quinta-feira, 3 de março de 2011

China

China: sorrisos e lágrimas
Se tiver sucesso, é possível que a China supere os EUA no âmbito econômico ainda na presente década. Mas não terá mérito algum, e, mais ainda, será motivo de grande preocupação, se seu modelo de desenvolvimento imita os padrões usados no Ocidente.
Por Xulio Ríos
[22 de fevereiro de 2011 - 12h44]
Depois de tomarmos conhecimento dos novos dados oficiais da economia japonesa, confirmou-se o que já se sabia desde agosto do ano passado: a economia chinesa já é a segunda do mundo, somente ficando atrás dos Estados Unidos, modificando um pódio que era o mesmo de 1968. Não obstante, em termos de PIB per capita se expressa outra realidade bem diferente: segundo o FMI, o PIB da China aumentou para 4.283 dólares em 2010, ocupando a 95ª posição no ranking mundial, frente aos 42.325 dólares do Japão, dez vezes superior ao da China. É um marco para a China, mas distorcido ao extremo. A China superou o Japão em algo mais de 400 milhões de dólares no valor bruto do PIB.

Estes dados, tornados públicos a poucas semanas da abertura das sessões anuais da Assembleia Popular Nacional da China, confirmam o auge de sua economia e confirmam uma vez mais a habilidade e o sucesso atingidos pelo PC chinês (Partido Comunista da China) na sua estratégia para o desenvolvimento do país. No entanto, as outras estatísticas, as que fazem alusão, por exemplo, às deficiências do progresso em matéria social, são bem conhecidas e se amontoam como nuvens no horizonte da estabilidade (altos índices de pobreza, baixos salários, péssima distribuição da riqueza, desequilíbrios territoriais, entre muitos outros) já que estes não são manejáveis com alquimia estatística, mas sim com progressos efetivos que reduzam as disparidades de maneira notória. O novo Plano Quinquenal (2011-2015), que deverá ser aprovado nas próximas semanas, será um instrumento crucial para modificar os déficits chave do modelo de desenvolvimento chinês (social, tecnológico, ambiental).

Esta segunda posição alcançada pela China, assim como as previsões de diferentes consultores apontando que, ainda na presente década, a China poderia superar os EUA, desataram novamente, por outro lado, os alardes no que diz respeito à ameaça que traz o gigante oriental e, paralelamente, as manobras de Pequim para repelir as tentativas externas de enfiar bastões nas rodas de sua carruagem.

Na semana passada, por exemplo, o Conselho de Estado decidiu dar uma nova reviravolta e estreitar mais sua posição no controle sobre as fusões estrangeiras e as aquisições de empresas em setores que possam afetar a segurança nacional (desde a defesa aos produtos agrícolas, passando por recursos e energia, infra-estrutura, serviços de transporte, tecnologias chave etc.). Outro anúncio relevante afeta o Yuan. O Banco Popular da China reiterou que o regime de controle da taxa de câmbio flutuante, em vigor desde julho de 2005, é “a melhor opção” para o país, enviando novamente uma clara mensagem àqueles que reclamam uma revalorização excepcional do Yuan. Em terceiro lugar, a melhora das capacidades em matéria de defesa especialmente diante da complexa situação em que vive imersa a região geográfica que circunda a China, intensificando sua capacidade de produção de tecnologias em âmbito nacional (depois de apresentar seu avião invisível, anuncia que um novo tipo de míssil convencional com alcance de 4 mil km poderia estar pronto em até cinco anos) com a finalidade de preservar a soberania e a integridade territorial do país (1). Por último, uma resposta contundente à mensagem de Hillary Clinton a propósito do uso da Internet para propiciar transformações políticas nos regimes autocráticos, anunciando, entre outras coisas, a intenção temporal de trilhar caminhos separados no desenvolvimento da Internet. Em suma, a China parece disposta a fazer o possível e o impossível para não ser presa em nenhuma rede que ponha em questão a soberania de seu processo, por que dela depende a realização de sua singular estratégia modernizadora.

Se tiver sucesso, é possível que a China supere os EUA no âmbito econômico ainda na presente década. Mas não terá mérito algum, e, mais ainda, será motivo de grande preocupação, se seu modelo de desenvolvimento imita os padrões usados no Ocidente. Não há maior desafio para a China – e para o mundo – que melhorar as condições materiais da vida de seus 1,4 milhões de habitantes, com uma modernização globalmente sustentável. Este desafio exige do Ocidente um comportamento menos excessivo, mas também da China uma audácia verdadeiramente extraordinária.

1. A nova estratégia militar dos EUA, que substitui a aprovada em 2004, assinala a China como desafio número um.

Tradução de Cainã Vidor. Xulio Ríos é diretor do Observatório da Política Chinesa (www.politica-china.org). Foto por http://www.flickr.com/photos/ronmacphotos/.

(Revista Forum)

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