terça-feira, 4 de setembro de 2012

Cinema

Cinema Tradição, Trabalho & Perdição . Uma ficção cinematográfica de Leonardo Carmo, de São Paulo Em Paris, na Cinemateca francesa, Jean-Luc Godard e Guy Debord fumam durante a projeção de Trabalho, o mais recente curta-metragem de Luiz Rosemberg Filho. Colagem de Luiz Rosemberg Filho Alexander Kluge e Jean-Marie Straub chegam em seguida. Andrzej Wajda e Jean-Marie Straub cumprimentam rápido Fritz Lang e Alexander Sokurov. Todos tomam seus assentos mas, educados, se mantêm cinematograficamente distanciados uns dos outros. Rosemberg pede a Orson Welles para avisar que não irá na sessão. Mais tarde, se quiserem, poderão se encontrar para um jantar oferecido por Jean Renoir numa pequena propriedade nos arredores de Paris. Asja Lacis e Bert Brecht prometeram aparecer. Trabalho corre em três linhas. A narratividade doce de José Carlos Asbeg. As imagens resultam resultado de uma pesquisa pelo lixo audiovisual dominante. As colagens de Rosemberg fundem-se às imagens, ora esclarecendo-as ora problematizando-as, como se discutisse com Theodor Adorno o que seria uma educação pós-Auschwitz. Os críticos de cinema sentem-se confusos diante de filmes como esse. Inteligentemente dão bola preta ao filme. Alexander Kluge diz a Lang que se o Brasil investisse em cinema, Glauber Rocha poderia ter realizado Marx–Eisenstein – Notícias da Antiguidade Ideológica, há 20 anos. Debord, com restrições, analisa a demolição do espetáculo pela utilização da montagem materialista do cinema. Straub lembra que Kurosawa sabe pouco de cinema, e que Trabalho é uma aventura pelo desconhecido continente do cinema. E Sokurov pensa que Lenin se sentiria angustiado diante deste filme. Wajda relembra o recorrente massacre de Katyn, e inclui agora os civis brutalmente exterminados em filas de supermercados, em escadarias de shoppings-centers, na super lotação dos aeroportos internacionais onde passageiros esperam passar férias – o que Debord observa irônico – para voltarem reanimados para o trabalho. Alguns espectadores jogam ovos na tela. Godard incentiva mais força, mais força! Destruam esse filme! Um esquerdista, confiante, atira um ovo com força, mas ele rebate na tela e explode na cara do atirador! É um ovo podre. Não só o cinema, mas há certos espectadores que cheiram muito mal. Este filme é puro Vulcano, diz Straub, uma viagem ao mitos que Prometeu destruiu mas que ressurgiram, ressurgem, ressurgirão pela alienação. Como em Alexander Kluge, um ensaio fílmico da crítica da economia política. Um crítico com o manual do bom gosto em mãos afirma solene que Trabalho não é cinema. Um produtor sorri superior. Um estudante acha que há exagero do substantivo “fascismo” no filme. Godard diz que gostaria de projecioná-lo simultaneamente com Germaine Year Nine Zero. Os críticos reagem virilmente com mais bolas pretas para o filme. Na casa de Jean Renoir, Rosemberg diz a John Huston que Trabalho retoma Crônica de um Industrial. No Crônica era a relação do capital com o trabalho. Já no Trabalho é a necessária negação dele como trabalho alienado, para se viver e gozar mais. É por isso que há a citação de Willian Faulkner no final do filme. Glauber Rocha liga para Rosemberg e diz que gostou do filme. Rosemberg reclama que ele não viu o filme, e como pode gostar do que não viu? Glauber responde que ouviu o filme e que o cinema de Rosemberg é para ouvir, não para ver. Katryn Bigelow chega atrasada e pede que Rosemberg escreva um texto sobre Guerra ao Terror, a ser lido por Camille Paglia ao som de Laurie Anderson numa Universidade do Texas. Na animação do jantar Dominique Sanda e Jacques Tati convidam-no para flanar em Paris. Tímido, mas sentindo-se entre os seus, Rosemberg pede: vocês podem me levar ao Cabaret Revoltaire? 23/10/2011 Fonte: ViaPolítica/O autor Leonardo Carmo é cinéfilo, pesquisador de história do cinema e professor da rede pública estadual de ensino de São Paulo. E–mail: carmoleonardobr@yahoo.com.br Mais sobre Luiz Rosemberg Filho E-mail: rosemba1@gmail.com (via política)

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