quarta-feira, 19 de junho de 2013

Manifestações

As manifestações e o Riot Model de Granovetter
em artes e ideias por João Lopes
Populações do mundo inteiro têm ainda saído às ruas para reivindicar seus direitos. A democracia ganha força, e cada vez mais se busca impedir que ela seja o puro arbítrio da maioria, mas que se considere também a vontade e expressão das minorias. O comportamento humano em um somatório nas multidões em reivindicação pode se desencadear de várias formas, sendo um fator imprevisível, no entanto influenciável. Compreender como se dá o surgimento da violência em protestos inicialmente pacíficos pode nos ajudar a tornar um protesto mais efetivo e a sermos motivadores de manifestações lógicas voltadas para a segurança.



O comportamento das multidões é sempre um terreno cinzento e dificultoso, sobre o qual nosso olhar pode nos prender à parcialidade. Ou mesmo o comportamento humano em sua individualidade é um enigma que, quem sabe, seja o que não permite uma vida sem graça e repetitiva, somos imprevisíveis. É essa imprevisibilidade que garante a novidade nas relações que temos e coisas que fazemos. De uma coisa não podemos fugir, de agir, de nos portarmos em sociedades seja por meio coletivo ou nas ações individuais.

Na tentativa de entender o comportamento humano nas multidões, sejam em protestos pacíficos ou mesmo lutas armadas, ou ainda a junção das duas coisas, o sociólogo Mark Granovetter criou o seu Riot Model (modelo de motim). Esse modelo de estrutura matemática, de uma manifestação ideal criada por Granovetter, nos mostra como as manifestações podem ser pacíficas ou não pacíficas, e ainda a influência que algumas pessoas exercem nos convívios em grupo.


Esse modelo propõe o seguinte:

Centenas de estudantes estão presentes numa praça para protestar contra uma diminuição de verba para a educação que foi proposta pelo governo local. Todos estão nervosos e irritados com a falta de influência sobre as decisões do governo que decide sem levar em conta os anseios daquela população. Como em toda multidão, há uma grande possibilidade de que as coisas fujam de controle.

Esses estudantes, no Riot Model, estão divididos em dois grupos fundamentais: os que querem uma manifestação pacífica e aqueles que entendem ser a violência uma das formas de chamar a atenção da mídia e da sociedade como um todo, este últimos irão destruir e quebrar coisas, e aqueles primeiros manifestar pacificamente apenas. No entanto, essa escolha entre pacificidade e violência dá-se de forma espontânea, eles escolhem naturalmente e também baseados no que as outras pessoas estão fazendo.


A regra geral diz que, quanto mais pessoas estão envolvidas em um motim, mais chances há de outras se juntarem a ele. Desse modo, quanto mais pessoas se ajuntam numa manifestação, mais chances há da mídia prestar atenção nela, e menores serão as chances de alguém ser preso em caso do surgimento de algum motim.

Nessa multidão experimental, há que se considerar que cada um vive um momento diferente em relação à atual política praticada pelo governo, nela há aqueles que se sentem mais privilegiados em algumas coisas e menos em outras, por isso uns estarão mais dispostos à violência, isto é, arriscar a fazer algo para realmente chamar a atenção arriscando até mesmo sua liberdade. Outros têm questões pessoais contra o atual governo, ou mesmo contra a polícia, ou contra a própria sociedade, e sem dúvida, levarão isso em contra sob o calor dos protestos.

Guilherme Tosetto.jpgManifestação na cidade de São Paulo contra a Copa do Mundo que será realizada no Brasil.
Foto: Guilherme Tosetto
Levando em conta que cada um possui um limiar próprio, isto é um ponto em que, se há pessoas suficientes participando do motim, ele irá participar também. De modo que os "baderneiros" possuem um limiar baixo, ou seja, onde tem um motim, eles irão participar também, ao arrepio de qual seja a causa sobre a qual se pleiteiam direitos, e há outras pessoas, como líderes partidários ou estudantis, que possuem limiares mais altos, sendo comprometidos com um tema de fundo a respeito daquela manifestação.

Granovetter ilustrando o que iria acontecer, criou uma tabela muito simples, em que cada pessoa possuía um número de limiar, assim, temos uma pessoa com limiar zero, o doidão que entrará no meio da multidão gritando e atirando alguma coisa para cima, mais alterado que os outros. Esse quando visto por outra pessoa de limiar número um servirá como exemplo, de modo que a pessoa de limiar um, passará a fazer uma manifestação menos pacífica também, depois a que precisa de duas pessoas, isto é a de limiar dois, se juntará a eles, que encontrarão a pessoa de limiar três... E, como num efeito em cascata, cada pessoa vai sendo atingida em seu limiar até estabelecer o caos.

turquia_ Murad Sezer.jpgManifestações na Turquia contra o governo.
Foto: Murad Sezer

Em contraponto a esse grupo, Mark Granovetter estabeleceu que outro grupo, exatamente igual ao descrito, está em outro lado da cidade, fazendo uma manifestação com o mesmo propósito, com apenas uma diferença: nessa multidão ninguém tem o limiar de três e duas têm o limiar de quatro. Um observador externo sequer perceberá essa diferença, no entanto, para entendermos a formação dos motins, em meio às manifestações, essas pessoas são as peças chaves que definem quanto à manifestação pacífica ou não, assim o potencial motim, termina antes mesmo de começar. Nesse sentido, compreendemos que se em um grupo de manifestação pacífica, mesmo que haja seres mais bem instruídos academicamente, o limiar delas é fundamental para saírem da calma à violência em instantes. E a presença de indivíduos motivadores de violência, quando não evitada, até mesmo pelo próprios manifestantes, pode desencadear ações não esperadas para um ajuntamento pacífico.

O Riot Model, quando analisado de maneira ampla, nos mostrará que, nas sociedades, existem pessoas chaves capazes de influenciar outras, para Granovetter quando o limiar 99 é atingido, a possível manifestação pode ganhar caráter incontrolável. Historicamente sabemos que manifestações ainda são o instrumento mais poderoso das sociedades, quando unidas por um propósito vão juntas às ruas, ou a algum destino específico reivindicar seus direitos, o uso ou não da violência, não é definido antes, por uma manifestação ser anunciada pacífica não significa que ela será pacífica.

Nas manifestações atuais, vemos algumas que logram demasiado êxito, com aceitações unânimes da população, outras com grupos específicos (minorias), e ainda manifestações que reúnem diversos grupos reivindicando, assim, diversos direitos. Certamente, a falta de compromisso das pessoas com a real causa de uma manifestação, já demonstra em sua participação potencial para gerar confusão. Há ainda que se lembrar de que o objetivo de qualquer manifestação não é o aparecimento nas mídias, mas a demonstração da força coletiva dos homens, não podendo, cada manifestação, sob pena de tornarem-se pouco efetivas, perderem-se em ideologias individuais, puramente pessoais e restritas, que não manifestem a verdade de um conjunto.



joaolopes
Artigo da autoria de João Lopes.
João Lopes é estudante de Direito, está tentando cultivar um canteiro, ainda não escolheu as flores, paulistano, gosta de ciências sociais e física quântica, não largou as poesias. .
Saiba como fazer parte da obvious.

Nenhum comentário:

Postar um comentário