quinta-feira, 18 de abril de 2013

A Criação

Outras teorias da criação
em recortes por João Lopes em 16 de abr de 2013 às 06:10

A criação do universo está presente em todas as civilizações. Desde as teorias mais elaboradas até às mais simples, todas são uma maneira do homem explicar para si mesmo como está inserido em um universo que desconhece. As teorias da criação de diferentes povos são riquezas a serem observadas.


As teorias da criação são explicações lógicas dadas para o surgimento do mundo desde o momento em que o homem tornou-se capaz de refletir sobre a sua existência. Essa consciência humana de si mesmo e do universo que o cerca, ainda é o que o motiva a constante exploração do espaço. Nas palavras de T S Elliot, "não devemos parar de explorar, e o fim de toda nossa exploração será chegar ao ponto de partida e ver o lugar pela primeira vez”.


A teoria do Gênesis apresentada pela bíblia é amplamente conhecida, haja vista o expansionismo do cristianismo desde os tempos mais remotos e o ideário cristão de que o mundo precisava conhecer a mensagem do evangelho. Contudo, há outros mitos de criação, também interessantes, que valem a pena ser conhecidos por todos, desde os céticos até aqueles que já possuem engajamento com outros credos. Uma coisa é certa, saber de onde viemos, de qual mundo surgimos, é ainda uma grande questão. Para aqueles que se firmam na ciência, as teorias também são diversas, a mais aceitável, e tida como comprovada no mundo científico, é a teoria do Bing Bang.


Ambas teorias, a da gênese do universo apresentada pela bíblia em que o próprio Deus cria o mundo e todas as coisas, inclusive o homem, e a do Big Bang a explosão que deu origem ao nosso universo, admitem que haja um instante, o instante da criação, o início de tudo. Todavia, outras civilizações além dos hebreus –o povo escolhido segundo a história bíblica- e a ciência buscaram responder à questão sobre a origem do universo.

Em seu livro, A dança do Universo, Marcelo Gleiser, físico e astrônomo, mostra alguns dos mitos de criação que passaremos a conhecer, sem dúvida, estes mitos dão prova de que a imaginação humana é a grande criadora da realidade que nos cerca, como afirma Gleiser em seu livro Criação Imperfeita “somos a consciência do universo”.


Os índios Hopi, dos Estados Unidos, acreditam que a criação do universo se deu da seguinte forma:

“O primeiro mundo foi Tokpela. Mas antes, se diz, existia apenas o Criador, Taiowa. Todo o resto era espaço infinito. Não existia um começo ou um fim, o tempo não existia, tampouco formas materiais ou vida. Simplesmente um vazio incomensurável, com seu princípio e fim, tempo, formas e vida existindo na mente de Taiowa, o Criador. Então Ele, o infinito, concebeu o finito: primeiro Ele criou Sotuknang, dizendo-lhe: “Eu o criei, o primeiro poder e instrumento em forma humana. Eu sou seu tio. Vá adiante e perfile os vários universos em ordem, para que eles possam trabalhar juntos, de acordo com meu plano”. Sotuknang seguiu as instruções de Taiowa; do espaço infinito ele conjurou o que se manifestaria como substância sólida, e começou a moldar as formas concretas do mundo.”
(GLEISER, 1997:26)


Nesta história da criação, temos o infinito, Taiowa, criando o finito. Taiowa é como a figura absoluta de um ser-deus criador de tudo que existe com poderes ilimitados, assemelha-se à história do Gênesis em que Deus onipresente, onisciente e onipotente, cria o mundo e todo o universo como conhecemos.


Na religião hindu de tradição milenar e com bilhões de fiéis se somados os da Ásia e de todas as partes do mundo, a criação é um ciclo por si mesmo infinito, repetindo-se eternamente num ciclo de criação e destruição pela dança rítimica do deus Shiva.

“Na noite do Brama (a essência de todas as coisas, a realidade absoluta, infinita e incompreensível), a Natureza é inerte e não pode dançar até que Shiva assim o deseje. O deus se alça de seu estupor e, através de sua dança, envia ondas pulsando com o som do despertar, e a matéria também dança, aparecendo gloriosamente à sua volta. Dançando, Ele sustenta seus infinitos fenômenos, e, quando o tempo se esgota, ainda dançando, Ele destrói todas as formas e nomes por meio do fogo e se põe de novo a descansar.’’ (GLEISER, 1997:27)



Assim, parece mais crível aos adeptos do hinduísmo que o universo inteiro tenha um fim e um início, sobretudo quando os valores sociais tendem deturpar-se e se tornam alheios àqueles que compõem a doutrina da religião.

O mito chinês de Pan Ku, o ser absoluto, ou seja, Deus, morre dando origem a tudo, uma visão de alteridade da divindade criadora.

“A criação do mundo não terminou até que Pan Ku morreu. Somente sua morte pôde aperfeiçoar o Universo: de seu crânio surgiu a abóbada do firmamento, e de sua pele a terra que cobre os campos; de seus ossos vieram as pedras, de seu sangue, os rios e os oceanos; de seu cabelo veio toda a vegetação. Sua respiração se transformou em vento, sua voz, em trovão; seu olho direito se transformou na Lua, seu olho esquerdo, no Sol. De sua saliva e suor veio a chuva. E dos vermes que cobriam seu corpo surgiu a humanidade.” (GLEISER, 1997:29)


Os mais intrigantes na miríade dos mitos de criação, são os mitos de criação que não admitem criação, um paradoxo quase incompreensível, no entanto, partem da premissa de que o universo é eterno, não é cíclico, iniciado, nem terá fim. Uma religião originária da Índia, fundada por um contemporâneo de Buda, Maavira, do século VI a.C., chamada jainismo, tem a seguinte história que é contada por um jainista chamado Jinasena que viveu por volta do ano 900 d.C.

"Alguns homens tolos declaram que o Criador fez o mundo.
A doutrina que diz que o mundo foi criado é errônea e deve
[ser rejeitada.
Se Deus criou o mundo, onde estava Ele antes da criação?
Se você argumenta que Ele era então transcendente, e que portanto não precisava de suporte físico, onde está Ele agora?
Nenhum ser tem a habilidade de fazer este mundo — Pois como pode um deus imaterial criar algo material?
Como pode Deus criar o mundo sem nenhum material básico?
Se você argumenta que Ele criou o material antes, e depois o
[mundo, você entrará em um processo de regressão infinita.
Se você declarar que esse material apareceu espontaneamente,
[você entra em outra falácia,
Pois nesse caso o Universo como um todo poderia ser seu
[próprio criador.
Se Deus criou o mundo como um ato de seu próprio desejo,
[sem nenhum -material,
Então tudo vem de Seu capricho e nada mais — e quem vai
[acreditar numa bobagem dessas?
Se Ele é perfeito e completo, como Ele pode ter o desejo de criar algo?
Se, por outro lado, Deus não é perfeito,
Ele jamais poderia criar um Universo melhor do que um simples artesão.
Se Ele é perfeito, qual a vantagem que Ele teria em criar o Universo?
Se você argumenta que Ele criou sem motivo, por que essa é Sua natureza, então Deus não tem objetivos.
Se Ele criou o Universo como forma de diversão, então isso é uma brincadeira de crianças tolas, que em geral acaba mal.
Portanto, a doutrina que diz que Deus criou o mundo não faz
[nenhum sentido
Homens de bem devem combater os que creem na divina criação, enlouquecidos por essa doutrina maléfica.
Saiba que o mundo, assim como o tempo, não foi criado, não
[tendo princípio nem fim,
E é baseado nos Princípios, vida e Natureza.
Eterno e indestrutível, o Universo sobrevive sob a compulsão de
[sua própria natureza, Dividido em três seções— inferno, terra e firmamento."

A negação da criação está intrínseca à existência da divindade criadora. O que fica claro nos raciocínios apresentados pelo texto jainista.

Há ainda muitos outros mitos que tentam explicar a origem do universo, de onde viemos, para onde estamos indo, como será o nosso fim. De fato, acreditamos naquilo que mais se adapta aos nossos valores sociais e àquilo que aprendemos no convívio de nossas sociedades. O que fica claro, é que também a não crença baseia-se em um raciocínio aparentemente lógico que nem sempre condiz com a logicidade dentro da realidade que ora vivemos.

A ciência caminha de maneira rápida e sólida dando provas de que suas teorias são verossímeis e dignas de crédito. Contudo, não é o papel da ciência negar que as mais variadas crenças estão erradas ou corretas. Cabe a nós, seres humanos, refletirmos sobre nossa existência dando a ela o caráter que acreditamos, testificando a verdade dos nossos credos, seja na ciência ou nas religiões, dando significado à existência. Cumprindo nosso papel de consciência desse universo que nos abriga.




joaolopes
Artigo da autoria de João Lopes.
João Lopes está tentando cultivar um canteiro, ainda não escolheu as flores... colhe as flores, gosta delas, esquece... Poeta de alma.
Saiba como fazer parte da obvious.

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