sexta-feira, 22 de abril de 2011

Europa

A Europa em seu labirinto
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– 20/04/2011Posted in: Capa
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Por Roberto Savio, de Other News | Tradução Antonio Martins
O presidente do Conselho de ministros de Finanças da Europa e primeiro-ministro de Luxemburdo, Jean Claude Junker, ficou famoso por ter declarado: “Todos sabemos o que deveríamos fazer, mas se o fizéssemos perderíamos todas as eleições”. Esta frase, uma declaração de impotência da política, indica o caminho que o continente está seguindo.
O governo de Portugal é a última vítima deste caminho. Todos os mecanismos criados pelas instituições europeias para ajudar seus membros em crise estabelecem como condição eliminar o déficit orçamentário nacional. Mas já temos dados suficiente para saber em que estamos nos metendo.
Grécia, Irlanda e agora Portugal têm acesso a centenas de bilhões de euros de ajuda. Mas trata-se de empréstimos e embora os juros sejam um pouco mais baixos do que cobram os bancos privados, permanecem muito altos. Acumulam-se a cada dia. Para receber tais créditos, os governos comprometem-se a cortar seus orçamentos mais do que seria politicamente aceitável. E no caso de países com alta dependência do gasto público para sua estabilidade e crescimento, cortes drásticos significaram sempre desaceleração econômica, quando não inflação, o que torna ainda mais difícil pagar cada euro da dívida.
Em economia, a isto se dá o nome de “a armadilha da dívida”. O remédio tradicional era desvalorizar a moeda nacional, o que agora é impossível para os 17 países que adotaram o euro como moeda única – ou, então, declarar algum tipo de moratória, igualmente impossível, já que arrastaria todo o castelo europeu. Simon Tilford, economista-chefe do Centro para a Reforma Europeia, de Londres, escreveu: “Há um limite para os cortes de orçamento que um governo pode aplicar e sobreviver politicamente” se não se vê, como luz no fim do túnel, uma perspectiva de crescimento econômico.
Mas sabemos que esta luz não se vê na Grécia, Irlanda ou Portugal. As estatísticas dizem que os Estados não puderam aumentar suas receitas – ao contrário. Em boa medida, porque o déficit social aumenta, com desemprego e redução de investimentos privados e sobretudo públicos. Como observou Antonio Nogueira Leite, economista do Partido Social Democrático português (opositor e à direita do primeiro ministro demissionário José Sócrates): “As probabilidades de que a Grécia tenha de reestruturar sua dívida não são menores que há um ano e os negociadores levarão isso em conta, quando discutirem o tipo de juros que se aplicará aos empréstimos europeus”. E a revista Economist escreveu: “O plano internacional para salvar a Grécia está paralisando o país”.
Como sempre, descobre-se que um fator importante é o sistema financeiro. Os bancos da Alemanha, França, Grã-Bretanha e Holanda, por exemplo, têm uma grande quantidade de bônus da Grécia, Irlanda e Portugal. E se estes últimos não puderem pagar suas dívidas, o sistema de bancos de primeira linha – considerados fortes – enfrentará uma crise grave.
Enquanto isso, a reforma financeira britânica, que deveria introduzir medidas de controle para evitara no futuro os excessos especulativos que causaram a crise atual, produziu resultados muito limitados. Os banqueiros voltaram a cobrar vencimentos desmesurados, sem nenhuma relação com os resultados das operações. Sabemos que o sistema continua tendo em suas carteiras 50% dos papéis “podres” (ou “tóxicos”), apesar dos bilhões de dólares destinados a salvar as instituições.
Neste panorama, os Estados Unidos acrescentam elementos de instabilidade internacional. Sua crise foi simbolizada pela luta do Partido Republicano para cortar o orçamento federal. Ela terminou com uma derrota para o presidente Obama, obrigado a aceitar um corte de 83 bilhões de dólares. E espera-se, para os próximos dias ou semanas, uma batalha muito mais grave: os republicanos querem reduzir dramaticamente todos os gastos sociais e públicos.
A realidade é, desgraçadamente, muito mais simples. A opinião pública norte-americana não aceita que a carga tributária seja maior que 28% do PIB. Para manter o equilíbrio, esta carga deveria subir para 32%. É algo politicamente impossível, a acabou-se o tempo em que os Estados Unidos podiam viver exportando seus problemas para a economia mundial, graças ao status do dólar como moeda de reserva internacional. Há, a cada ano, menos demanda para os bônus do Tesouro norte-americano, o dólar continua a se desvalorizar e a mais recente expansão monetária (“quantitative easing”), de 60 bilhões de dólares, é provavelmente a última que poderá ser adotada sem causar graves consequências.
Como se vê, também nos Estados Unidos o déficit fiscal prevalece sobre o déficit social. Há alguns dias os eleitores da Islândia votaram contra o uso do dinheiro públicos para saldar as perdas bancárias e os cortes de orçamento. Não seria uma indicação de um caminho alternativo?

Roberto Savio é fundador e presidente emérito da agência de notícias Inter Press Service (IPS) e publisher de Other News.
(Le Monde Diplomatique)

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