segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

O. Médio

Os que perderam constroem pontes
As conversações de paz no Oriente Médio continuam paralisadas, mas ativistas se negam a esperar sentados.
Por Mel Frykberg
[05 de janeiro de 2011 - 18h42]
As conversações de paz no Oriente Médio continuam paralisadas, mas ativistas se negam a esperar sentados. O Círculo de Pais - Fórum de Famílias, integrado por israelenses e palestinos que perderam familiares no conflito, tenta construir pontes entre os dois lados. “Esperar que nossos respectivos líderes façam a paz demorará muito”, disse à IPS o diretor do escritório israelense da organização, Rami Elchanan.

“É por meio das pessoas comuns que podemos criar um futuro diferente. Queremos prevenir mais sofrimento, influenciando o público e os políticos para que prefiram o caminho da paz ao da guerra, bem como educando sobre a paz e a reconciliação”, afirmou Rami. “Também queremos promover o fim de todo ato de hostilidade e o êxito de um acordo político, impedindo o uso da dor como meio para expandir a inimizade entre os dois povos”, ressaltou.

A cada semana, membros da organização dão palestras em escolas, universidades, hotéis e outros centros para israelenses, palestinos e estrangeiros. O grupo também organiza acampamentos de verão, oferece seminários de liderança e realiza documentários para o rádio e a televisão. Também organiza conferências na comunidade autônoma espanhola do País Basco e na Irlanda do Norte.

A entidade é formada por 13 palestinos e israelenses que trabalham em dois escritórios, um em Tel Aviv e outro na cidade palestina de Aram, ao norte de Jerusalém. O pessoal tem apoio de um grande grupo de voluntários capacitados e experientes, procedentes de famílias afetadas, e por uma rede de organizações internacionais. Wilhem Verwoerd, neto do ex-primeiro-ministro da África do Sul e arquiteto do apartheid nesse país, Hendrik Verwoerd, expressou sua admiração pelo Círculo depois que este visitou a Irlanda do Norte, onde reside atualmente.

Aziz Sara, um palestino membro da organização, perdeu seu irmão mais velho, Tayseer, depois que este foi torturado pelas forças de seguranças israelenses, há 15 anos. “Me tornei extremamente ressentido e furioso. Apesar de ter dez anos, sabia que sua morte não fora natural e que alguém era responsável. Cresci com raiva em meu coração. Queria justiça e vingança”, recordou Aziz.

Com o passar dos anos e graças ao seu envolvimento com o Círculo, foi mudando de pensamento. “Me senti na obrigação de utilizar minha dor para propagar a paz, em lugar de usá-la para alimentar o ódio, que acabaria me consumindo. Creio que todos estamos obrigados a dar o melhor de nós para criar a paz”, acrescentou Aziz.

Outra integrante do grupo, Moira Julani, de 43 anos, mãe de três filhas, também processa sua dor. “Alguns dias me sinto furiosa e quero vingança, mas a maior parte dos dias penso na situação de maneira racional e quero educar as pessoas sobre a situação no terreno na Palestina ocupada”, contou. “Não desejo que outros sofram o que estou sofrendo, não importa sua religião ou nacionalidade”, disse à IPS. “Não estamos discutindo a quem culpar, quem começou o conflito ou quem sofreu mais. Reconhecemos a outra parte como seres humanos iguais que sofrem da mesma forma que sofremos”, destacou.

O israelense Rami, de 61, tem hoje três filhos. Há 13 anos, perdeu sua filha adolescente, Smadar. “Estava dirigindo para o aeroporto de Tel Aviv quando recebi um telefonema desesperado da minha mulher em Jerusalém dizendo que havia ocorrido um atentado suicida palestino e que Smadar estaria perto”, recordou. “As horas seguintes passei contatando delegacias e hospitais, tentando desesperadamente saber sobre minha filha. Por fim, fomos identificar seu corpo. No dia em que Smadar morreu, uma grande parte de mim também morreu”, disse Rami. No atentado morreram cinco israelenses, incluindo Smadar, e centenas ficaram feridos quando três jovens palestinos da Cisjordânia se explodiram em um mercado, em setembro de 1997. Smadar ia com amigos comprar livros.

Moira Julani perdeu o amor de sua vida devido à violência do conflito. Mas sua perda ocorreu do outro lado da fronteira. Há vários meses, seu marido, palestino, Ziad, foi assassinado a queima-roupa por um policial israelense. “Era um dia bonito, e Ziad me dissera que preparasse as meninas porque ao regressar iríamos ao Mar Negro. Ele se preparava para as orações islâmicas da sexta-feira”, contou Moira à IPS.

Quando Ziad dirigia por Jerusalém oriental, ficou preso no meio de pedradas e fogo cruzado entre jovens palestinos e soldados israelenses. Virou para evitar as pedras e acidentalmente esbarrou nos policiais, que abriram fogo contra ele. Assustado, saiu do carro e tentou fugir, mas caiu no chão gravemente ferido. Um dos policiais se aproximou e disparou várias vezes contra sua cabeça. Morreu pouco depois no hospital. O policial mudou sua versão do caso em várias ocasiões. Nenhum dos uniformizados envolvidos foi levado à justiça. “Meu marido não tinha nenhuma atividade política”, afirmou Moira à IPS.

Fonte ENVOLVERDE/IPS: http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=85260&edt=1

Foto Flickr: http://www.flickr.com/photos/janslangen/4669138329/sizes/z/

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