segunda-feira, 14 de março de 2011

Pensamentando

O Pensador Selvagem


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Segunda Crônica de um Amor em Silêncio
Posted: 06 Mar 2011 02:03 PM PST

(O amor silencioso feito de sonhos e miudezas acordou tarde)

Vejo uma montanha pálida de resistência duvidosa erguer-se no meio da cama quando te moves para a esquerda do espaço que ocupas, apoiando-se na raiz do braço também branco que antes segurava minha orelha fria sem relutância. As costas altas, com as marcas do peso do corpo sobre os lençóis, pareciam torturadas pelo algodão que te aconchega todas as noites.

Inconscientemente, vagando consolado no mundo dos sonhos, aos galopes no ser mágico e silencioso do desejo puro, cheio de mistérios, cheio apenas de ti, te afastas de mim.

Toda noite desistes de um momento do meu corpo para assegurar tua solidão morfética no outro canto da cama.

Não volto mais a dormir até que seja possível domar as bestas alvoroçadas de meus questionamentos a respeito de tua necessidade de se ausentar dos meus sonhos. Os demônios que me devoravam nos pesadelos, e agora ocupam as sombras do quarto, encorajam alguns dedos a escalarem a nua solidão das tuas costas para provocar uma avalanche de tuas decisões dormidas, destruir teu ressonar, te despertar desse encontro noturno com uma fantasia feliz sem mim, trazendo tua raiva amorosa e mal dormida para se aconchegar no meu peito desperto, no meu olhar sanguíneo e derramado, na insônia desse amor insaciável.

Existe um movimento em tua vida que nunca entendi: direita, esquerda, sem me encarar, sem dar vazão aos sentimentos por mim. E quando vem me destrói com uma inundação de descontentamento. Algo te embala com uma superficialidade repentina que não reconheço em mim. O rosto, inteiramente preenchido de aceitação e propósitos maduros, solitário e preso ao resto do corpo, inadequado para os ombros largos, inconformado com a combinação das roupas moderninhas, não empresta entendimento algum sobre mim ou sobre o mundo.

Encara a vida como se fosse saudável conformar-se com direita e esquerda, quando o que se pode fazer pelo amor e pelo futuro é ir adiante. E me encontrar, pequeno, dissolvido na busca, do outro lado desse espaço descampado que se tornou nosso interesse.
O que enxergo agora é uma vastidão imensurável de uma terra vermelha, lambida por um pôr-do-sol de filmes de amor sem dor, de ex-plantações de trigo dourado que foram arrasadas por um desejo absoluto de liberdade e esclarecimentos. Estou de um lado desse lugar, parado. Fixo e irremovível. Encarando o horizonte à minha frente, recebendo a força clara do sol que se cala, a admirar tua distância. Apenas reconheço tua presença porque sempre foi metafísica essa necessidade de te sentir, o teu cheiro circula com raiva pelo ar, com o compromisso de demarcar território e declarar vitória sobre os sentidos.

Posso tentar entender como o teu corpo recebe o calor que me ofende, no entanto, sinto cada vez mais estranheza quando busco, para acalmar meu desespero, o entendimento de tuas decisões, quando te vejo mais distante, forçando-me à aceitação do nada, do presente com tua ausência, e do futuro sem tuas declarações reconfortantes sobre o fim.

Quero acertar sem gravidade com um sentimento ordeiro, mas inescrutável. Ouvir-te declarar algo possível, me dar pistas sobre o caminho a seguir até ti; um percurso em que eu não morra desidratado sem teus segredos ou queimado pelo sol do excesso e do desejo desassistido.

Estive sempre sozinho encarando com naturalidade minha solteirice ou carrego essa vulnerabilidade leviana e adquirida para inventar o amor?

Passou a me odiar com olhos semicerrados, com baforadas infantis de quem não dorme há dez anos e com os sons mastigados de uma noite preenchida com dificuldades e ausências calculadas.

E essa sensação de que não poderia viver ali limitado, com esse amor em estado de vigília preguiçosa e constante, começou a interromper minha sanidade.

Então vou ficar aqui esperando o dia despertar pra ter a certeza que você está do outro lado desse deserto arriscado, com a mesma dúvida que carrego sem arrependimento, mas vestido de irresponsabilidade: o que acordará no lugar do silêncio, da distância e dessa solidão? Um poema, uma rima burra ou uma decepção?
(O Pensador Selvagem)

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