Do alto de um pantaneiro
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Por Julia Pascali, de Pirinópolis, Goiás
E logo os Kampa tinha que ser!?
Mas eu não tinha escolha.
Ou ficava ali, enterrado até os ombros, vendo as intermináveis caravanas de cavalos passando sobre a minha cabeça ou pulava naquele mesmo momento, pro lombo daquele que carregava a menina.
Desloquei a trouxa de roupa sobre a pequena plataforma em forma de andor um pouco para a direita e me sentei ao seu lado, equilibrando que nem balança o nosso apoio sobre o cavalo.
Ela continuou impassível e tranquila, como se eu não tivesse feito nada anormal. Nem a carona súbita, nem o deslocamento do assento e nem a nova companhia interferiram no seu estado. E, toda índia, olhava a estrada, o céu, e os cavalos à sua frente, comodamente, integramente, cosmicamente.
E eu!?
Ah! Estranho! Completamente estranho, mas algo feliz.
Saí do buraco, literalmente. E novo, limpo, renascido, deixava a vida me pegar.
Falava, falava muito. Primeiro o nome das coisas: passarinho, rinho, rinho, rinho, que voa, voa voa voa voa voa. Currupiu, piu, piu, piu, piu, piu,piu, piu piuuuuuuuuuuu.! Currupaco. paco, paco, paco, papaco, papaco, paco, pé de estrada, cavalo brabo, égua mansa, nuvem branca...
E de tão contente eu me sacudia todo e a índia se acomodava a esse humano trotar.
Um trotar divinizado, mas de um jovem e inexperiente deus, renascido, reolhando tudo um pouco (mas só um pouco) além da “superfície”, na medida exata da altura de um bom cavalo, um pantaneiro e não um mongol.
O colorido da vida brilha na terra vermelha, mais forte ainda sob o sol poente e eu vou colhendo todo o verde dos campos, montanhas, árvores. As faíscas dos rios e cachoeiras penetram minha íris e me fazem trotar mais excitadamente.
Sei que transmito tudo à índia que vai ao meu lado. É isso mesmo. (Noto-o melhor agora.) Ela vai ao meu lado. Lado a lado. Dois seres primeiros, únicos. Ela também me transmite seu estar.
Um estar bem diferente, me intriga... Me apazigua!!!
(O único que se requer é uma fresta para se estar em festa.
Campo, cidade, luz e muito ar, correndo e movendo a História.
Quando a tarde se vai, vem aquele lugar comum, um não saber fazer nada, o bocejar sem sono e o olho distraído que pára em qualquer recanto sem reconhecer propriamente, só para um piccolo repouso, uma fotografia.)
13/9/2009
Fonte: ViaPolítica/A autora
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