sir Adam Smith (1723-1790) e Jean de La Fontaine (1621-1695).



Enquanto o autor de A Riqueza das Nações concebe belas analogias newtonianas para dizer que as relações de mercado, como em um campo gravitacional, são regidas pela batuta da Mão Invisível em busca do equilíbrio, o carrasco beija a mão do Padrinho antes de ir ao mercado. Na era da livre iniciativa, a democracia transforma o coletor de impostos do rei em mais um assalariado.



A máfia não é apenas a má consciência do liberalismo. A máfia amputa a Mão Invisível.



Enquanto o criador da fábula da cigarra e da formiga narra que os primórdios do capitalismo transformam a castração do trabalho em segunda natureza dos homens ao condenar a cigarra aristocrática à morte invernal diante da formiga empreendedora que se mutila para sobreviver, Michael Corleone entende que o formigueiro precisa de um cão de guarda.



A máfia não é apenas a má consciência do liberalismo. A máfia é o próprio liberalismo sempre que as abstrações da livre concorrência precisam percorrer o corredor polonês da História. Sempre.



Não é à toa que Coppola dá início à trilogia d’O Poderoso Chefão com a passagem de poder de Marlon Brando a Al Pacino. Vito Corleone, o Pai, é o efetivo self made man. Michael, o Herdeiro, representa as multinacionais, a máfia como metástase, a aniquilação dos rivais.



Consta que a Royal Air Force, a Força Aérea da Rainha, levou à Alemanha de Hitler as noites brancas. As blockbusters, também conhecidas como arrasa quarteirões, eram bombas incendiárias que escarneciam da luz da lua. Michael Corleone nos ensina que o liberalismo inglês jamais se esqueceu de Nero. Cinéfilo inveterado, publicitário diletante e exímio filósofo da história, Michael Corleone considera que Blockbuster daria um ótimo slogan para sua franchising. Ele só não sabe, ainda, em que ramo atuar. A dúvida do Padrinho não decorre de insegurança. Afinal, que ramo do mercado não acolheria a blockbuster?




Blockbuster, a luva da Mão Invisível.



Quando Michael Corleone está no auge do poder, ele entende que é chegada a hora de misturar água e óleo: seus negócios precisam se tornar legítimos, sua trajetória empresarial precisa ser estudada em cursos de MBA. Ocorre que Joey Zaza, um empresário da nova generação, um mafioso pós-liberalismo, está incomodado com o monopólio corleônico. Ele não aceita que Michael Corleone se exima da máfia para passar a ser capa de revista. Ele quer a livre concorrência, ele quer que Michael Corleone abra a Mão Invisível. Como bom aluno da Escola Histórica do Liberalismo, Joey Zaza entende que é chegado o momento de a blockbuster voltar a ensinar a arte da partilha.



O Padrinho reúne os chefes das famílias mafiosas em um hotel de luxo. O Michael Corleone não quer mais apadrinhar cassinos e bordéis. “Para que eu me torne o empresário do ano, cada um de vocês receberá a sua parte de acordo com a participação na holding Corleone”. Todos se mostram sumamente felizes, Michael está prestes a limpar o nome da família Corleone, mas Joey Zaza entende que o liberalismo precisa da sabedoria do agricultor que lança mão do incêndio como prenúncio para a plantação.




Blockbuster, terra arrasada.



Joey Zaza aproveita o encontro dos mafiosos e, após simular um desentendimento com o Padrinho, deixa a luxuosa sala de reuniões encimada por uma cúpula de cristal para que um helicóptero comece a metralhar a velha geração.



A Mão Invisível salva Michael Corleone do atentado. Todos à sua volta querem acabeça de Joey Zaza. Todos vociferam contra “o jovem canalha que não respeita a tradição!” Súbito, o Padrinho silencia o clamor que o rodeia com a quintessência do liberalismo, o 11º mandamento que (re)produz a riqueza das nações:



− Nunca odeiem o seu inimigo. Nunca. O ódio entorpece a razão. O ódio embaralhao cálculo. Amigos próximos; inimigos à distância de um abraço. It’s all about business, falemos de negócios. Eu respeito o que Joey Zaza fez. O novo aniquila o velho. É a lei da natureza. É a lei do empreendedorismo. Qual a lição mais primordial da História? (Michael Corleone pigarreia para aprumar a voz antes de gravar a lápide da livre iniciativa.) Em verdade, em verdade vos digo: se a História tem algo a nos ensinar, caríssimos, é que qualquer um pode ser morto. Ninguém é intocável. Eis o afago da Mão Invisível.



Flávio Ricardo Vassoler é escritor e professor universitário. Mestre e doutorando em Teoria Literária e Literatura Comparada pela FFLCH-USP, é autor de O Evangelho segundo Talião (Editora nVersos) e organizador de Dostoiévski e Bergman: o niilismo da modernidade (Editora Intermeios). Todas as segundas-feiras, às 19h, apresenta, ao vivo, o Espaço Heráclito, um programa de debates políticos, sociais, artísticos e filosóficos com o espírito da contradição entre as mais variadas teses e antíteses – para assistir ao programa, basta acessar a página da TV Geração Z: www.tvgeracaoz.com.br. Periodicamente, atualiza o Portal Heráclito, www.portalheraclito.com.br, e o Subsolo das Memórias, www.subsolodasmemorias.blogspot.com, páginas em que posta fragmentos de seus textos literários e fotonarrativas de suas viagens pelo mundo.
(Carta Maior)

Steve Biko

Steve Biko, o outro herói da luta contra o apartheid

Segundo Nelson Mandela, ele havia sido o "primeiro prego no caixão do apartheid". Steve Biko, que morreu como mártir no dia 12 de setembro de 1977 nas mãos da polícia do regime racista de Pretória, repousa no pequeno cemitério de sua cidade natal, King William's Town, na província de Cabo Oriental.



A reportagem é de Jean-Philippe Rémy, publicado no jornal Le Monde e reproduzido pelo portal UOL, 14-12-2013.

Foram necessários 20 anos até que, no aniversário de sua morte, para o qual mais de 20 mil pessoas se reuniram, fosse erguido um muro em torno do cemitério para impedir que as vacas da região fossem pastar a grama sobre os túmulos. Também foi lançada a ideia de se erguer um mausoléu, mas a família recusou, por considerar que Steve Biko não gostaria que o tirassem do grupo de camaradas enterrados como ele em seus modestos pedaços de terra.

Stephen Bantu Biko, conhecido como Steve Biko, belo rapaz de imensa personalidade e ideias lampejantes, é o outro grande ícone dos anos de luta da África do Sul (um país onde eles não faltam). Como se deve, ele morreu puro e cedo demais. Em sua modesta lápide nesse "jardim das lembranças" inaugurado por Mandela em 1997 figuram um punho erguido e as seguintes palavras: "One Azania, one nation" ("Azania", termo da Antiguidade para designar uma parte da África, é utilizado como sinônimo de África do Sul nos movimentos inspirados pelo Black Consciousness).

As ideias de Steve Biko nunca deixaram de circular na África do Sul, sendo agora passadas por uma fundação que trabalha em diversos setores, indo do apoio à leitura na township até a organização de diálogos entre grupos, cores, religiões e todo tipo de entidade pelo mundo inteiro, mas também conduzindo uma reflexão aprofundada sobre questões ligadas ao destino dos africanos por todo o planeta.

Um prédio novinho em folha foi erguido para abrigar essas atividades, a algumas centenas de metros de sua casa, onde ainda se encontra a bela escrivaninha com seu apoio de couro, onde Steve Biko trabalhou em alguns de seus escritos. Em King William's Town, no primeiro andar da fundação que leva seu nome, visitantes percorrem um museu que retraça a vida do mártir, enquanto adolescentes da região ensaiam em xhosa um espetáculo sobre o casamento e seus contratempos. Suas clínicas ainda existem e funcionam, assim como sua creche.

"Sempre se pensa em sua luta política, mas ele era também um homem que se interessava por artes, educação e desenvolvimento econômico", lembra Obenewa Amponsah, da fundação.

Steve Biko nasceu no dia 18 de dezembro de 1946 e viveu parte de sua vida em Ginsberg, a township de King William's Town, que deve seu nome ao dono da fábrica de velas instalada no local no início do século 20. Ginsberg não gostava que seus empregados fossem muito longe quando eles não estavam na fábrica. Ele conseguira com que a administração municipal mandasse construir as primeiras casas desse bairro que, ao longo dos anos, se tornou um foco de protestos.

Foi em uma dessas casinhas que Steve Biko cresceu, depois de ter perdido seu pai prematuramente, ao lado de sua mãe Alice, que trabalhava como cozinheira no hospital vizinho, criando seus filhos de cabeça erguida apesar das adversidades. Uma modéstia que jamais enfraqueceu, mais um exemplo desses heróis anônimos produzidos pela África do Sul, esse país impossível onde o horror e o sublime se misturam sem avisar.

Crítico dos progressistas brancos mais adeptos do protesto prudente do que do de risco, que teriam deixado o apartheid sobreviver se tivessem lhes confiado as chaves da luta, Steve Biko iria ao mesmo tempo forjar um pensamento, investir em sua comunidade e inspirar uma grande parte da juventude negra do país.

A insurreição de Soweto, em 1976, quando o movimento anti-apartheid parecia estagnar, esteve na base de um movimento de jovens colegiais que se ergueram contra a educação sucateada em afrikaans, mas também fortemente influenciados pelas ideias do Black Consciousness. As townships se exaltaram e o CNA (Congresso Nacional Africano) retomou o controle do movimento. Dezenove organizações foram banidas (além das que já o eram, como o CNA), e Steve Biko foi condenado à prisão domiciliar em Ginsberg.

No dia 18 de agosto de 1977, ele foi detido em um bloqueio policial perto de King William's Town, enquanto circulava em um veículo. A prisão domiciliar incluía a proibição de se encontrar dentro de um recinto com mais de uma pessoa por vez, quanto mais viajar pelo país. Steve Biko foi transferido para Port Elizabeth, onde veio a sofrer toda a violência das forças policiais.

Talvez os serviços de inteligência tenham sido informados da preparação de uma viagem secreta que ele faria (com aterrissagem clandestina de avião) para a vizinha Botswana, com o intuito de se encontrar com o líder do CNA exilado, Oliver Tambo, e estudar as possibilidades de colaboração entre as organizações.

De qualquer forma, depois de ter sido espancado selvagemente, com o rosto já desfigurado, Steve Biko foi jogado, nu e provavelmente inconsciente, na traseira de uma Land Rover e transportado a 1.200 quilômetros de lá, em Pretória, até uma outra prisão abjeta, onde sua morte foi anunciada no dia 12 de setembro.

A foto que Donald Woods, redator-chefe do jornal local, "The Daily Dispatch", tirou de seu corpo no necrotério, e publicou na primeira página com a legenda "Nós saudamos um herói da nação", rodou o mundo. Donald Woods foi obrigado a fugir da África do Sul. E Steve Biko se tornou uma das grandes figuras do movimento anti-apartheid.

E se Steve Biko estivesse vivo, será que a África do Sul seria diferente? "Se Steve Biko ainda estivesse vivo, ele estaria morto", responde Samdille Ziralala, que conduz visitas por sua pequena casa em Ginsberg. Como costuma ser na África do Sul, é um paradoxo só na aparência. "Considerando o que se tornou o CNA, que nós chamamos de "máfia", com seu enriquecimento e sua corrupção, e sabendo que Steve Biko não teria permanecido em silêncio diante disso, teriam mandado matá-lo".
(I.H.U.)

Machismo

O machismo sutil de quem nos cultua
Por
Marília Moschkovich

Na luta feminista, há muito espaço para os homens. Mas alguns deles, tão convictos e extremados, querem… indicar-nos o caminho!

Por Marília Moschkovich, na coluna Mulher Alternativa




Recebi recentemente algumas críticas, ao aproximar a cultura de estupro das ideias um tanto filóginas – a princípio – de autores conhecidos do atual jornalismo brasileiro. A filoginia pode parecer contrária ao machismo, uma vez que coloca as mulheres como objeto de admiração e amor. Se pensarmos um tiquinho, porém, é possível sacar de que maneira a filoginia pode ser absolutamente machista, e como o pensamento do machismo filógino compartilha as ideias mais básicas do que chamamos de “cultura do estupro”.

Vamos pensar por etapas, compreendendo essas definições todas. Vejam, o machismo é uma maneira de pensar que coloca os homens como detentores do poder sobre as mulheres. Até aí, imagino que não seja lá muito difícil entender, certo? Pois então; a filoginia seria um grande amor generalizado pelas mulheres. Vocês já devem ter lido textos como este, de Xico Sá, e este, de André Forastieri, que exaltam qualidades das mulheres, nos elogiam e nos colocam numa posição quase de “seres sagrados” – como são as vacas, para os hindus.

O cavalheirismo, por exemplo – o homem pagar a conta da mulher num restaurante, quando saem como casal, ou abrir a porta do carro para que ela entre, ou afastar e aproximar cadeiras à mesa, etc – é uma confusa mistura dessas duas coisas. Tanto que a atitude é sempre extremamente polêmica, quando as feministas entram na conversa. É desse aparente conflito entre machismo e filoginia que surge a polêmica: amor e admiração não seriam bons? Será que as feministas são mesmo umas mal-amadas?
topo-posts-margem

É justamente esse suposto conflito que precisamos desconstruir. A filoginia é em geral machista, mesmo que o machismo não seja sempre filógino. Eu diria que este é apenas um dos tipos de machismo que podemos identificar numa sociedade como a nossa: o machismo filógino.

Os textos linkados no segundo parágrafo são excelentes exemplos. Os machistas filóginos têm a plena convicção de que estão fazendo um bem, ao definirem publicamente o que é certo, errado, bom e ruim para as mulheres, e o que nós devemos ou não fazer. Usam seu privilégio de homens, numa sociedade estruturalmente machista, com intenções a princípio boas. Por exemplo, validar padrões estéticos diferentes dos mais aceitos (como nos textos citados). Mas reforçam o machismo, porque entendem que realmente teriam o poder de fazer essa validação. Nós mulheres, então, dependeríamos de sua aceitação para nos aceitarmos.

Além da heteronormatividade escancarada nesse tipo de pensamento, também é possível notar que – diferentemente do que qualquer feminismo possa jamais propor – o machismo filógino está baseado em conferir aos homens poder sobre as mulheres. Quando um homem qualquer defende que “as mulheres” façam, ou deixem de fazer, qualquer coisa, simplesmente porque acha que é melhor, esse homem está necessariamente sendo machista.

Isso não significa que não haja espaço para homens na luta feminista. Significa apenas que eles precisam se compreender nesta luta como coadjuvantes. Escutam, apoiam e adotam atitudes que possam conferir mais poder às mulheres com quem convivem e menos a eles mesmos. É só com uma vasta diminuição nas “chances de homens exercerem poder sobre mulheres” (como diria Foucault, para quem o poder não é um bem que se pode possuir) que ultrapassaremos, de vez, o machismo.

Por isso, caríssimos colunistas supracitados, nós feministas dizemos com clareza: guardem para si mesmos suas opiniões sobre as barrigas, bundas, magreza ou dobras de quaisquer mulheres. Vocês não estão em posição de nos dizer como nós devemos ou podemos ser, ou deixar de ser. Nem vocês, nem ninguém. A não ser que desejemos explicitamente ser machistas. Eu (por enquanto) duvido que vocês queiram.
(Outras Palavras)

Brasil


Brasil: “Espionagem dos EUA deu côs burros n’água”

“NSA ruined it!” Brazil ditches Boeing jets, grants $4.5 bln contract to Saab
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

A Suécia não terá Ibrahimovic no Brasil em 2014, mas terá o contrato de 36 Gripen JAS 39
(recorte de jornal e comentário enviados por Pepe Escobar via Facebook)
O Brasil descartou um contrato para compra de jatos F/A-18 da empresa Boeing, para comprar Gripens JAS 39 da empresa sueca Saab. A inesperada decisão de descartar a proposta dos EUA acontece na sequência do escândalo global sobre o envolvimento da Agência de Segurança Nacional dos EUA em atividades de espionagem econômica.

O anúncio da compra dos 36 jatos foi feito ontem pelo Ministro da Defesa, Celso Amorim, e pelo Comandante da Força Aérea do Brasil, Juniti Saito. Os jatos custarão US$4,5 bilhões, bem menos que o valor estimado de mercado (cerca de US$7 bilhões).

Gripen JAS 39 pronto para decolar
Saito disse que o desenvolvimento dos jatos acontecerá em conjunto com a Embraer e outras empresas não especificadas.

Os 12 jatos Mirage atualmente em uso na Força Aérea Brasileira (FAB) serão aposentados até o final desse ano. Foram comprados em 2005. Enquanto espera pelos novos aviões, a FAB usará os jatos estilo F5, viáveis até 2025.

Em visita a Brasília semana passada, o presidente da França, François Hollande, fez-se acompanhar de uma comitiva da qual fazia parte o presidente do Grupo Dassault, o que gerou especulações segundo as quais o fabricante francês teria vencido a disputa contra as empresas Saab e Boeing.

A disputa em torno de qual empresa venderia ao Brasil esses jatos começou no final da década de 1990, ainda durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, continuou durante os governos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e chegou ao governo da atual presidenta Rousseff. Mas relatório da FAB de 2010 já indicava a preferência pelos jatos da Saab sueca, embora se dissesse que o então presidente Lula preferiria os Rafale, da Dassault, mais baratos.


No início desse ano, dizia-se que a Boeing norte-americana estaria bem próxima de consumar a venda, mas a descoberta, pelo governo do Brasil, de que a Agência de Segurança Nacional dos EUA estava espionando, inclusive, as comunicações do gabinete da presidenta Dilma, levaram o governo brasileiro a descartar a possibilidade de qualquer negócio com a empresa norte-americana.

A intromissão dos espiões da Agência de Segurança Nacional dos EUA pôs fim às chances da Boeing – disse à Reuters uma fonte do governo do Brasil.

O Ministro da Defesa, Celso Amorim, disse à rede Bloomberg que a proposta da Boeing, empresa com sede em Chicago, foi rejeitada em função do melhor desempenho e melhor preço dos aviões da sueca Saab e, também, porque os suecos “aceitaram a cláusula de transferência de tecnologia”.

O fracasso da “espionagem econômica”

O Brasil atualmente examina material divulgado pelo ex-empregado (terceirizado) da Agência de Segurança Nacional dos EUA, Edward Snowden, que comprova que a agência de espiões norte-americanos monitorou comunicações pessoais da Presidenta Rousseff e invadiu as redes de comunicações de ministérios brasileiros, procurando obter informação secreta. Dentre as instituições que foram alvo da espionagem norte-americana estão a gigante brasileira de petróleo, Petrobras, e o Ministério de Minas e Energia – o que desmente o que Washington disse, que não estaria interessada em “espionagem econômica”.

Dilma Rousseff e Barack Obama cumprimentam-se em 6/9/2013 (reunião do G20)
Em setembro, em discurso à Assembleia Geral da ONU, a Presidenta Rousseff reagiu com severidade contra a espionagem dos EUA contra seu país, classificando-a como “violação da legislação internacional”. E alertou que a espionagem norte-americana, já descoberta desde junho, ameaça a liberdade de expressão e a democracia.

Snowden prometeu ajudar o Brasil a contestar o programa de espionagem dos EUA contra o Brasil

Vários senadores brasileiros têm-me pedido que colabore nas investigações de crimes contra cidadãos brasileiros – escreveu Snowden em carta aberta publicada pelo jornal [só rindo! 8-)) (NTs)] Folha de S.Paulo.


Snowden está atualmente sob asilo temporário na Rússia. O jornalista Glenn Greenwald, ex-Guardian, e que vem publicando o material de Snowden, criticou na 4a-feira a nenhuma reação dos governos da União Europeia às revelações sobre o aparato de vigilância em massa da Agência de Segurança Nacional dos EUA.

Greenwald também desmentiu declarações de Washington, de que não haveria nenhuma atividade de espionagem econômica na ação da Agência de Segurança Nacional dos EUA.

Grande parte daquela espionagem nada tem a ver nem com terrorismo nem com segurança nacional. Esse é o pretexto. Ali se trata, sempre, de manipulação diplomática e de obter vantagem econômica – disse ele.
(Redecastor)

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

'Rebelião'


Na Itália, beijar policial é vandalismo

Manifestante rebelde, simbolo de irreverência diante da polícia e da repressão aos protestos sociais, é acusada de “violência sexual”

Por Cauê Seingermartin Ameni

Protagonista de umas das melhores fotos do ano, imagem viralizada amplamente pelas redes como um simbolo pacifista dos protestos que se espalharam pelo mundo em 2013, a estudante italiana Nina De Chiffre voltou a chamar atenção esta semana. Não por questões estéticas, mas pela kafkiana situação em que se encontra. Seu ato pacifico, um beijo, virou sinônimo de vandalismo.

A estudante de 20 anos acaba de ser processada por “violência sexual”, depois de ter sido fotografada beijando o capacete do oficial da polícia Salvatore Piccione durante a manifestação mês passado em Susa, norte da Itália.

O Coisp, sindicato que representa os policiais italianos, apresentou uma denúncia aos promotores de Turim. Franco Maccari, secretário-geral do sindicato, disse ao jornal La Repubblica que a manifestante deve ser punida por violência sexual e insulto ao funcionário público. O suposto ofendido não poupou palavras: “se o policial tivesse beijado a moça, a III Guerra Mundial teria estourado. Ou se eu tivesse apalpado seu traseiro, ela teria se sentido ultrajada. Portanto, se ela fez isso com um homem de plantão, deveria ser tolerada?”

Já o soldado Salvatore Piccione, que recebeu o beijo, aparentemente gostou, a julgar pela imagem. Parece estar, ainda hoje, mais tranquilo que o burocrata interessado em processar a moça. “O importante é que, no final, a manifestação foi em frente, sem perturbação.”

Já Nina explicou, ao mesmo jornal italiano, o contexto de seu gesto rebelde. A manifestação era contra a construção de uma linha de trem de alta velocidade (TGV) entre as cidades de Turim (Itália) e Lyon (França). Os participantes do protesto defendem o transporte público ferroviário. Mas a ligação entre as duas cidades já existe. O TGV tornará a viagem apenas 15 minutos mais curta e provocará grandes danos ambientais. Na véspera, em outra manifestação, Marta — uma amiga de Nina — havia sido espancada pela polícia. Esta decidiu reagir.

“Tentei provocar um pouco, como uma prostituta teria feito numa rua. Conheço as regras das forças da ordem e agi segundo elas. Sei que os soldados não podem reagir às provocações. Não me limitei a beijá-lo, como se vê na foto? Sim, disse-lhe certas coisas, para ver se reagia, mas manteve-se impassível. Abri a viseira, e toquei seus lábios com os dedos”.

Nina não teme uma eventual condenação. “Prefiro ser processada a ver meu beijo como sinal de paz. Foi um gesto de nojo diante da polícia”.
(Outras Palavras0

Palavras Cruzadas


Opera Mundi

Palavras cruzadas completam 100 anos hoje
Em um domingo, 21 de dezembro de 1913, o jornal "New York World" publicou as "quebra-cabeças de palavras cruzadas"

Hieróglifos indecifráveis para uns, um fascinante desafio mental para outros ou apenas entretenimento, as palavras cruzadas completam 100 anos neste sábado (21/12) como um passatempo universal que requer domínio da linguagem, rapidez mental e conhecimento da atualidade. Em um domingo, 21 de dezembro de 1913, o jornal "New York World" publicou as primeiras palavras cruzadas, chamadas então "quebra-cabeças de palavras cruzadas", obra do jornalista Arthur Wynne, nascido em Liverpool (Reino Unido) e que vivia nos Estados Unidos.



Chamadas em inglês de "crosswords", palavras cruzada são sucesso mundial

Em formato de diamante, tinha 31 definições além de uma palavra já escrita: "Fun" (Diversão), e esta instrução: "preencha os pequenos quadrados com palavras que se encaixam nas seguintes definições". Embora no final do século XIX já houvesse em vários países europeus algumas tentativas muito incipientes que não tiveram continuidade, a invenção de Wynne reunia todas as características das palavras cruzadas modernas.


O jogo teve sucesso imediato e começou a aparecer constantemente na seção de passatempos da edição dominical do jornal. Outras publicações copiaram a ideia, e em poucos anos as palavras cruzadas ganharam o mundo, gerando com o tempo novas variantes e modalidades.

Em 1924, Richard Simon e Lincoln Schuster editaram o primeiro caderno exclusivamente com palavras cruzadas, depois que a tia de Richard, fã do jogo, perguntou ao sobrinho se não existia algum que pudesse dar a uma amiga. Ao perceber que havia um mercado, Simon e seu amigo partiram para a aventura editorial, e o sucesso da dupla foi tão grande que a pequena companhia que criaram acabou se tornando a gigante editora Simon & Schuster.


A chegada da internet e a crise da imprensa escrita fizeram alguns pensarem que as palavras cruzadas poderiam estar caminhando para o fim. No entanto, alguns jornais disponibilizam o passatempo pela internet e já existem aplicativos para celulares que permitem resolver o enigma sem necessidade de papel.

Provavelmente as palavras cruzadas mais famosas do mundo são as do "New York Times", e o responsável pela seção, Will Shortz, é uma figura reverenciada entre os milhões de praticantes nos Estados Unidos, onde se organizam em grandes torneios.

O "NYT" organiza as palavras cruzadas durante a semana com níveis de dificuldade: as segundas-feiras são mais fáceis, e a partir daí a coisa se complica progressivamente até as muito difíceis das sextas-feiras e dos sábados, enquanto as dos domingos são publicadas as de complexidade média. Segundo os especialistas, um dos segredos para conseguir uma boa palavra cruzada é, além de fazer com que as palavras se encaixem, elaborar boas definições, que tenham um nível adequado de dificuldade e acrescentem um pouco de humor ou algum tipo de participação que intrigue os neurônios.

O que uma pessoa deve ter para resolver uma palavra cruzada? Além de um bom conhecimento da língua, um interesse em assuntos atuais e ter boas referências culturais. O campeão do torneio mais importante dos Estados Unidos é Daniel Feyer, vencedor das últimas quatro edições e uma autêntica lenda entre os adeptos das disputas na área.


Feyer realizou há algumas semanas uma demonstração na sede do "New York Times", onde resolveu uma das palavras cruzadas mais complexas em 5 minutos e 29 segundos. Em dias normais, o campeão treina resolvendo dez palavras cruzadas simples em dez minutos.

Segundo Feyer, para ser um campeão é preciso ter uma mente capaz de reconhecer as palavras antes de ler a definição, reconhecer com poucas letras, algo que segundo ele faz com que músicos, especialistas em computação e matemáticos ganhem com frequência os torneios.

As palavras cruzadas percorreram um longo caminho em seus 100 primeiros anos, mas seu inventor, Arthur Wynne, não conseguiu se beneficiar de sua ideia.

Segundo sua filha Catherine explicou à emissora "CBS", o inventor das palavras cruzadas perguntou ao chefe, percebendo o sucesso inicial, se valia à pena patenteá-lo.

O editor respondeu que se tratava de "uma moda passageira" e recomendou que Wynne não gastasse o dinheiro na patente, segundo lembra sua filha, e por isso "papai nunca viu um centavo", desabafou.


Mundi Virtual


E se o Grande Irmão controlar a internet?
Por
Peter Van Buren

Estados e empresas já testam sistemas que permitem ocultar ou eliminar, maciçamente, conteúdos digitais. Para evitar futuro orwelliano, é preciso agir agora

Por Peter Van Buren | Tradução Cauê Seignemartin Ameni

Após alimentar sonhos de uma comunicação radicalmente livre, a internet poderia converter-se no exato oposto? A digitalização, que hoje acelera a circulação de informações em todos os formatos e linguagens, não facilitaria, também, a eliminação de informações e opiniões que já não têm existência material — porque foram reduzidas a impulsos eletrônicos? Nos últimos dias, fatos novos reforçaram a urgência de considerar estas ameaças com seriedade e de encontrar meios para afastá-las.

Nos Estados Unidos, depois de analisar a fundo o sistema de coleta maciça de informações sobre as chamadas telefônicas dos cidadãos, mantido pela Agência Nacional de Segurança (NSA) um juiz considerou-o, em 14 de dezembro, “quase orwelliano”. Três dias depois, um grupo de consultores formado pelo presidente Barack Obama para analisar este mesmo mecanismo recomendou uma série de mudanças. Propôs, em especial, retirar os poderes que pequenos grupos de assessores militares têm hoje para ordenar a vigilância direta sobre o conteúdo das comunicações mantidas por certas pessoas, a partir da identificação de seus interlocutores frequentes. Não há, no entanto, qualquer garantia de que as recomendações sejam adotadas.

Ao contrário: analistas de assuntos de segurança, ouvidos pelo “New York Times”, disseram “duvidar” que Obama tenha “coragem” para enfrentar a vasta rede de agências de espionagem formada após 11 de setembro de 2001 e a assinatura da “Lei Patriótica“. Um assessor da Casa Branca afirmou que o presidente analisará as propostas em suas férias de fim de ano no Havaí, mas que já descarta uma delas: precisamente a que desmantelaria certas articulações entre tais agências, para limitar seu poder.

Até onde pode ir este controle sobre a comunicação? No texto a seguir, Peter Van Buren, um diplomata norte-americano ainda na ativa, chama atenção para um de seus aspectos mais aterrorizantes. Num mundo em que as informações estão sendo digitalizadas em enorme velocidade e em que os suportes físicos estão desaparecendo, pode tornar-se fácil demais “apagar” informação incômoda. Não se trata apenas de hipótese. Van Buren, que escreve em publicações como The Nation, Huffington Post e Mother Jones, apresenta os sistemas que já são utilizados (embora em pequena escala), por governos e empresas para restringir o acesso dos cidadãos a certos conteúdos. No momento, prossegue ele, isso é feito com pretextos consensuais: por exemplo, restringir o acesso a sites que estimulam a pedofilia e o abuso de crianças. Mas, em novos cenários políticos, as mesmas técnicas de invisibilização não poderiam ser utilizadas contra ideias dissidentes? Não estamos arriscados a materializar o “buraco de memória” previsto por George Orwell em “1984″?

O alerta de Van Buren não precisa ser tomado como uma sentença. Assumir a ameaça como algo inevitável seria, aliás, um convite ao conformismo. Mas na agenda de temas sobre os quais é preciso agir para construir um planeta habitável no futuro, parece cada vez mais necessário destacar a disputa pela liberdade na internet. Talvez o que esteja em jogo, nesta batalha, seja a própria possibilidade de democracia e liberdade de expressão. (A.M.)
topo-posts-margem

E se fizessem Edward Snowden desaparecer? Não, não estou sugerindo alguma iniciativa “inovadora” da CIA, ou uma teoria conspiratória ao estilo de “quem matou Snowden?”, mas algo ainda mais tenebroso.

E se simplesmente posse possível fazer desaparecer tudo o que alguém denunciou? E pudessem ser eliminados, em tempo real, todos os documento da Agência de Segurança Nacional (NSA) revelados pelo ex-agente Snowden — cada entrevista que ele concedeu, cada indício documentado sobre um Estado de segurança nacional que fugiu de qualquer controle? E se a publicação de tais revelações pudesse ser reduzida a um esforço estéril, como se os fatos não existissem mais?

Estou sugerindo o enredo para o romance de algum George Orwell do século 21? Dificilmente. À medida que caminhamos para um mundo totalmente digitalizado, coisas semelhantes poderiam ser possíveis em breve, não na ficção cientifica, mas no nosso mundo real, apenas pressionando um botão. Na verdade, os primeiros protótipos de uma nova técnica de ocultameno radical já estão sendo testados. Estamos mais perto de uma distópica realidade aterradora, que poderia ter sido o tema de romances futuristas imaginários. Bem-vindo ao buraco da memória.

Mesmo se um futuro governo cruzar novas linhas vermelhas e simplesmente assassinar os vazadores de informações sigilosas, outros sempre emergirão. Mas em 1948, em sua assustadora 1984, no entanto, Orwell sugeriu uma solução mais diabólica para o problema. Evocou um artificio tecnológico para o mundo do Grande Irmão (Big Brother) que chamou de buraco da memoria. Em seu futuro sombrio, exércitos de burocratas, trabalhando ironicamente no Ministério da Verdade, passavam suas vidas apagando ou alterando documentos, jornais e livros, a fim de criar uma versão aceitável da história. Quando alguém caía em desgraça, o Ministério da Verdade o excluía, e toda documentação relacionada com sua vida, ia para o buraco da memoria. Cada artigo ou noticia que mencionava ou registrava de alguma maneira sua vida era modificado para erradicar todo o indicio de sua existência.

No mundo pré-digital de Orwell, o buraco da memoria era um tubo de vácuo no qual velhos documentos eram fisicamente destruídos para sempre. As alterações de documentos existentes e a eliminação de outros asseguravam que nem mesmo as repentinas alterações de alianças e inimigos globais estabilidade representassem problema para os guardiões do Grande Irmão. Neste mundo imaginado, graças aos exércitos de burocratas, o presente era o que sempre havia sido e os documentos alterados comprovavam este fato, sem o risco de que memórias titubeantes pudessem argumentar em contrário. Qualquer pessoa que expressasse dúvidas sobre a verdade do presente seria marginalizada ou eliminada, sob acusação de “crime de consciência”.

Censura digital, governamental e corporativa

A maioria de nós acessa notícias, livros, músicas, filmes e outras formas de comunicação por meios cada vez mais eletrônicos. O Google já tem mais receita publicitária que o conjunto de todos os meios impressos dos EUA. Mesmo a venerável Newsweek não publica mais uma edição em papel. E nesse mundo digital esta se explorando a possibilidade de um certo tipo de simplificação. Os chineses e iranianos entre outros, por exemplo, já implementaram estrategias de filtragem na web para bloquear o acesso a sites e material que não são aprovados pelos governos. Do mesmo modo (embora sem sucesso), o governo dos EUA bloqueia o acesso de seus funcionários ao Wikileaks e ao material divulgado por Edward Snowden, ainda que a censura não prevaleça em suas casas. Ainda não.

A Grã-Bretanha, no entanto, dará em breve um passo significativo, no que diz respeito ao que o cidadão pode ver na web, inclusive quando está em sua casa. Antes do fim do ano, quase todos os usuários de internet serão incluídos num sistema destinado a filtrar a pornografia. Por padrão, os controles também bloquearão o acesso a material violento, conteúdo relacionado a extremistas e terroristas, sites relacionados a anorexia, distúrbios alimentares e suicídios, assim como sites que mencionem álcool e tabagismo. O filtro também bloqueará material esotérico, embora grupos ativistas baseados no Reino Unidos exijam explicações.

E as formas de censura na internet patrocinadas pelos governos estão sendo privatizadas. Novos produtos comerciais, de fácil aplicação, garantem que uma organização não precise ser a NSA para bloquear conteúdos. Por exemplo, a Blue Coat é uma empresa-líder em “segurança” na internet é uma importante exportadora de tais tecnologias. Pode estabelecer facilmente um sistema para monitorar e filtrar todo o uso da internet, bloqueando sites por seu endereço www, por palavras-chaves ou mesmo por seu conteúdo. O software da Blue Coat é empregado, entre outros, pelo exército dos EUA, para controlar o que seus soldados veem quando deslocados ao exterior; e pelos governos repressivos da Síria, Arábia Saudita e Myanmar para bloquear ideia políticas do exterior.

Busca no Google…

Em certo sentido, o buscador do Google também poderia fazer desaparecer material. No momento, é simpático aos denunciantes. Uma rápida busca (0,22 segundos) produz mais de 48 milhões de hits sobre Edward Snowden, que se referem em sua maioria aos documentos filtrados da NSA. Alguns dos sites apresentam os próprios textos, etiquetados como Top Secret. Há menos de meio ano, somente membros de um grupo muito limitado no governo, ou conectado contratualmente com ele, poderiam ver coisas semelhantes. Agora, estão disponíveis em toda a web.

Buscador numero um na internet, o Google parece uma máquina para difundir maciçamente — e não suprimir — noticias. Coloque qualquer informação na web e é provável que o Google encontre-a rapidamente, agregando-a aos resultados de sua busca no mundo inteiro, às vezes em segundos. Mas como poucas pessoas pesquisam além dos primeiros resultados, o simples fato de estar presente ou oculto entre estes tem enorme significado. Já não basta fazer com que o Google note o que você produz. O que importa agora é conseguir que coloque o material suficientemente acima, na pagina de resultado das buscas. Se o seu site é o numero 47.999.999, numa pesquisa sobre Snowden, você pode dar-se por morto, praticamente desapareceu. Pense nisso como ponto de partida para as formas mais significativas de desaparecimento, que podem nos aguardar no futuro.

Ocultar algo aos usuários, reprogramando as maquinas de busca, é outro passo sombrio no futuro. Mais um é a eliminação efetiva de conteúdos, um processo que exigiria reprogramar os computadores que realizam a pesquisa. E se o Google se negar a implantar esta possível mudança em direção a buscas destrutivas, a NSA — que parece já ser capaz de projetar seus tentáculos dentro do buscador — poderia implantar sua própria versão de um código maligno, como já fez em pelo menos 50 mil casos.

Mas não se preocupe apenas com o futuro: uma estratégia de busca negativa já funciona, mesmo que seu objetivo atual, agir contra os pedófilos, seja fácil de aceitar. O Google introduziu recententemente um software que dificulta a busca de material relacionado a abuso infantil. Como disse o chefe da empresa, Eric Schmidt, o buscador foi programado para limpar mais de 100 mil palavras-chaves usadas por pedófilos para buscar pornografia infantil. Agora, por exemplo, quando os usuários fizerem pesquisas que possam estar relacionadas com abuso sexual, não encontrarão resultados que levem a conteúdo ilegal. Em seu lugar, o Google orienta para sites de ajuda e conselhos. Em breve presenciaremos essas mudanças em mais de 150 idiomas, de modo que o impacto seja verdadeiramente global, escreveu Schmidt.

Enquanto o Google reorienta as buscas de pornografia infantil para sites de aconselhamento, a NSA desenvolveu uma capacidade parecida. A agência controla um conjunto de servidores com o codinome Quantum, que se encontram na rede central da internet. Sua tarefa é reorientar objetivos, afastando-os dos destinos solicitados e redirecionando-os para sites preferidos pela agência. A ideia é: você digita o endereço de um site e é conduzido a outro, menos odiado pela agencia. Embora atualmente essa tecnologia seja usada para enviar potenciais jihadistas online a materiais islâmicos mais moderados, no futuro poderá ser empregada, por exemplo, para reorientar as pessoas que procuram noticias de site como a Al-Jazeera a outra agência, que se ajuste à versão dos fatos construída pelo governo.

… e destrói!

No entanto, as tecnologias de bloqueio e reorientação, que provavelmente serão mais sofisticadas no futuro, não constituem a maior ameaça. O Google já prepara o passo seguinte, a serviço de uma causa que quase todos aplaudirão. Está implementando tecnologia capaz de identificar imagens fotográficas de abuso infantil cada vez que aparecem em seu sistema, assim como tecnologia de comprovação capaz de verificar e eliminar vídeo ilegais. As ações da empresa para combater a pornografia infantil podem ser muito bem intencionadas, mas a tecnologia que esta sendo desenvolvida para tanto deveria nos aterrar a todos. Imagine se, em 1971, os Papéis do Pentágono, o primeiro documento sobre as mentiras da guerra do Vietnã a que a maioria dos norte-americanos teve acesso, houvessem sido eliminados. Se a Casa Branca de Nixon tivesse desaparecido com esses documentos, a história não teria seguido um caminho diferente, muito mais sombrio?

Ou considere um exemplo que já é realidade. Em 2009, muitos donos de leitores de livros digitais Kindle descobriram que a Amazon havia colocado suas mãos em seus aparelhos durante a noite e eliminado remotamente as copias de Revolução do Bichos e 1984 de Orwell (não é uma ironia). A empresa explicou que os livros, publicados por erro em suas maquinas, eram na realidade, copias dos romances vendidas ilegalmente. Da mesma maneira em 2012, Amazon apagou o conteúdo do Kindle de um cliente sem advertência prévia, afirmando que sua conta estava relacionada com outra conta que havia sido previamente encerrada por ir contra as políticas da empresa. Usando a mesma tecnologia, a Amazon tem agora a capacidade de atualizar livros em seu aparelho, com o conteúdo alterado. Depende da empresa informar os usuários a respeito ou não.

Além do Kindle, o controle remoto sobre outros aparelhos já é uma realidade. Grande parte dos softwares de nossos computadores comunica-se, em segundo plano, com servidores da empresa produtora, sendo sujeitos a atualizações automáticas que podem alterar seu conteúdo. A NSA utiliza malware, software maligno implantando remotamente em um computador, para alterar o modo de funcionamento da máquina. O código do vírus Stuxnet, que provavelmente danificou mil centrifugas usadas pelos iranianos para enriquer urânio, é um exemplo de como pode operar algo parecido.

Atualmente, cada iPhone já checa, com a sede central [da Apple], que aplicativos foram comprados; e sobre que links você clica rotineiramente, A Apple preserva-se o direito de desaparecer com qualquer aplicativo, por qualquer motivo. Em 2004, TiVo processou a Dish Network por entregar a seus clientes set-top boxes [equipamento para conectar televisões], que segundo a TiVo infringiam suas patentes de software. Apesar do caso ter sido solucionado em troca de uma grande indenização, como remédio inicial, o juiz ordenou a Dish que desativasse eletronicamente todos os 192 mil aparatos que havia instalado nas casas dos clientes. No futuro, pode haver cada vez mais meios para invadir e controlar computadores, alterar e fazer desaparecer o que está sendo lido, enviar os internautas a sites que não buscavam.

As revelações de Snowden, sobre o que faz a NSA para reunir informação e controlar a tecnologia, fascinaram o planeta desde junho, mas são apenas parte da equação. Como o governo ampliará seus poderes de vigilância e controle no futuro é uma história que ainda não foi contada. Imagine instrumentos para ocultar, alterar ou eliminar conteúdos com campanhas difamatórias para desacreditar ou dissuadir denunciantes. O poder que está potencialmente à disposição dos governos e corporações tornou-se mais evidente.

A possibilidade de ir além de alterar conteúdos, e modificar a maneira como as pessoas atuam também se encontra, obviamente, nas agendas governamentais e corporativas. A NSA já reuniu dados para chantagem espionando o acesso de muçulmanos radicais a pornografia digital. Também interceptou eletronicamente um congressista norte-americano sem possuir um mandato judicial. A capacidade de reunir informações sobre juizes federais, dirigentes do governo e candidatos presidenciais fazem com que os esquemas de chantagem de J. Edgar Hoover, no FBI da década de 50, parecerem tão pitorescos quando as meias soquete e saias poodle da sépoca. As maravilhas da Internet nos maravilham todos os dias. As possibilidades distópicas orwellianas da rede não tinha, até recentemente, chamado a nossa atenção da mesma forma. Elas deveriam.

Leia isso agora, antes que seja apagado

O possível futuro que espera os futuros vazadores de informação dos serviços de inteligência é aterrorizante. Agora, quase tudo é digital. Se grande parte do tráfico da internet mundial flui através dos Estados Unidos ou países aliados (ou da infra-estrutura de companhias norte-americanas no exterior); se máquinas de busca podem encontrar em questão de frações de segundos qualquer coisa; se, nos EUA, a Lei Patriótica e as decisões secretas do Tribunal de Supervisão da Inteligência Externa convertem o Google e gigantes da tecnologia em enormes instrumentos do Estado de segurança nacional; e se tecnologias sofisticadas podem bloquear, alterar e apagar material digital, apertando apenas um botão, o buraco da memoria já não é mais ficção.

Revelações vazadas terão tão pouco sentido como velhos livros empoeirados no sótão, cuja existência é ignorada. Poste o que quiser. As leis de liberdade de expressão permite que você o faça. Mas que sentido haverá, se ninguém puder ler? Seu tempo seria melhor empregado parando em alguma esquina e gritando aos transeuntes. Num futuro já fácil de imaginar, um conjunto de revelações similares às de Snowden poderá ser bloqueado ou excluído com tanta rapidez que ninguém poderá republicá-las.

Tecnologia em contínuo desenvolvimento, se viradas 180 graus, poderão eliminar maciçamente informações e opiniões. A internet é um espaço amplo, mas não infinito. Está centralizando rapidamente informações nas mãos de poucas corporações, sob o controle de poucos governos e os EUA encontram-se no centro das principais rotas de trânsito da rede.

Agora, você deveria sentir um calafrio. Estamos vendo, em tempo real, como 1984 passa de uma fantasia futurista para um manual de instruções. Se isso ocorrer, não será necessário matar um futuro Edward Snowden. Ele já estará morto.
(Carta Maior)

Venezuela


Maduro venceu (as eleições na Venezuela) e a empresa-imprensa NÃO NOTICIOU!

enviado por Max Altman e Vila Vudu em 14/12/2013


Crucial vitória de Nicolás Maduro, do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) e da Revolução Socialista Bolivariana; contundente derrota de Henrique Capriles, da MUD e dos setores golpistas de oposição; agora a atacar e resolver os problemas da economia e avançar nas conquistas sociais

“Dedicaram-se, durante todo o ano de 2013 , principalmente após a morte de Chávez, a sabotar a economia, a sabotar o sistema elétrico, à desestabilização, ao caos, à guerra psicológica. Trataram de converter eleições municipais em plebiscito. E o que ocorreu? O triunfo da Revolução Socialista Bolivariana derrotou os planos golpistas da direita”. (Nicolás Maduro)

Notaram, meus caros amigos e amigas, que o noticiário sobre a Venezuela desapareceu da grande imprensa quando antes do 8 de dezembro enchiam suas páginas vaticinando a débâcle do governo Maduro pelos inúmeros enviados especiais e correspondentes?

Disseram que era um plebiscito e foram com tudo. Os oligarcas são sempre insolentes. Ainda mais se são apoiados pelos Estados Unidos. Contavam que o empurrão definitivo para derrocar Maduro viria com o 8 de dezembro. Estavam cuidando dessa tarefa fazia meses. Remarcação de preços de todos os produtos muito acima da inflação, provocando desespero na população, desabastecimento induzido, sabotagem elétrica, açambarcamento, insegurança.

(E mais erros do próprio governo, que as manchetes gritantes dos jornais, rádios e televisão punham em evidência).

O mesmo cenário que se havia preparado para Salvador Allende antes do golpe de 1973. Desde os Estados Unidos, Roger Noriega escreveu e descreveu a tese do colapso total, que seria arrematado oportunamente, quando a situação ficasse insustentável, pelo exército norte-americano. Que a Venezuela tem demasiado petróleo. Parte importante da oposição estava de pleno acordo com esse roteiro. Por fim, o chavismo aniquilado. Fim do pesadelo. Malditos vermelhos.

Disseram que as eleições eram um plebiscito. E estavam disso plenamente convencidos. E o repetiram El País, ABC, El Mundo, Clarín, The New Yor Times, Newsweek, a CNN, Fox News, RAI, Excelsior, Miami Herald, Folha de S. Paulo, O Globo, TV Globo, o Estado de S. Paulo ...

Todavia eram apenas eleições municipais, com suas características próprias, conhecidas em todo o mundo político. Apresentavam-se candidatos a prefeito, vereador que iriam dar conta da prestação de serviços, asfaltamento de ruas, tráfego, varrição de lixo ... Coisas de município. Mas que importância tinha tudo isso? Para que perder a ocasião? Eram as primeiras eleições municipais sem Chávez.

Disseram que era mais que urnas municipais, que o chavismo sem Chávez estava ferido de morte, que o ilegítimo e incompetente Maduro ganhara a presidencial por diferença mínima e por meio de fraude, e que agora sim, agora teria que abandonar o Palácio Miraflores, por bem ou expulso pela força. Ah, se resistisse por que não envolto num saco de lona?

Quadro Geral Eleitoral - Eleições Municipais
(clique na imagem para aumentar)
Comparecimento nacional de 58.92%. (Recorde nacional em eleições similares. Na Venezuela o voto não é obrigatório).

As 335 prefeituras ficaram assim distribuídas:  242 (72,24%) para o PSUV e aliados;


    75 (22,32%) para a MUD e aliados; 18 (5,44%) para independentes.
    Das 40 cidades mais populosas, o PSUV ganhou em 30.
    Das 25 capitais, o PSUV conquistou 15 e a MUD 10. Se a oposição venceu em Barinas, capital do estado Barinas, gobernado pelo irmão de Chávez, Adan Chávez – o que foi intensamente alardeado – a Revolução conquistou Los Teques, Guaicaipuro, estado Miranda, gobernado por Capriles – o que foi escondido.
    PSUV e aliados obtiveram um total nacional de 5.277.491 votos; a MUD e aliados, 4.423.897. Diferença: 853.594 votos.(Cumpre lembrar que a diferença a favor de Maduro nas eleições presidenciais foi de cerca de 230 mil votos ou 1,6%.).
    Se levarmos em conta apenas os votos da Revolução e da Oposição teremos, respectivamente, 54,40% e 46,60. (Vale destacar, por exemplo, que entre as agremiações políticas que concorreram independentemente está o Partido Comunista, firme aliado da Revolução, e que obteve 9 prefeituras, sendo 2 sem aliança, e cerca de 1,6% dos votos ou cerca de 175 mil votos. Se acrescentarmos somente esses votos à Revolução, a diferença ultrapassa os 10 pontos percentuais.)
    No Estado Miranda, governado pelo líder da oposição, Henrique Capriles, o Psuv e aliados obtiveram 560.826 votos (52,1%) contra 514.796 votos (47,9%)  da Mud e aliados.

PSUV - PartidoSocialista Unido de Venezuela se consolida com 1a. força política no país
(Redecastor)

Narcotráfico




Javier Sicilia, um poeta mexicano contra o narcotráfico
O poeta mexicano Javier Sicilia fez da morte do filho de 24 anos uma causa não só sua, mas de todas as outras vítimas da chamada guerra ao narcotráfico.

Eduardo Febbro


Cuernavaca, México – A narração pontual do horror pode não bastar. O desfile interminável de mortos na rua, de imagens de gente pendurada nas pontes, de decapitados, fuzilados, a contagem regular de novas vítimas que se somam as 50 mil da véspera são só isso: imagens e estatísticas. A sociedade prossegue mergulhada em um estranho silêncio. Mas um estouro entre tantos torna-se uma revelação incrível.


O poeta mexicano Javier Sicilia encarna na pele e nos ossos essa transformação da sociedade mexicana. Com ele se passou do silêncio à rua, da mansidão à rebeldia, da solidão e do anonimato ao movimento, da mais profunda injustiça ao sonho de que exista uma justiça. Um drama precipitou esse despertar coletivo. No final de março de 2011, Juan Francisco Sicilia, seu filho de 24 anos, foi assassinado pelo crime organizado junto com outros seis jovens no Estado de Morelos.

Dessa morte íntima, Javier Sicilia fará uma causa, não sua, mas sim de todas as outras vítimas. Javier Sicilia saiu à rua para reclamar justiça, por seu filho e pelas dezenas de milhares de mortos que o narcotráfico deixou no país. Marchas, caravanas ao longo do país, pouco a pouco o México foi abrindo os olhos ante o horror com que convivia. Dessas marchas surgiu um grupo, o Movimento pela Paz com Justiça e Dignidade.


Sicilia obrigou o presidente que havia lançado uma guerra contra o narcotráfico, Felipe Calderón, a dialogar, aceitar as responsabilidades do Estado, a pactuar uma lei geral de vítimas mediante a qual fossem garantidos os seus direitos. Sem disparar um só tiro. Só com as marchas, as caravanas, a poesia como aposta e alguns cadernos que foram sendo preenchidos com os nomes de tantos mortos anônimos.


O Movimento pela Paz com Justiça e Dignidade é uma das iniciativas mais originais e únicas do último quarto de século. Deu nome e sobrenome aos mortos. Não tem similar no mundo: não só enfrentou o Estado, como também os criminosos, a impunidade e o pior inimigo da justiça: o silêncio.

“Já não há mais o que dizer. O mundo já não é digno da Palavra”, escreveu Javier Sicilia no último poema de seu último livro. O poeta decidiu calar-se para sempre, mas não o homem de ação que, em seus protestos por justiça coletiva, descobriu o México extenso da dor e do horror.

Em seu mundo natural de Cuernavaca, Javier Sicilia fala com essa marca que fica nos olhos quando a vida fere sem avisar. Não há ódio nem rancor em suas palavras, mas sim o peso de uma consciência viva e a bondade que, para além do mal, persiste no coração humano. Às vezes, a poesia pode convocar a consciência moral de uma nação no momento de máximo horror, de máximo adormecimento dessa consciência. Javier Sicilia e seu movimento tornaram realidade esse “milagre cívico”.

Seu movimento tem uma essência muito pessoal. Frente à violência extrema que assola o México, você saiu à rua para pedir justiça tendo a poesia como mediadora.

Os dois grandes movimentos dos últimos 20 anos que tem uma posição moral indiscutível foram gerados com uma linguagem poética. O zapatismo e o nosso.


Toda linguagem poética rompe a unicidade o unívoco das linguagens políticas e permite voltar a ver a realidade em sua profundidade, em seu horror e em sua humanidade. Ambos os movimentos, com diferentes linguagens poéticas, mas sempre utilizando os recursos da poesia, as imagens, os símbolos, as metáforas, funcionaram e desvelaram um horror que estava oculto sob as linguagens unívocas do político, sob a abstração da estatística. Também revelaram a responsabilidade do Estado frente a essa humanidade negada. No caso do Subcomandante Marcos foi com as comunidades indígenas, no caso do Movimento pela Paz com Justiça e Dignidade foram as vítimas desta guerra contra o narcotráfico lançada pelo ex-presidente Felipe Calderón.


Por que a poesia pode mais que a própria verdade do horror e do incontável número de assassinatos? Qual é sua capacidade de interação, de revelação ou de consolo?


A poesia nasce do mais profundo do humano, nasce do coração, e só desde o coração se pode assumir tanta dor e dar tanto amor. Isso é o que permitiu a ambos movimentos fazer o que fizeram pelas vítimas, ir contra o crime organizado, contra o Estado e plasmar o registo de sua respectiva desumanidade, de seu terrível desprezo, e das dívidas que o Estado tem com as vítimas.

Você conseguiu o que quase ninguém havia conseguido até então: interpelar o Estado, colocá-lo diante de sua responsabilidade.


A base de um Estado consiste em garantir a paz, a segurança e a justiça de uma sociedade. Quando isso não se cumpre há algo que está falhando profundamente.

E isso é o que ocorre no México, onde há 98% de impunidade. Se está se matando, sequestrando e destruindo a vida humana, como faz o crime organizado, há algo que não está funcionando bem no Estado. E alguém tem que interpelar o Estado. Em um dos diálogos com o ex-presidente Felipe Calderón, ele se atreveu a me dizer por que eu não reclamava para os narcos. Eu lhe respondi: diga-me que não há Estado e então nós nos acertaremos com os criminosos. Mas, até onde sei, o Estado tem que responder por isso.

O Movimento pela Paz com Justiça e Dignidade nasceu em 2011, depois do assassinato de seu filho e amigos. O México já conhecia um grau de horror inqualificável, no entanto, essas mortes despertaram o país, o fizeram olhar de frente para o que estava ocorrendo.

As linguagens que descrevem fenômenos sociais não são suficientes para explicar isso. Por que, a partir de mim e de meu filho, foi possível conseguir uma coisa desta natureza? A explicação histórica, antropológica, não basta para entendê-lo.


Creio que pertence a uma ordem que nos rebaixa, a uma espécie de milagre cívico nascido do horror, da tragédia. Creio que não há resposta. Eu nunca pensei em passar à ação coletiva, não pensava que ia fazer um movimento. Eu só fui protestar, reclamar, expor minha palavra. E algo ocorreu a partir dessa palavra e tudo começou a se articular, algo estava aí à espera de uma palavra-chave, de uma palavra mágica que convocasse uma mobilização, uma dignificação, uma lógica humana de vida, de força moral.

Creio que a partir da morte de meu filho João Francisco e de seus amigos e das palavras proferidas se despertou a reserva moral do país, que estava adormecida, mergulhada. Mas estava viva. O terror adormece, o terror busca escapar por saídas psíquicas que nos levam à aparência de certa indiferença. Mas as reservas estão aí. Enquanto não se matar completamente a alma de um povo, a reserva moral está esperando algo que a detone. Aqui foi uma tragédia e uma palavra dura, indignada, ou seja, dizer: “Basta. Estamos fartos disso”. As forças vivas despertaram a partir da morte. O horror que era negado neste país tornou-se visível.

A partir desse despertar, foram realizadas caravanas em todo o país pela paz. O que descobriu neste périplo?

Vi um México que intuía que existia, do horror e do mal, um México que nunca havia sentido antes com todo o peso de minha carne, um México que toquei com todos os meus sentidos. Vi esse México massacrado, destroçado, sofrendo. Um dia, em uma das caravanas que fizemos em uma das zonas mais duras do país, Durango, se aproximou de mim um menino de cinco anos com o retrato de seu pai. Ele me disse: “esse é meu pai, mataram ele, ontem me entregaram ele envolto em um cobertor”. Esse menino órfão era a imagem do país. Nestes tempos, o horror é a incapacidade de vê-lo. Por isso o horror se torna mais brutal.


Devo dizer também que um Estado corrupto como este também gera uma tremenda corrupção moral. Há uma parte deste país que, junto com o Estado, está profundamente corrompida, degradada. Não se explica que tenhamos chegado onde chegamos. Este é um poder que se baseia na máfia e na delinquência. Por isso temos o que temos. Refazer isso será muito custoso. É muito fácil destruir, corromper. Construir é muito difícil.

O movimento se confrontou com dois poderes: o do Estado e o dos criminosos.

Todo poder é covarde porque utiliza uma força que transcende toda proporção humana. Os criminosos exercem um poder cínico, covarde. E tivemos que confrontar essa imensa covardia, esse imenso cinismo, tanto do Estado quanto dos criminosos. Os desafiamos desde nossa pequenez e com as armas que são o amor e a dignidade. Com isso atravessamos este país, atravessamos os Estados Unidos. Já não podem ocultar o horror, a dor e a impunidade. Terão que encontrar um caminho de justiça e de paz. A força coletiva é muito importante frente ao poder, o poder precisa ver uma nação de pé, expressando-se. A democracia não se resume às urnas. A democracia é o poder do povo. Quando um povo se une e desafia um Estado que não está cumprindo a vontade desse povo, aí começamos a viver a democracia.

Isso é o que ocorreu com as mobilizações. Neste momento, o Estado teve medo e começamos a viver a democracia. Foi a presidência, o poder político, que veio até nós e disse: “dialoguemos”. De acordo, dissemos, mas segundo nossas condições.


Não dialogamos na obscuridade, não dialogamos atrás de portas fechadas, dialogamos frente à nação porque este é um tema da nação e diz respeito a todos nós. Assim foram os diálogos. Chamamos o poder de tu e o confrontamos como o que ele é: servidor desta nação, da cidadania. Mas nós sozinhos não valíamos nada. O poder não zombou de nós porque chegamos unidos.

Vocês conseguiram também algo muito profundo: dar nome e sobrenome aos mortos, dotá-los da identidade que o Estado e os criminosos negavam. Retiraram o manto de silêncio.

O país acumulava cinco anos de profunda dor, de muitas vítimas. Neste momento, tínhamos mais de 40 mil mortos, 10 mil desaparecidos. E apesar disso, nada ocorria. O poder político falava de “baixas colaterais” enquanto que o presidente dizia: “estão se matando entre eles”. O poder negou às vítimas seus direitos civis, seus direitos humanos. Eu disse: através da morte de meu filho assumo a morte de todos. A partir deste momento, todos os jovens assassinados neste país, que são a maioria, são meus filhos. Assim começaram a chegar as vítimas, assim começaram a falar, assim começou a falar a alma de um povo. As vítimas vinham e narravam seu horror, sua dor, com suas próprias palavras.

Fomos do norte ao sul do país para que as vítimas falassem, para que contassem sua história. Uma palavra se tornou a palavra de todos, com seus respectivos nomes, sobrenomes e histórias. Formou-se uma grande coalizão, reunindo setores da esquerda e da direita, o que foi fundamental para este movimento. O nome de João Francisco Sicilia nomeou a todos. O que fizemos foi abrir os espaços públicos aos negados para que nomeassem seus mortos, suas dores, sua condição de vítimas. Eu não fui mais que a voz de uma tribo de pessoas que sofriam, por minha voz falaram as vítimas e através do nome de meu filho estão falando muitas outras vítimas.

Como se salva um ser humano que, em seu nome pessoal e no de sua sociedade, enfrentou o horror? Com esquecimento, perdão?

O perdão é complexo. É preciso entender o perdão. Há quem ache que o perdão é esquecimento, mas não é. O perdão é um dom, é um ato de gratuidade como o amor. Quando me perguntam se perdoei os criminosos que mataram meu filho eu respondo: sim, perdoei. Pedi justiça, não pedi sua morte. Mas para que esse dom se cumpra, o perdão não pode prescindir da justiça. Tem que haver arrependimento da outra parte. Caso o contrário o perdão não ocorre.

Você disse depois da morte de seu filho que não escreveria mais.

Minha relação com a escritura mudou substancialmente. Deixei de escrever poesia.


As palavras degradadas de minha época já não me bastam para dizer, veja o paradoxo, o horror indizível que estamos vivendo, nem para empreender a reconstrução do sentido. O idioma não me basta mais. Estamos diante de fenômenos onde a linguagem entra em crise. Fenômenos de horror, da morte, de ausência de sentido que colocam em crise a língua e, sobretudo, a mais alta expressão da língua que é a expressão literária. Um escritor vive da língua de sua época, quando essa língua se degrada pela barbárie que estamos vivendo no México, pelo uso mentiroso da linguagem, essa língua já não é suficiente para poder refundar os sentidos. Isso ocorreu em meu país.


Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

Snowden



“Os EUA provavelmente jamais saberão tudo que Snowden tem”
 Mark Mazzetti e [**] Michael S. Schmidt, The New York Times
“Officials Say U.S. May Never Know Extent of Snowden’sLeaks”
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Edward Snowden
WASHINGTON – A inteligência e os órgãos policiais e de justiça dos EUA concluíram que é possível que jamais venham a saber com precisão satisfatória tudo que o ex-empregado de empresa contratada pela Agência de Segurança Nacional, Edward J. Snowden, extraiu dos computadores super secretos do governo, antes de deixar os EUA, disseram altos funcionários federais norte-americanos.

Os investigadores permanecem no escuro sobre a extensão da quebra de segurança dos dados, em parte porque a unidade da Agência de Segurança Nacional dos EUA no Havaí, onde Snowden trabalhava – diferente de outras unidades – não estava equipada com programas atualizados que permitissem àquela agência de espionagem monitorar os pontos, de seu vasto horizonte de computação, em que os empregados estivessem navegando em cada momento.

Seis meses depois de a investigação ter sido iniciada, os funcionários disseram que Snowden havia coberto suas pistas logando-se em sistemas sigilosos mediante as senhas de outros empregados da agência, e depois de invadir firewalls instalados para limitar o acesso a algumas partes do sistema.

Consumiram-se centenas e centenas de horas-homem para reconstruir tudo que ele copiou, e ainda não se sabe a extensão do que ele tem – disse um alto funcionário do governo. Sei que parece loucura, mas tudo, nesse caso, é loucura.

NSA - Entrada principal em Fort Meade, Maryland
A evidência de que Snowden tenha sido tão hábil a ponto de ter conseguido explorar os pontos cegos nos sistemas da mais secreta agência de espionagem dos EUA ilustra bem o quanto a segurança de computadores ainda é precária, mesmo depois de anos de o presidente Obama ter ordenado que os padrões de segurança fossem melhorados, depois das revelações de WikiLeaks em 2010.

As revelações de Snowden dispararam um debate nacional sobre a extensão dos poderes da Agência de Segurança Nacional dos EUA para espionar, em casa e no exterior, e condenaram o governo Obama a ter de tentar remendar relações com aliados, depois de o mundo saber que os EUA espionaram governantes de outros países.

Uma comissão presidencial de aconselhamento, que examinou as operações da Agência de Segurança Nacional, entregou ontem (6ª-feira, 13/12/2013) o seu relatório ao presidente Obama. A Casa Branca disse que o relatório não será divulgado até o próximo mês, quando o presidente Obama já tiver decidido quais recomendações acatará e quais rejeitará.

Snowden entregou o arquivo de documentos a pequeno grupo de jornalistas, e alguns deles partilharam documentos com várias empresas de notícias – o que acabou por revelar a espionagem contra governos amigos. Em entrevista ao The New York Times em outubro, Snowden disse que entregara os documentos que copiou a jornalistas e que não conservou cópias adicionais.

Richard (Rick) Ledgett, provável sucessor de Keith Alexander no comando da NSA
Recentemente, um alto funcionário da Agência de Segurança Nacional disse a repórteres que acredita que Snowden ainda tem documentos que não revelou. Esse funcionário, Rick Ledgett, que chefia a força-tarefa da Agência que está examinando o vazamento produzido por Snowden, disse que consideraria a possibilidade de os EUA garantirem anistia a Snowden, em troca daqueles documentos.

Sim, minha opinião pessoal é que sim, vale a pena conversar sobre isso – disse Ledgett à CBS News. Eu exigiria garantias de que o resto dos dados estariam fechados para sempre e meu padrão de exigência, nesse caso, seria muito alto. Teria de ser mais que a simples palavra dele.

Snowden está vivendo e trabalhando na Rússia, sob asilo concedido por um ano. O governo russo recusou-se a extraditar Snowden para os EUA, onde Snowden foi acusado pelo Departamento de Justiça, em junho, por crimes de espionagem e roubo de propriedade do estado.

Snowden disse que voltaria aos EUA, se recebesse anistia, mas nada garante que o presidente Obama – a quem, provavelmente, caberia tomar a decisão de anistiá-lo – optaria por essa via, dado o dano que o governo alega que os vazamentos teriam causado à segurança nacional.

Dado que a Agência de Segurança Nacional ainda não sabe exatamente o que Snowden tem, os funcionários são informados dos vazamentos, quase sempre, pelos jornalistas que trabalham na publicação dos documentos, o que os deixa sem tempo para prevenir outros países sobre revelações que estejam a caminho.

Enquanto a segurança da Agência tenta reciclar sua rede de computadores, na sequência do que pode ter sido a maior invasão em arquivos de informação secreta de toda a história dos EUA, o Departamento de Justiça continuou sua investigação sobre Snowden.

Segundo altos funcionários do governo, agentes do FBI do escritório de campo do gabinete, em Washington, acreditam que Snowden tenha metodicamente baixado os arquivos ao longo de vários meses, enquanto trabalhava como empregado terceirizado do governo, no Havaí. Para os mesmos agentes do FBI, Snowden trabalhou sozinho.

Mas, apesar da vasta expertise técnica de Snowden, alguns funcionários norte-americanos culpam a segurança da Agência, por não ter instalado software que detectasse atividade não usual nos computadores pelo pessoal que trabalha ali – 35 mil empregados, a maior força de trabalho de todas as agências de inteligência.

Chelsea Manning
Depois de episódio semelhante em 2010 – quando um cabo do exército, Chelsea Manning, [1] entregou centenas de milhares de arquivos de conversas e de telegramas diplomáticos ao grupo WikiLeaks – o governo Obama tomou medidas para evitar que outro empregado do estado copiasse e distribuísse grandes quantidades de material secreto.

Em outubro de 2011, o presidente Obama assinou uma Ordem Executiva que criou uma força-tarefa encarregada de “deter, detectar e mitigar ameaças internas, incluindo salvaguardar informação secreta, contra exploração, concessão ou qualquer outra revelação não autorizada”. A força-tarefa, comandada pelo advogado-geral e pelo diretor da inteligência nacional, tem a responsabilidade de desenvolver políticas e novas tecnologias para proteger informação secreta.

Mas uma das mudanças, a atualização dos sistemas de computadores, para rastrear as trilhas por onde se movimentem os empregados das agências de inteligência, foi muito lenta.

Não conseguimos mexer numa chave e ter todas as mudanças implementadas num instante – disse um funcionário da inteligência norte-americana.

Lonny Anderson
Lonny Anderson, chefe de tecnologia da Agência de Segurança Nacional dos EUA, disse em entrevista recente que muito do que Snowden copiou veio de partes do sistema de computadores abertos a qualquer pessoa que tivesse autorização de alto nível de segurança. E que parte de seu trabalho era deslocar grandes quantidades de dados entre diferentes partes do sistema.

Mas, disse Anderson, as atividades de Snowden não eram monitoradas de perto e não dispararam nenhum tipo de sinal de alerta.

“A lição a aprender, para nós, é que é preciso acabar com o anonimato” para todos que tenham acesso a sistemas secretos, disse Anderson em entrevista ao Blog Lawfare, parte de uma série que aquela página prepara-se para publicar essa semana.

Funcionários disseram que Snowden, que entendia a fundo a arquitetura dos computadores da Agência de Segurança Nacional, poderia já saber que os escritórios do Havaí estavam atrasados, em relação a outros, na instalação dos programas de monitoramento.

Segundo um ex-funcionário do governo que falou recentemente com o general Keith B. Alexander, diretor da Agência de Segurança Nacional dos EUA, o general disse que, no momento em que Snowden estava copiando os documentos, a agência de espionagem estava a meses de iniciar a instalação de sistemas que capturariam a atividade.

Enquanto avançavam as investigações pelo FBI e pela Agência de Segurança Nacional, o Departamento de Estado e a Casa Branca ainda estão tendo de absorver o impacto das revelações de Snowden contra as relações diplomáticas dos EUA e outros países.

Há esforços em andamento, pelo Departamento de Estado, para fazer contato com outros países e explicar a eles o que se sabe sobre o que Snowden gravou – disse um alto funcionário do governo. O mesmo funcionário disse que: (...) o Departamento de Estado costumava considerar a espionagem contra governantes estrangeiros como “a coisa de sempre” [orig. “business as usual”] entre nações.


Nota dos tradutores
[1] Interessante observar aqui que o New York Times dá à Chelsea Manning o nome que ela declarou que prefere, quando mudou de identidade social, de Bradley (nome masculino), para Chelsea (nome feminino).
Já os infinitamente imbecis jornalistas do Grupo GAFE (Globo-Abril-FSP-Estadão) insistem em dizer e escrever “presidente” (designação masculina) para a presidenta Dilma, que não mudou de sexo, nem de identidade social, e, simplesmente, declarou que preferia que se usasse, para ela, o substantivo “presidenta” (designação feminina).
À parte a imbecilidade do que os jornalistas do Grupo GAFE (Globo-Abril-FSP-Estadão) insistem em dizer, escrever e ensinar a repetir, há a considerar também a inominável grosseria e a repugnante arrogância. Muito piores, como se vê, até, que a do NYT.
______________________

[*] Mark Mazzetti é jornalista do New York Times e foi premiado com o Pulitzer de 2009 na categoria de Jornalismo Internacional juntamente com 3 outros profissionais da imprensa-empresa dos EUA.



[**] Michael S. Schmidt é correspondente do New York Times em Washington, DC.
(Redecastor)

Obama


Obama, a empresários e executivos de Wall Street, em 18/11/2013: - Vocês dizem que sou “socialista” é porque nunca viram um socialista de verdade
Jennifer Epstein, Politico
Obama scoffs at people who call him a “socialist”: “You gotta meet real socialists”
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Entreouvido na Viela do Xucro na Vila Vudu: TAÍ! Os jornalistas de Político e os “100 maiores empresários e executivos” dos EUA reunidos pelo Wall Street Journal não leram, os panacas... Mas OBAMA JÁ LEU O “MAPA DO CAMINHO” APROVADO NA 3º PLENÁRIA do PARTIDO COMUNISTA DA CHINA, para as reformas rumo a uma economia socialista de mercado. É a glória! Dáááááááá-lhe China! Vaaaaaaai, Xi Jiping! [pano rápido]



Ontem, o presidente Obama riu dos críticos que o chamam de “socialista”.

Há gente que, às vezes, me chama de socialista – disse ele num encontro com 100 empresários e executivos promovido pelo Wall Street Journal.

Ah, vocês precisam conhecer socialistas de verdade, para saber o que é ser socialista – disse Obama, arrancando gargalhadas do público.

Eu só falo de baixar impostos para empresas. Minha reforma da Saúde é baseada no mercado privado. As ações estão bem, pelo que vi hoje cedo – continuou, na lista de seus atributos de boa fé nos mercados.

E... Sim, é verdade que a desigualdade crescente no nosso sistema me preocupa. Mas isso não implica que alguém esteja questionando a eficácia das economias de mercado, em termos de produção de riqueza e inovação e de nos manter competitivos.

_______________________


[*] Jennifer Epstein é a repórter responsável pela cobertura da Casa Branca em POLITICO desde 2010. Formou-se em História na Princeton University em 2008 onde iniciou carreira de jornalismo no The Daily Princeton. Sua tese de formatura foi: “Slaves and Slavery at Princeton”, com a qual ganhou o Prêmio Jolene CO para a História Americana.
(Redecastor)

A. Latina II



   
América Latina - o fim de um ciclo
Elaine Tavares
Adital



Ao se completarem nove meses da morte de Hugo Chávez, o panorama que se vislumbra na América Latina é desanimador. A Venezuela "cria cuervos”, agarrada com a elite financeira do país que põe a economia no chão.

O Equador se rende as mineradoras e aos ditames do Banco Mundial. O Brasil, que nunca chegou a trilhar os caminhos do socialismo, cada vez mais mergulha no pragmatismo do negócio. Países da América Central que estavam inclinados a uma parceria com a Venezuela também se desviam. A Bolívia, apesar de forte influência indígena, igualmente vai se rendendo às grandes empresas privadas, que formam um perigoso poder no país. O Uruguai, que tem sido a estrela da vez, avança em reformas que muito pouco mudam a estrutura do sistema de governo. Ao que parece, a era das transformações está encerrada e o caminho para o socialismo, que era uma promessa do líder venezuelano, está, por hora, interrompido. Como era de se esperar, o desaparecimento de Chávez foi também o desaparecimento do motor teórico do processo "revolucionário” que começou com a chegada desse militar incomum ao poder em 1998.

Quando Chávez chegou à presidência da Venezuela o mundo estava então dominado pelo pensamento neoliberal. Parecia não haver saída desse labirinto de pensamento único. Na América Latina apenas Cuba seguia resistindo, e o presidente venezuelano entrou no cenário com um discurso duro contra o imperialismo e o capital. No princípio foi tratado como um anacronismo, uma falha na matrix que logo seria extirpada. Mas, no tecido social completamente roto da Venezuela a proposta de Chávez cresceu, tomou corpo e se encarnou na maioria da população desde sempre empobrecida. Ele prometia uma revolução bolivariana, amarrada ao ideário do famoso conterrâneo que liderou as grandes guerras de independência da parte norte e leste da América Latina: Bolívar. E o que é o bolivarianismo? Um sistema de governo que tem como plataforma a educação gratuita para todos, soberania, fim do colonialismo político, econômico e cultural, unidade dos países latino-americanos, fim da dependência.

E foi esse sendeiro que o governo de Chávez foi abrindo por entre as veias da América Latina. Seu discurso forte, seu carisma e, fundamentalmente suas ações, guinaram a Venezuela à esquerda e, com ela, começaram a girar também outros países. O Equador, depois de fortes rebeliões indígenas, foi buscando um caminho soberano. A Bolívia, igualmente derrubou presidentes, ardeu em rebelião e apontou novos horizontes, inauditos. Veio uma nova Constituição na Venezuela, participativa, desde baixo. Outro duro golpe no pensamento neoliberal, no modelo ocidental, burguês. Institucionaliza-se o poder popular, coisa inédita nestes confins. Anunciam-se revoluções bolivarianas, cidadãs, culturais. O imperialismo atacou, deu golpe, mas foi derrotado pela massa que já não estava mais excluída da participação. Chávez voltou fortalecido, passou por novas eleições, sempre vencendo. Dia a dia ele falava com seu povo, lia livros, editava outros tantos, orientava estudos. Não era um bravateiro sem estofo. Sabia o que dizia e o que estava fazendo. Não era ainda o socialismo. No máximo, um capitalismo de estado, mas prometia avançar para além. E caminhava.

Na esteira das mudanças venezuelanas a Bolívia também mudou. Elegeu Evo Morales, das fileiras indígenas e sindicais, construiu de forma participativa e popular uma nova Constituição, criou um estado Plurinacional, avançou na participação, fez assomar a cultura originária, maioria no país. O Equador seguiu o mesmo diapasão. Nova Constituição outorgou direitos à natureza, Estado pluricultural. Abriu espaço para novos pensares, mais além do socialismo: o sumak kawsay, uma forma de organizar a vida embasada em conceitos autóctones, dos povos antigos, coisa completamente nova para quem acreditava que o modelo europeu era o único possível.

A América Latina entrou no novo milênio ardendo em novidade e transformação. Quando alguém fraquejava, lá vinha o Chávez com sua voz de trovão, puxando o timão mais à esquerda. E mesmo quando ele mesmo claudicava, ou cedia ao "possível”, buscava nos autores revolucionários, nos heróis do passado, a inspiração para reavaliar e avançar. E, assim, esses três países em especial (Venezuela, Bolívia e Equador) começaram a realizar algumas mudanças que finalmente mexiam nas estruturas. Outros, como o Brasil, a Argentina, a Nicarágua, Honduras, Paraguai, Uruguai, principiaram a realizar reformas e a amparar pelo menos alguns pontos do bolivarianismo, como a ideia de soberania e união latino-americana.

Quando, no mês de março de 2013, o câncer venceu o comandante, as coisas já não andavam bem. Na Venezuela era possível observar a subida da inflação e a opção do governo por uma aliança com o setor financeiro. O país não conseguia avançar no caminho do desenvolvimento endógeno, atropelado que fora ano após ano por golpes, contragolpes e ações desestabilizadoras da direita. Apesar de todos os esforços empreendidos, o rentismo petroleiro ainda era o carro chefe da economia do país. A produção - de comida e de outros produtos de uso corrente - não deslanchou. Continuava mais vantajoso ao empresariado nacional seguir com a importação, especulando com o dólar, criando um perigoso mercado paralelo para a moeda estadunidense.

Na Bolívia, Evo Morales passou a apostar na lógica do neodesenvolvimentismo, puxada pelo Brasil. Projetos grandiosos com construtoras estrangeiras (brasileiras) e o crescente conflito com as comunidades indígenas. No Equador, Rafael Correa foi mordido pela mosca azul e abraçou-se às mineradoras e as grandes empresas do petróleo. Tem mantido fogo cerrado contra os povos indígenas, acusando-os de barrar o progresso do país e entrou de cabeça na mesma onda do "desenvolvimento” a qualquer custo. O modelo é o mesmo do Brasil. Reforma sem vestígios de revolução.

A morte de Chávez de certa forma liberou os aliados para uma virada de timão, mais ao estilo do Brasil. Aquilo que Lula não conseguiu, já que era frequentemente ofuscado por Chávez, Dilma logrou. Não tanto pela ação dela, mas porque agora os mandatários vizinhos estavam mais livres para fugir da rota socialista. Daí que se configura inegável o papel de liderança que o presidente venezuelano exercia em todo o continente. Tanto que as proposta de uma aliança com o Caribe e a construção da Unasur foram constituídas a partir de suas investidas. A união das repúblicas latino-americanas era um sul determinado por ele e, num período de crise na região europeia assim como nos Estados Unidos, foi e continua sendo uma alternativa muito conveniente para os países da América Latina. Mas, apesar de essas propostas seguirem vivas e atuantes, é fato que perderam força política. Os encontros continuam, as instituições também, mas não há uma liderança capaz de articular as ações econômicas com o debate teórico. A última reunião da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba) foi um bom exemplo. Realizada em Caracas no último dia 17 de dezembro, não mereceu sequer uma nota nos jornais. Falta a grandiloquência de um projeto totalizante de combate ao capitalismo.

O professor Nildo Ouriques, do Instituto de Estudos Latino-Americanos, analisa a Venezuela hoje, sob o comando de Nicolás Maduro, e não tem dúvidas de que o processo revolucionário, por agora, se esgotou. "O fato de o partido do governo ter ganhado as eleições municipais agora em dezembro não diz muito. Nos pequenos municípios a política do partido está consolidada. Mas, nos grandes, não. Daí que a direita avança por aí. Maduro não tem a força de Chávez para mudar o rumo dos acontecimentos e talvez nem mesmo Chávez pudesse fazê-lo. Pode até ser que o bolivarianismo siga no poder por algum tempo – e é bom que siga - mas não haverá mais mudanças radicais e o povo ficará cada vez mais fora do poder de decisão”. Segundo Nildo, a inflação galopante que tem assolado o país e a criação de um mercado paralelo do dólar enfraquecem a economia e a tendência é de que, a seguir essa política, a situação econômica se agrave ainda mais. O empresariado local não tem interesse na produção, está lucrando de forma astronômica com o dólar. E, sem produção, o país segue dependente. É um círculo vicioso e sem saída. A menos que houvesse uma virada de curso. Mas isso não se vislumbra.

Nos demais países, a falta de um discurso forte acerca do caminho para o socialismo ou qualquer outra forma diferente de organizar a vida, coloca todo mundo -em maior ou menor grau- na posição de "humanizar" o capitalismo. No Brasil, algumas políticas públicas asseguram renda aos mais pobres, o programa Mais Médicos surge como um importante paliativo de saúde para os fundões do país. Mas, por outro lado, o agronegócio está cada vez mais abraçado ao governo, deitando e rolando no ataque aos indígenas e aos que pretendem colocar qualquer freio a nova expansão da monocultura. Vive-se uma investida anti-indígena só comparada a caminhada para o norte no início do século XX. No Uruguai, apesar de passos importantes como o ataque ao narcotráfico e a busca por uma democratização da mídia, Mujica permite a ação nefasta das papeleiras e de outras grandes crias do capital. Na Bolívia, na última quarta-feira (18.12), chegou-se ao extremo de reprimir, com gás e força policial, uma manifestação de crianças, que marchavam por um código do menor. No Equador, Correa está rendido às petroleiras.

Na verdade, toda a proposta de soberania e anticolonialismo contida no bolivarianismo parece se esvair. Os mandatários ditos "progressistas” não conseguem sair da roda da dependência. Preferem o acordo com o capital especulativo e com as megaempresas transnacionais, para tentar algum respiro do que chamam "desenvolvimento”. Aplicam políticas compensatórias que até são importantes, a considerar a extrema pobreza que vivem as maiorias, mas que não parecem capazes de romper com o ciclo de uma quase perpétua subserviência. O máximo que conseguem é o que já apontava Gunder Frank: o desenvolvimento do subdesenvolvimento, o que permite algumas ilhas de riqueza, um certo incremento no consumo através da liberação de crédito, mas praticamente nenhuma mudança estrutural. Para os protagonistas de lutas importantes contra o capital, como é o caso dos bolivianos que viveram as guerras da água e do gás, esses governos, mascarados de esquerda, acabam prestando um desserviço à luta anticapitalista. "Eles domesticam o movimento social, seguram os movimentos de luta, cooptam lideranças, disseminam uma mensagem falsa sobre as possibilidades de melhorias dentro do sistema. Assim, retrocedemos décadas. É uma tragédia", afirma Oscar Olivera, uma das mais importantes lideranças da Guerra da Água, em Cochabamba,

Nos dias de hoje, sem a presença vigorosa de um Fidel, ou a trovejante ousadia de Chávez, o que parece avançar é a acomodação ao velho modelo de dependência e de cooperação com o capital. Mas, ainda assim, a falta de uma alternativa também abre caminho para a construção de outro ciclo, talvez um pachakuti (o mundo de patas para cima, uma viração), como dizem os povos andinos. Algum novo giro, uma nova tendência, uma surpresa, como foi Chávez e seu sonho bolivariano. No final dos anos 90 essa novidade veio de onde ninguém esperava. Agora, enquanto o mundo mergulha no frisson das novas tecnologias, da inserção internética, no reino das sensações, talvez, em algum lugar não sabido, completamente inaudito, esteja brotando o que virá. As lutas não acabam, seguem seu caminho. Os movimentos continuam protagonizando resistência e, afinal, os povos sempre aprendem quando vivenciam experiências alvissareiras, como as que afloraram na última década. Algo novo há de aparecer.

Assim, seguimos!...